InícioEditorialPolítica NacionalReforma Tributária é aprovada em comissão do Senado e avança para o...

Reforma Tributária é aprovada em comissão do Senado e avança para o plenário

Foto: Jonas Pereira/Agência Senado

Placar do texto-base foi de 20 votos a 6 07 de novembro de 2023 | 20:02

A Reforma Tributária avançou mais uma etapa no Senado Federal com a aprovação da PEC (proposta de emenda à Constituição) na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) nesta terça-feira (7).

O placar do texto-base foi de 20 votos a 6, em uma demonstração de apoio expressivo ao parecer do relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM). Nas últimas semanas, ele ampliou as exceções e elevou de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões o repasse anual que a União precisará fazer aos estados para que eles consigam financiar a atração de investimentos locais após a reforma.

A comissão rejeitou outras seis mudanças adicionais solicitadas por meio de destaque. Agora, a proposta precisa ser votada no plenário do Senado.

A previsão é que os dois turnos sejam concluídos ainda nesta quarta-feira (8). Se aprovada, a PEC passará novamente pelo crivo dos deputados, já que sofreu alterações.

Para angariar apoio político, o relator aceitou novas emendas parlamentares horas antes da votação. As alterações têm impacto para famílias de baixa renda, para setores econômicos e para estados e municípios, mas mantêm a espinha dorsal da reforma.

Braga ressaltou que as mudanças foram acordadas com o Executivo. “Isso tudo foi discutido com o ministro da Fazenda [Fernando Haddad], com o governo e com os senadores que compõem a CCJ”, disse.

“O relatório não é uma obra de arte perfeita, mas, na democracia, é a construção possível. Esta é a primeira Reforma Tributária que o Brasil constrói em regime democrático, o que é muito difícil”, disse o relator durante a sessão.

Além dos ajustes no texto, o governo também deflagrou uma estratégia de articulação. Após derrotas importantes sofridas na Casa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entrou em campo na véspera da votação e conversou com lideranças do Senado no Palácio do Planalto.

Apesar do risco remoto de rejeição a uma proposta tão relevante quanto a Reforma Tributária, o chefe do Executivo recebeu o alerta de aliados sobre a necessidade de fazer um gesto de aproximação aos senadores, que vinham relatando incômodo com a falta de envolvimento do Planalto nas negociações.

No encontro, segundo relatos, o presidente pediu votos e reforçou a mensagem de que a reforma é uma agenda estratégica para o governo. Já Haddad defendeu a pauta econômica de forma mais abrangente, ressaltando a importância de aprovar também as medidas que podem incrementar a arrecadação em 2024.

Além da atuação direta do presidente, o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, chegou pouco antes das 9h ao Senado. Appy acompanhou toda a sessão da CCJ junto com assessores e dialogou com parlamentares sobre as alterações de última hora, repetindo o ritual adotado desde a apreciação da PEC na Câmara.

Um dos principais ajustes de texto foi feito na chamada transição federativa, que vai durar 50 anos e compreende a redistribuição de receitas entre estados e municípios para evitar oscilações abruptas após a migração da cobrança dos tributos da origem (onde bens e serviços são produzidos) para o destino (onde ocorre o consumo).

Essa transição é invisível ao contribuinte, mas tem bastante peso e relevância para o planejamento fiscal dos governos regionais.

Na versão inicial do texto, estados e municípios poderiam manter patamar de receitas semelhante ao atual independentemente de esforço para fiscalizar o cumprimento da nova legislação ou do seu desempenho econômico permitindo que alguns pegassem “carona” na eficiência dos demais.

Por isso, o relator incluiu um fator de ajuste para premiar os entes que forem mais eficientes e conseguirem ampliar sua fatia no bolo total de receitas, como antecipou a Folha de S.Paulo.

Braga também incluiu um cashback (devolução de tributo pago) obrigatório para famílias de baixa renda na aquisição do gás de botijão. Na primeira versão, o reembolso já era compulsório para a conta de luz.

O relator ainda ampliou o escopo da prorrogação de benefícios fiscais a montadoras do Nordeste, Norte e Centro-Oeste para contemplar também automóveis flex (movidos a etanol e gasolina) e manteve a isenção para compra de veículos por pessoas com deficiência, transtorno do espectro autista ou por taxistas.

Braga fez um aceno aos estados do Centro-Oeste, permitindo que eles mantenham a taxação de produtos primários e semielaborados (como commodities agrícolas e minerais) até 31 de dezembro de 2043. Essa mudança é uma forma de compensá-los pela fatia menor no FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional).

O relator também retomou itens incluídos pela Câmara e que haviam sido excluídos na primeira versão do parecer, como a possibilidade de isenção ou alíquota zero para atividades de reabilitação urbana de zonas históricas. Ele ainda incluiu a possibilidade de criar um regime específico de tributação para Sociedades Anônimas do Futebol.

