InícioNotíciasPolicialTancredo Neves: violência faz imóveis à venda encalharem

Tancredo Neves: violência faz imóveis à venda encalharem

Do início da Rua Paraíba até o fim de linha, no bairro de Tancredo Neves, em Salvador, a quantidade de placas de ‘Vende-se’ impressiona. Não dá nem para contar, pela extensão da via e pelos inúmeros anúncios, quantos são os imóveis na mesma condição. As casas fechadas e desocupadas – e não é de agora – dão pistas de um movimento de saída dos moradores que nem espera o imóvel ser realmente vendido. O motivo? A violência que se impõe na área.

Há duas semanas, no entanto, as facções do Bonde do Maluco (BDM) e do Comando Vermelho (CV) intensificaram o confronto pelo domínio do bairro, protagonizando diversos tiroteios. Em seis dias, já houve cinco casos de cárcere privado – os mais recentes nesta terça (18) à noite, com uma grávida e um jovem mantidos reféns. Eles foram liberados sem ferimentos, e oito suspeitos acabaram presos somente nessas duas ocorrências.

Há dois anos, Eliéser, que prefere não revelar o sobrenome, tenta vender um imóvel na Rua Paraíba para um amigo. A casa, que já não é residência de ninguém há anos, foi deixada pelo proprietário porque surgiu uma oportunidade mais segura de moradia em outro bairro da cidade. O fato de o bairro e, principalmente, o fim de linha serem violentados por ações de facções e operações policiais, porém, inviabiliza a passagem do imóvel para a frente.

“Eu sou responsável pela venda de um imóvel de meu amigo, que já tem idade mais avançada e não mora mais no bairro. Está vendendo tem dois anos, mas ninguém aparece por conta da violência mesmo, é uma área perigosa. Imóvel bom, três quartos e bem acabado. Vendendo 30% abaixo do mercado e não encontra interessado”, explica ele, dizendo que nas últimas semanas a situação ficou pior.

A situação, que já não é nova, faz outro dono de imóvel da região que está à venda duvidar que alguém realmente se interesse em comprar o seu bem. “A casa é boa, não tá cara, mas da última vez que fui, tinha até marca de tiro na parede. Quem quer morar em um lugar assim? Você não pode sair à noite, se sair tem risco de morrer. Toda hora um tiroteio, não tem quem aguente essa vida, não. O povo tenta vender mesmo. Só fica por aqui quem não tem como continuar a vida em outro lugar”, diz, sem se identificar.

Outro morador, que não tem condições de deixar o bairro, afirma que quem pode está saindo, não quer ficar. No entanto, a maioria perde dinheiro por não encontrar interessados. “Em um lugar com tanto crime e violência, a gente só mora quando não tem jeito. As placas de venda estão aí há anos e muitos nem devem ter esperança. Não tem comprador. Quem passa ali sabe o caldeirão que é, não vai querer investir”, afirma, sem falar seu nome por medo.

Impacto nos preços
A dificuldade de vender os imóveis se dá mesmo em meio a valores bem abaixo do que eles poderiam representar. O corretor Karim Midlej Harfush explica que isso acontece porque, para além das condições estruturais, o valor de uma residência se mede pela localização e todas as circunstâncias inseridas nela.

“Independente da qualidade da estrutura e do tamanho do imóvel, a violência tem o poder de desvalorizá-lo. Mesmo espaçoso e bem acabado, pode ter, sim, uma desvalorização bem maior que imóveis pequenos. Todo sistema é afetado, e a desvalorização ocorre em torno de 30 a 40%”, fala Karim. 

A Rua Paraíba, em Tancredo Neves, tem diversos imóveis à venda (Foto: Paula Fróes/ CORREIO)

Ainda de acordo com o corretor, a situação também é a mesma para pontos comerciais. Isso porque, ao investir em um ponto numa área violenta, o empresário terá uma série de problemas e gastos a mais para lidar enquanto toca seu projeto.

“São vários impactos sobre o preço, tanto na área residencial como comercial. Quando se tem um bairro violentado, as famílias não saem de casa, e o comércio fica prejudicado, sem clientes. Há também um custo da violência, que faz o empresário investir mais em sistemas de segurança e até precise fechar mais cedo para evitar problemas”, explica.

Serviços básicos
A oferta de serviços básicos também é um complicador, visto que áreas assim impactam na educação e na saúde. Escolas de Tancredo Neves precisam fechar as portas toda vez que há episódios de violência. Na saúde, a vice-prefeita e secretária de Saúde, Ana Paula Matos, afirma que mudanças tiveram de ser feitas no bairro.

Houve até a necessidade de transferir pacientes de unidades da área. “Quando ficamos sabendo de uma situação dessa, fazemos uma regularização especializada para área, transferindo as pessoas e diminuindo o estresse da minha equipe. Ao mesmo tempo, abrimos espaço para outros que possam aparecer precisando do serviço”, fala Ana Paula.

Além disso, câmeras têm sido instaladas nas unidades e um posto de descanso policial foi transferido para a frente do Ponto de Atendimento Rodrigo Argolo, para melhorar a segurança do equipamento.

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