Cada dia no Barro Vermelho costumava durar uma semana. Dava até para correr a fazenda inteira com os primos, do curral das vacas voadoras ao riacho dos jacarés imaginários, e estar na mesa para a janta no horário certo, antes de ser chamado pelos pais aos berros na porteira. As tardes no avarandado, quando decidíamos ficar quietos, consumiam mil horas e o entardecer na roça antecedia noites longas, repleta de ruídos de bichos rasteiros e chocalhos de dormideiras.
Os tios ligavam o candeeiro a querosene com palitos de madeira e, ao redor da fogueira, contavam histórias que escutávamos acesos, um olho no narrador e o outro nos vagalumes que piscavam na mata. O tempo se demorava tanto em cada pequena descoberta que a infância parecia um século. O futuro era um ponto longínquo no mapa e passar de ano na escola equivalia a cruzar fronteiras entre países — nas quais as provas funcionavam como uma forma irritante de alfândega.
Entre uma etapa e outra, éramos apenas crianças. Mil léguas submarinas até o começo da adolescência, centenas de quilômetros para virar um adulto minimamente viável. Anos-luz dos primeiros fios brancos. Tudo seguia devagar enquanto o centro do mundo girava no sentido horário. Mas não é que uma pesquisa publicada na revista Nature Geoscience diz que o núcleo interno do planeta vem desacelerando desde 2009, até quase parar por completo e, então, inverter o movimento!?
É bem interessante pensar que habitamos um planeta que possui algo semelhante a um outro planeta por dentro. Esse tal centro, que já foi comparado em tamanho a Marte, formado basicamente por níquel e ferro e que se move numa espécie de líquido amniótico, influencia os nossos destinos em ciclos determinados. Pois bem, para os cientistas Yi Yang e Xiaodong Song, da Universidade de Pequim, é disso que estamos falando. E como é misterioso, metafórico e belo.
As mudanças recentes no comportamento do núcleo do planeta, ainda cientificamente inexplicáveis, afetam diretamente o clima terrestre e o movimento das ondas, além de fazer os dias na Terra ficarem mais curtos. A notícia, coincidentemente ou não, vem de encontro às reflexões unânimes sobre a crescente velocidade do tempo que se acentua em nosso século. O certo é que por essa lógica, que considera exclusivamente a órbita dos relógios, viveremos cada vez menos a partir de agora.