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Estudante mineira quer fazer história na Nasa: ‘Quero ser a primeira’

Laysa Peixoto Sena Lage, de 18 anos, é uma estudante de física da UFMG, que recentemente fez uma grande descoberta diretamente de sua casa em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte: um asteroide, em  uma campanha lançada pela Agência Espacial Americana (Nasa)  e o batizou de LPS 003. Agora, ela busca por meio de uma vaquinha arrecadar R$ 15 mil para fazer o curso da Nasa, “Advanced Space Academy” , nos Estados Unidos. 

Em entrevista para o Estado de Minas, Laysa contou que desde criança tem paixão pela astronomia. “Sempre fui muito curiosa, gostava muito de observar o céu, olhar para as estrelas, tudo isso me deixava muito encantada. Ganhei de um tio um DVD da série “Cosmos: Uma Viagem Pessoal”. Aquilo para mim foi fantástico, fiquei deslumbrada  mesmo sem entender tudo”, disse.  A partir desse momento, começou a nascer uma grande vontade de saber mais sobre o universo. 

Ela explica que não imaginava que chegaria a esse ponto tão nova. “Tudo aconteceu bem melhor do que eu imaginava”, admite. Depois que assistiu à série “Cosmos”, a estudante pensava em “tocar o infinito” como na série. “Agora, sinto que estou chegando mais próxima do infinito, embora não vá conhecer tudo o que existe, mas estou mais próxima do cosmos do que jamais imaginei que estaria. A Laysa de oito anos ficaria muito feliz e surpresa com tudo isso”, declarou.

“Não tenho escolha, a não ser ser a primeira”

“Não tenho escolha, exceto ser a primeira.” A frase é de Mary Jackson, do filme “Estrelas Além do Tempo” (2016). O filme conta a história da corrida espacial travada entre Estados Unidos e Rússia durante a Guerra Fria, em que uma equipe de cientistas da Nasa, somente de mulheres afro-americanas, provou ser o elemento crucial que faltava na equação para a vitória dos Estados Unidos, liderando uma das maiores operações tecnológicas registradas na história americana e se tornando verdadeiras heroínas da nação.

Laysa disse que a cena em que Mary diz a frase é a sua preferida do filme, pois sonha em ser a primeira brasileira astronauta da Nasa. Na cena, Mary por ser uma física negra, não pode concluir uma graduação em engenharia na universidade. “Parecia muito incompatível fazer um curso desse na minha realidade. Nasci em Minas Gerais, estudei em escola pública a vida toda. Então, parecia uma realidade intocável chegar num lugar assim. É muito importante ser a primeira para que outras pessoas sintam que elas podem também, independentemente da circunstância em que elas vivem”, argumenta. 

“Sempre teve mulheres na ciência”

A estudante relata que, durante a escola, teve uma fase que ficou um pouco desanimada com o mundo da ciência, devido à falta de incentivo para competições. De acordo com ela, o conhecimento sobre as competições ainda era muito raso e não falavam muito sobre as de física, apenas das outras matérias com competições famosas, como português e matemática. 

Além disso, a falta de representatividade feminina foi uma das causas desse desânimo. “Quando você abre um livro de ciências, você vê poucas mulheres, e pensa ‘como assim?’ sempre existiu mulheres na ciência”, exclamou. Apesar disso, no ensino médio o interesse voltou porque ela começou a participar de olimpíadas científicas, como a Olimpíada Brasileira de Astronomia (OBA). 

A estudante relata também que, na Competição Internacional de Astronomia e Astrofísica, recebeu apoio anônimo de um doador para pagar a prova da segunda fase. Para ela, foi uma competição desafiadora, já que estava no primeiro semestre de Física, e não tinha aprendido muitos conceitos. Teve que estudar sozinha, mas se sentiu realizada por chegar à final e conquistar a medalha de bronze: 

“Poder viver meu sonho e perceber que era possível seguir essa área foi gratificante. As olimpíadas tiveram um papel muito importante nas minhas escolhas e na minha carreira na física.”

Contra o machismo na ciência

Laysa conta ainda que conheceu um perfil no instagram, que deixou seu sonho vivo e a aproximou de outras mulheres da área, trazendo ainda mais força e representatividade para que ela não desistisse. O coletivo “Desbravadoras do Universo” (@dduniverso),  criado por universitárias de São Paulo, divulga mulheres cientistas que foram propositalmente apagadas da história. 

“Através do coletivo, fui descobrindo milhares de mulheres que contribuíram e que deveriam ter tido reconhecimento, que deveriam ser lembradas hoje. Tudo isso ajudou para que eu pudesse ver o meu lugar na ciência. O projeto foi decisivo para manter meu sonho vivo”, declarou. 

Infelizmente, a estudante de física já teve no início do curso experiências machistas em grupo. Tudo aconteceu quando ela estava fazendo um curso do Instituto de Física Teórica de São Paulo (IFT – SP), numa aula sobre matéria escura.

”A gente tinha que se dividir em grupos no Zoom para umas dinâmicas, com cálculos e responder algumas perguntas que o professor tinha passado. O grupo só tinha meninos e eu. Foi bem chato no início porque eles não me respondiam quando eu falava alguma coisa, tive que pedir ao professor para entrar. Após a presença do professor, eles me deixaram falar e me escutaram”, contou. 

Apesar disso, ela se manteve confiante: “Sei que isso acontece, mas o mais importante é manter a cabeça erguida e não desistir do que a gente ama, do que queremos fazer. Ninguém pode tirar essa vontade da gente. Não importa o que as pessoas dizem, é só passar por esses momentos sem desistir”.

Ela contou também que, uma mulher que a inspira é a Annie Jump Cannon, a cientista surda que catalogou mais de 300 mil estrelas manualmente. Annie desenvolveu um sistema de classificação espectral das estrelas, mas poucas pessoas sabem disso, pois o machismo fez com que o feito fosse registrado no nome dos chefes do laboratório que ela pesquisava.

Rede de apoio é essencial

Laysa assegura que recebeu muito apoio, mas algumas pessoas ficaram em dúvida se era realmente o que ela queria, principalmente pelo difícil mercado de trabalho no Brasil para física. “A falta de investimento para pesquisa no país é realmente difícil, mas não é impossível. Mas não deixei esses comentários me desanimarem porque é o que eu gosto, é o que quero. Não posso fazer algo sem paixão ou escolher outra área para viver infeliz.” 

A estudante pretende, após fazer um mestrado internacional, retornar ao país para ajudar outras meninas a seguir carreira na ciência também. “Acredito que nós devemos ter nossas ambições pessoais, mas não há nada mais gratificante do que fazer algo para que alguém siga seu sonho. Me sinto muito melhor, quero poder ajudar como outras mulheres me ajudaram”, declara. 

Ela também planeja retirar seu projeto de ir às escolas e contar sobre as olimpíadas científicas, como seu pontapé inicial. “Quero mostrar que há um caminho além do que aquele que todo mundo conta para as meninas quando criança, quero ajudar outras pessoas a acreditarem nos sonhos delas”, relata. 

Além disso, Laysa também comemora que já foi em uma escola de ensino fundamental falar sobre ciência, e ficou maravilhada com o interesse das crianças. “Sempre que eu falava alguma coisa um monte de criança já levantava a mão”, contou. Ela salienta que, quando crianças, tanto as meninas quanto os meninos possuem o mesmo interesse pela ciência, ambos gostam muito e se imaginam como cientistas e astronautas. 

*Estagiária sob supervisão  

 

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