InícioEditorialO candidato Trump (por José Sarney)

O candidato Trump (por José Sarney)

O general Mark Milley foi o chefe do Estado Maior do Exército e das Forças Armadas americanas entre fins de 2019 e fins de 2023. Serviu, portanto, no governo Trump. Agora o jornalista Bob Woodward — um dos repórteres que revelaram o Watergate —, em livro que acaba de sair, War, cita declarações do general sobre Trump: “Ele é a pessoa mais perigosa que já existiu. Eu suspeitava quando falei para você sobre seu declínio mental, mas agora eu realizo que ele é um total fascista. Um fascista até o cerne.”

É verdade que ele tem razões pessoais para esse entendimento: além de ter convivido com Trump, este escreveu que ele deve ser executado por alta traição.
As ameaças de Trump estão, nesta reta final das eleições americanas, se multiplicando. Elas se dirigem a alvos específicos e a categorias genéricas. O inimigo, declarou há poucos dias, não é a China, são os traidores internos, os que não vão votar nele, os que se opõem a ele, os que desconfiam dele. Jornalistas que não o sigam de carteirinha estão entre os preferidos, alguns com dezenas de mensagens no Trump Social. Quem é da minha geração ou estudou o período entre as duas guerras mundiais lembra o processo da ascensão fascista.

É inacreditável que ele tenha dito que, se ganhar a eleição, não ajudará os Estados que não votarem nele. Há uma completa ausência de escrúpulos, a certeza de ser a lei e estar acima da lei, a convicção de que a estrutura do Estado deve estar sob seu controle direto e nas mãos de pessoas por ele escolhidas etc.
O medo está se instalando na sociedade americana com essa desarticulação mental do candidato republicano. Foi-se uma das garantias de Roosevelt: a libertação do medo — “freedom from fear” — do famoso discurso das “Quatro Liberdades”, quando o presidente americano preparava os Estados Unidos para entrarem na guerra — inclusive lembrando que o país seria atacado antes de declarar guerra, como aconteceria exatos onze meses depois em Pearl Harbour.
O número de pessoas que pretende fugir dos Estados Unidos se Trump vencer é enorme. E elas têm motivos. Os jornais de ontem trazem a história de funcionários da Defesa Civil tendo que ser retirados de locais onde ajudavam os esforços de recuperação porque a Guarda Nacional apreendeu milícias armadas que pretendiam eliminá-las, por acreditar que os furacões Helene e Milton foram criados pelo “dark state” ou por Kamala Harris e Joe Biden — as fotos espaciais que detectam traços sobre o Golfo do México não seriam multidões de pássaros migratórios, mas raios laser lançados para criar furacões contra populações republicanas…

O Brasil e o mundo conhecem o filme. O fascismo começa voltado para o interior de um país. Logo pode agir contra os vizinhos; depois quem estiver na frente que se cuide. O exemplo contemporâneo da quantidade de ditadores e autocratas que governam e provocam conflitos regionais que ameaçam a tranquilidade e a paz mundial dá medo.

 

José Sarney, ex-presidente 

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