Desde o início da atual gestão, Haddad elegeu a Reforma Tributária como uma das prioridades da agenda econômica.

A proposta aprovada na CCJ prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

O sistema será dual: uma parcela da alíquota será administrada pelo governo federal por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e a outra, por estados e municípios pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).

Também será criado um Imposto Seletivo sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde (como cigarros e bebidas alcoólicas) ou ao ambiente, à exceção dos produzidos na Zona Franca de Manaus.

A implementação dos novos tributos começará em 2026, com uma alíquota teste de 0,9% para a CBS e de 0,1% para o IBS.

Em 2027, PIS e Cofins serão completamente extintos e substituídos pela nova alíquota de referência da CBS. As alíquotas do IPI também seriam zeradas para a entrada em vigor do Imposto Seletivo.

A migração dos impostos estaduais e municipais para o novo IBS será mais gradual. Até 2028, a cobrança se manterá em 0,1% —dividida em duas alíquotas de 0,05%, uma estadual e outra municipal.

Em 2029, a cobrança de ICMS e ISS passa a ser reduzida em 1/10 por ano até 2032. Em 2033, os impostos atuais serão totalmente extintos.

As alíquotas definitivas de cada tributo serão detalhadas depois, em lei complementar, mas estimativas do governo indicam que a cobrança total do novo IVA deve ficar entre 26,9% e 27,5% já contando com o efeito das exceções adicionais incorporadas por Braga em seu parecer.

A alíquota padrão vai incidir sobre a maior parte do consumo de bens e serviços no país. Se confirmados os cálculos do governo, ela tende a ser uma das mais elevadas entre os 174 países que adotam o modelo IVA para tributar o consumo.

A reforma ainda prevê alíquota zero para itens da chamada Cesta Básica Nacional, uma relação mais restrita de itens essenciais consumidos pelas famílias brasileiras.

Há outras duas categorias de alíquotas. A primeira é a reduzida, equivalente a 40% do valor cheio, aplicável a bens e serviços como saúde, educação, medicamentos, transporte coletivo urbano, semiurbano e metropolitano, além da cesta básica estendida (que inclui outros produtos alimentícios e de higiene não contemplados pela isenção).

A segunda é a intermediária, equivalente a 70% da cobrança integral, válida para profissionais liberais de categorias regulamentadas, como advogados, engenheiros e contadores, que estejam fora do Simples Nacional —na prática, profissionais que faturam mais de R$ 4,8 milhões ao ano.

Algumas das exceções, como saúde e educação, são também comuns em outros países que adotam o modelo IVA. Outras, no entanto, foram vistas pelo próprio governo como problemáticas. O tratamento diferenciado para profissionais liberais, por exemplo, não tem paralelo no mundo, segundo técnicos do Executivo e especialistas.

O texto aprovado ainda manteve regimes específicos aprovados pela Câmara, como combustíveis e serviços financeiros, e incluiu no rol de atividades agências de viagens e turismo, serviços de saneamento e de concessão de rodovias, além de operações que envolvam a disponibilização de estrutura compartilhada em telecomunicações.

A parcela dos serviços de transporte intermunicipal e interestadual também ficará num regime específico, o que acabará sendo mais vantajoso para o governo do que o tratamento anterior, com alíquota reduzida que poderia acabar gerando uma carga negativa, dada a quantidade elevada de créditos acumulados por essas companhias.

O texto ainda prevê uma reavaliação da conveniência de todos esses regimes a cada cinco anos.

Apesar das flexibilizações no texto, grande parte dos economistas defende a aprovação da reforma. Uma das vantagens do novo modelo é a redução significativa da tributação em cascata.

Com a PEC, as empresas poderão fazer uso mais amplo dos tributos pagos na aquisição de insumos como créditos para abater do valor a ser recolhido na comercialização de seus produtos ou serviços. Hoje, esse processo tem um alcance bem mais limitado, o que acaba fazendo com que as companhias paguem imposto sobre imposto.

Durante a tramitação no Senado, Braga ainda inseriu uma trava: a carga sobre o consumo não poderá ser maior do que a média observada entre 2012 e 2021 —um patamar próximo a 12,5% do PIB (Produto Interno Bruto).

Em entrevista à Folha de S.Paulo, o relator defendeu o mecanismo como uma forma de evitar aumento da carga para financiar expansão de despesas do governo, sobretudo em momentos de menor dinamismo da atividade econômica. “Se o [crescimento do] PIB for zero, amigo, vai ter que cortar gasto, porque não vai poder esticar a corda em cima do contribuinte”, disse Braga no início do mês.

