Por entre as ruas da Mooca, tradicional bairro paulistano da região leste de São Paulo marcado pela imigração italiana, é possível avistar postes coloridos com pinturas florais. A arte urbana é obra da professora aposentada Norma Gongora, de 83 anos. Incomodada com o abandono do local onde mora, ela decidiu que precisava fazer algo para trazer mais alegria aos arredores de sua casa. Em 2017, começou a pintar os postes da Mooca por conta própria. Seu trabalho despertou o interesse de vizinhos que pediam para que ela também pintasse outras pilastras. Ao longo de mais de cinco anos de dedicação, Norma já pintou cerca de 285 postes, entre novas pinturas e refações. Em entrevista ao portal da Jovem Pan, ela relembra o início da iniciativa. “Tudo começou porque eu via tudo muito sujo. O bairro parece meio abandonado já há alguns anos. Não é de agora. Então, eu resolvi dar uma alegria maior aqui, pelo menos nos arredores de onde eu moro. Não dá para pintar a região inteira, mas um pedacinho dá. É só querer e não chover. Foi assim que começou. Eu fiz um, e a vizinha reclamou porque fiz o meu e não o dela. Eu fiz o dela, e outra pessoa reclamou que não tinha feito o outro. Quando eu vi, tinha feito a rua inteira, e aí eu não parei mais”, recorda.
O gosto de Norma por pintar não é recente. Ele deu aulas de pintura por cerca de 40 anos, parando de lecionar apenas com o início da pandemia. Depois do isolamento social, a artista decidiu não retomar o trabalho e se dedicar apenas a seus hobbies. Hoje, o trabalho de Norma é feito apenas pelo seu prazer em pintar. “Enquanto eu tiver força e coragem, eu vou pintar. No dia em que eu não tiver mais, quem quiser que continue. Se quiser continuar, o que eu duvido, que as pessoas vão pôr o material e o trabalho, ficar no sol, na chuva, no vento para não ganhar nada. Eu duvido que apareça outra louca que nem eu”, graceja. A aposentada revela que possui um problema grave no joelho, mas que pretende continuar pintando enquanto tiver saúde. Ela define como “paz” o sentimento que tem ao pintar. “Me faz bem para a alma. Sempre gostei de pintura desde menina.”
A pintora conta que busca alternar as cores para que o poste possa sempre ser visto de longe. Além disso, ela sempre utiliza flores nos desenhos, por gostar do tema. Segundo Norma, a pintura dura cerca de dois anos e às vezes é preciso refazer o trabalho, que se desgasta com o tempo. Além da mão de obra, todos os custos e material são pagos pela aposentada. “Eu faço por minha conta. Compro a tinta, os pincéis, pinto, faço o que quero.” Ela conta que já chegou a receber, em algumas raras ocasiões, potes de tinta para o trabalho. Mas, no geral, costuma arcar com todos os custos. Pelo menos uma vez por semana, ela tenta dedicar um tempo para embelezar os postes da Mooca. Cada pintura leva de 1 hora e 30 minutos a 2 horas para ser feita, exclusivamente com pincel.
Ainda que não receba nenhum retorno financeiro com o projeto, Norma se sente satisfeita com a iniciativa. Ela compartilha que quando sai para pintar e famílias param para olhar, geralmente as crianças vão falar com ela. “Eu não sei se o trabalho é maravilhoso e perfeito, mas, se as crianças estão vendo cores e admirando, para eles é. Isso está despertando uma coisa em alguém, e isso me faz muito bem. Como eu dei aula muitos anos, minha maior satisfação era quando uma aluna minha ia fazer uma exposição e eu ajudava, quando alguém fazia algo melhor do que eu faço. Então, esse é o objetivo: incentivar as pessoas a fazerem alguma coisa boa”, afirma. A aposentada considera que nem sempre as pessoas podem fazer muito, mas que o pouco com Deus é muito. “Se todo mundo cuidasse somente da sua quadra, a cidade estaria maravilhosa. Só de não destruir já está fazendo muito.”
Para pessoas que também querem contribuir com o espaço que convivem, Norma afirma que é preciso trabalhar com o que gosta. Para ela, é importante que o trabalho seja feito com gosto e sem pensar em ganhos pessoais. “As pessoas sempre querem fazer as cosias com o intuito de algum proveito, mas não é assim que a gente faz o que é bom. A gente faz o que é bom porque quer fazer, porque se sente bem. Para mim, é uma felicidade quando as pessoas passam e elogiam. Esse é o pagamento, não precisa pagar mais nada”, reforça. A aposentada também faz um apelo para que as pessoas olhem para o próprio bairro, vejam o que está errado e façam algo a respeito, sem culpar a prefeitura. “Se você fizer alguma coisa, os outros também vão fazer. Se as pessoas vissem algo de errado e arrumassem, o mundo estaria maravilhoso”, completa.