Percussão, sopro, levada de tambor, cheiro de incenso no ar. Homens e mulheres vestidos no melhor estilo Egito Antigo, dando o tom das ruas com percussão. Eles surge do nada e no mesmo nada vão embora: num caos gostoso. Todo mundo correndo no meio da rua, sem parar a música e arrastando quem passa, quem não resiste e corre junto.
É muito a cara de Salvador. É muito a cara do Candeal. E não é à toa que foi assim a abertura do II Festival LaLata, na noite desta sexta (23), que trouxe de volta o grupo Os Zárabe, criação de Carlinhos Brown.
Os Zárabe é uma brincadeira é datada de 1989. Naquela época, Brown já era uma figura conhecida e agitava musicalmente o bairro do Candeal, quando 15 crianças, regidas pelo menino Jair Rezende, começaram a se movimentar tentando reproduzir as batidas de percussão que ouviam pelas ruas do seu bairro. Sem meios de adquirir instrumentos, transformaram latas e outros materiais em material sonoro. Nasceu assim, a Lactomia, banda de percussão, que foi apadrinhada por Brown nos anos 90, e estará presente na programação.
Líder do movimento e percussionista à frente da Associação Lactomia Ação Social (Alas), Jair Rezende recorda o começo: “Imagine criança cuidando de criança? Foi isso que aconteceu. Nós aprendemos a tocar sozinhos, tentando imitar as batidas do movimento Vai Quem Vem, liderado por Brown no bairro. Não tínhamos instrumentos, usávamos o que tínhamos, até Carlinhos nos descobrir e começarmos a mesclar instrumentos profissionais com os de sucatas”.
Rezende não escondeu a emoção de voltar a colocar o Zárabe na rua depois de quase uma década: “Esse movimento é importante por contar parte fundamental de nossa história e da história da percussão aqui neste bairro”, apontou Jair.
Carlinhos Brown capitaneia o evento no Candeal (Ana Lúcia Albuquerque) |
Internacional, o LaLata apresenta a diversidade e a originalidade da música instrumental percussiva, fortalecendo o posicionamento de Salvador como centro de produção, difusão e intercâmbio dessa arte. O festival contemplará três estilos da percussão contemporânea: de rua, de efeito e eletrônica, além de exposição de instrumentos e workshops musicais. Os ingressos estão à venda no Sympla e custam de R$ 25 a R$ 100.
Carlinhos Brown valorizou a importância da lata para a educação musical e formação de cidadãos e cidadãs nas periferias. O Cacique afirmou que o LaLata retorna como uma celebração também à vida, depois de tudo que a humanidade passou durante a pandemia e todos os desafios que ainda enfrentamos.
“Primeiro que o Candeal é o panteão da percussão baiana, mundial. Onde nasceu a bacurinha, onde o timbal ganhou projeção e estamos festejando as nossas vitórias. A Bahia é oriunda de vitórias. Salvador, Bahia, é a primeira cidade Latina das Américas”, disse Brown.
Por isso Brown vê o LaLata como um trabalho importantíssimo de se cultivar: “Tudo que falamos ao redor no mundo sobre ancestralidade é importante colocar na prática, com ações, e o LaLata é isso. Um encontro de percussionnistas do mundo inteiro. Uma prova de que o trabalho da Pracatum de resgate à memória junto da comunidade e a partir dessas potências, como os tambores, efetivar a educação, o desenvolvimento social”, completou.
O dia de abertura também contou com várias outras apresentações. Quem subiu primeiro ao palco foi o SKLAU – Manifesto do Tambor. E foi um verdadeiro passeio nos ritmos. Do samba reggae Faraó a um pagodão improvisado em homenagem ao festival, o grupo liderado pelo Mestre Mário Pam deu show.
O senegalês Massamba Diop foi outro que se apresentou no evento e comemorou a oportunidade de estar no Brasil tocando com uma referência como Carlinhos Brown. Os dois farão uma apresentação conjunta neste sábado (24).
A programação continua até domingo (25). Toda a programação acontece no Candeal. No último dia, o evento será aberto com o workshop gratuito da Roda de Timbal do Candeal e, na sequência, o palco do Guetho Square incendeia com as diferentes performances. Carlinhos Brown fecha a noite.
Dia 24 de setembro
15h – Lactomia
16h – Dede Mundo (Salvador)
17h – Pandeiro Repique Duo, com Bernardo Aguiar e Gabriel Policarpo (Rio de janeiro)
18h – Buginganga, com Boghan Gaboot (Salvador)
19h – Comigo Mesmo, com Orlando Costa (Salvador)
20h – Lobo Nuñes (Uruguai)
21h – Atabasabar, com Marcus Musk (Salvador)
Dia 25 de setembro
13h – Roda de Timbal do Candeal, com Elbermario e Rian (ruas do Candeal)
16h – Território Sonoro, com Lucas, Eric e Fagner (Salvador)
17h – Michelle Abu (São Paulo)
18h – Aguidavi do Jêje, com Luizinho (Salvador)
19h – Marcos Suzano (Rio de Janeiro)
20h – Roberto Vizcaino (México)
21h – Carlinhos Brown