ENTENDA A REFORMA TRIBUTÁRIA SOBRE O CONSUMO

Tributos extintos

– IPI (federal)

– PIS (federal)

– Cofins (federal)

– ICMS (estadual)

– ISS (municipal)

TRIBUTOS CRIADOS

– CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), na esfera federal

– IBS (o Imposto sobre Bens e Serviços), de competência estadual e municipal

– Imposto Seletivo (sobre produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente)

– A Cide, já existente, passa a poder incidir sobre importação, produção ou comercialização de bens que também tenham industrialização incentivada na Zona Franca de Manaus

OPERAÇÕES TRIBUTADAS PELA CBS E PELO IBS

– Serviços, bens (materiais ou imateriais) e direitos, inclusive nas importações

– Não incidem sobre exportações, com previsão de devolução do tributo pago pelo exportador sobre insumos

ALÍQUOTAS

– Padrão: deve ficar entre 26,9% e 27,5%, segundo cálculos da Fazenda

– Intermediária: 70% da padrão, concedida a profissionais liberais de categorias regulamentadas (ex: advogados, engenheiros, contadores).

– Reduzida: 40% da padrão, válida para as seguintes atividades:

– serviços de educação

– serviços de saúde

– dispositivos médicos

– dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência

– medicamentos

– produtos de cuidados básicos à saúde menstrual

– serviços de transporte coletivo rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano

– produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura

– insumos agropecuários e aquícolas

– alimentos destinados ao consumo humano

– produtos de higiene pessoal e limpeza majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda

– produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional

– bens e serviços relacionados a soberania e segurança nacional, segurança da informação e segurança cibernética

OUTRAS REDUÇÕES AUTORIZADAS EM LEI COMPLEMENTAR:

– Isenção para transporte coletivo

– Redução de 100% da alíquota total para medicamentos, dispositivos médicos e de acessibilidade para pessoas com deficiência, produtos de cuidados básicos à – saúde menstrual, além de produtos hortícolas, frutas e ovos (Cesta Básica Nacional)

– Redução de 100% da alíquota total para automóveis de passageiros adquiridos por pessoas com deficiência, pessoas com transtorno do espectro autista ou por motoristas profissionais que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi)

– Isenção ou redução em até 100% das alíquotas dos tributos para atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística

– Redução em 100% da alíquota da CBS incidente sobre o Prouni e sobre serviços prestados por entidades de inovação, ciência e tecnologia sem fins lucrativos.

– Limite de receita anual de R$ 3,6 milhões para que o produtor rural pessoa física ou jurídica possa não pagar IBS e CBS

REGIMES ESPECÍFICOS

– combustíveis e lubrificantes

– serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos (loterias e apostas)

SOCIEDADES COOPERATIVAS

– serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, agências de viagens e turismo, bares e restaurantes, atividade esportiva desenvolvida por Sociedade Anônima do Futebol e aviação regional

– operações alcançadas por tratado ou convenção internacional

– serviços de saneamento e de concessão de rodovias

– serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual, ferroviário, hidroviário e aéreo

– operações que envolvam a disponibilização da estrutura compartilhada dos serviços de telecomunicações

CASHBACK

Possibilidade de devolução de tributos a pessoas físicas, com o objetivo de reduzir as desigualdades de renda

Mecanismo será obrigatório para conta de luz e gás de botijão, focado em famílias de baixa renda

FUNDOS

– Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, com recursos da União para estados, para financiar instrumentos de incentivo à atividade local (valor inicial de R$ 8 bilhões em 2029, chegando a R$ 60 bilhões anuais a partir de 2043)

– Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas, com recursos da União (a ser detalhado em lei complementar)

– Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-fiscais do ICMS, destinado a compensar benefícios já concedidos a empresas e convalidados até 2032. Receberá R$ 160 bilhões da União entre 2025 e 2032.

GESTÃO DO IBS

– Texto cria Comitê Gestor do IBS, estrutura semelhante à que já existe no Simples Nacional

– Membros: 27 representantes dos estados e do Distrito Federal, mais 27 membros representando o conjunto dos municípios e do DF (sendo 14 deles eleitos por maioria de votos e 13 deles por votos de municípios ponderados pelas respectivas populações)

Idiana Tomazelli e Thaísa Oliveira / Folhapress

Você sabia que o Itamaraju Notícias está no Facebook, Instagram, Telegram, TikTok, Twitter e no Whatsapp? Siga-nos por lá.

Últimas notícias

Coaf aponta R$ 100 mi suspeitos com bets e cita empresário do Tigrinho

São Paulo — Relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) enviados à...

Fotografia de Liam Payne antes de morrer gera revolta nas redes sociais

Uma nova fotografia de Liam Payne, registrada momentos antes de sua morte, foi divulgada...

Stacey Kent: relação entre o jazz e a música brasileira é muito forte

A cantora norte-americana Stacey Kent lembra, direitinho, do dia em que a vida deu...

Mais para você