‘O barulho de explosão me acordou e, quando eu abri os olhos, estava em cima da cama com estilhaços de vidro e pedaços de tudo que é coisa por cima de mim’, relata Kátia Bonfim, 69 anos. Moradora da Rua Silveira Martins, no bairro do Saboeiro, ela reside no andar de cima dos estabelecimentos que explodiram após um vazamento de gás na madrugada desta quinta-feira (24).
As cenas que ela narra após o desapertar são de um desespero completo. “Tirei tudo que estava em cima de mim e levantei. Dei um passo e vi que minha casa virou um buraco, não sei como sobrevivi. Contei com a ajuda dos vizinhos para sair e fui para a parte de cima da casa para me proteger com eles”, relembra ela.
Um dos vizinhos era Cássio Cerqueira, 27, que acordou completamente atordoado após a explosão. Ele relata que demorou a entender o que tinha ocorrido porque nem conseguia reconhecer onde estava nos primeiros minutos após a explosão.
“O barulho foi muito alto, tudo muito forte. Fiquei sem entender o que tinha acontecido. Se o pessoal que mora longe demorou a saber o que era, imagina eu que estava praticamente dentro da explosão. Não estava reconhecendo nada”, fala.
Destruição total
O não reconhecimento da própria casa por Cássio se dá pela dimensão dos estragos que foram a consequência da explosão. Ao lembrar do que conseguiu ver nos poucos instantes que passou no local após o acidente, ele relata um prejuízo grande.
“Estou sem rumo, perdi tudo. Até minha gata eu não encontrei e não posso voltar porque está perigando cair. Não sei o que fazer, perdi televisão, geladeira, não sobrou nada”, afirma o rapaz, que está desempregado no momento.
Kátia também está desempregada e passou a manhã toda sem saber o que fazer, para onde ir. Já entrou em contato com pessoas próximas para garantir onde ficar, mas não consegue falar de tudo que perdeu sem cair no choro.
“Destruiu tudo. Porta, televisão, hack, geladeira, fogão, sofá, cristaleira e todos os outros móveis e eletrodomésticos que você possa pensar. Fui dormir com tudo certinho, acordei e percebi que não tinha sobrado absolutamente nada. Não paro de chorar de desespero”, fala ela.
Kátia perdeu tudo que tinha em casa (Foto: Ana Lucia Albuquerque/CORREIO) |
A estudante Fabrícia Gonçalves, 18, mora no interior e veio para Salvador fazer curso superior. O local que tinha encontrado para ficar é justamente em cima dos estabelecimentos. Muito abalada, ela conta que não perdeu muita coisa, mas passou por um trauma.
“Eu não perdi muita coisa porque estou no primeiro semestre e é tudo bem simples para garantir só o conforto de descansar. Porém, foi um susto enorme, a explosão foi muito alta e acordou todo mundo. Não imaginava que isso pudesse acontecer”, diz.
Sem autorização
A explosão, que foi resultado de um vazamento de gás, aconteceu em um estabelecimento que comercializava cachorro quente, mas atingiu pelo menos mais cinco pontos comerciais. Responsável por licenciar central de gás em estabelecimentos, o Corpo de Bombeiros Militar da Bahia foi procurado e informou que o local não tinha autorização.
A licença é para uso de gás é nomeada como Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). Ainda de acordo com o Corpo de Bombeiros, todo local que não se caracterize como residência deve passar por essa visita técnica para liberação do uso de gás de maneira segura.
Major Marcos Moreira é o subcomadante do Centro de Atividades Técnicas e Pesquisa (CATP) do Corpo de Bombeiros. Ele explica que características do imóvel são vistoriadas e consideradas pela equipe técnica da corporação para expedir uma licença.
“Observa-se iluminação, extintores, hidrantes e, se tem central de gás, se está em lugar apropriado, ventilado e não fechado na parte do fundo para evitar explosões. Isso porque o risco do gás é o vazamento e confinamento, sem circulação há explosão como ocorreu”, destaca.
Local não tinha licença para uso de gás (Foto: Ana Lucia Albuquerque/CORREIO) |
Ele ressalta ainda que a vistoria é a forma de garantir que o estabelecimento vai funcionar sem riscos diretos às pessoas, protegendo assim os proprietários do imóvel e do comércio de problemas jurídicos.
“Na verdade, é o que garante a segurança das edificações durante o funcionamento dos estabelecimentos. Tanto é importante do ponto de vista da segurança como do legal. Sem a licença, o proprietário assume todo o risco na área civil e criminal”, completa.
Para estabelecimentos em situação irregular, é possível iniciar a solicitação de vistoria através de empresas credenciadas pelo Corpo de Bombeiros e que têm contato disponível no site da instituição.
Demolição do imóvel
Para o imóvel da Silveira Martins, a oportunidade de vistoria já passou. Paulo Passos, arquiteto e plantonista da Defesa Civil de Salvador (Codesal) avaliou a situação do imóvel após a explosão e disse que, para segurança de todos, a demolição do local era mais recomendada.
“Houve danos estruturais que a gente avaliou e entendeu que é necessário demolir o que está instável. Há um risco de potencial desabamento porque houve um comprometimento do local e não dá para escorar, até pela segurança dos nossos agentes”, explica ele.
A Codesal divulgou também uma nota sobre a explosão. O órgão confirmou que a explosão foi causada pelo vazamento de gás GLP e ressaltou que não houve registro de feridos na ocorrência. Para além disso, detalhou os danos em outras casas.
“O prédio residencial que fica em frente, também vistoriado pela Codesal, teve as esquadrias atingidas, mas não foi necessário a evacuação. Foram acionadas a Coelba, Embasa, Polícias Militar e a Transalvador”, completa.