
Quando assumi a Secretaria da Fazenda de Pernambuco, minha idade era pouco mais que uma pitada de ousadia. Aos vinte e poucos anos, tinha a responsabilidade em mãos e a frase de Nelson Rodrigues ecoava em minha mente: “Envelhecei, antes dos quarenta somos todos cretinos fundamentais!”. Porém, a sabedoria não é restrita a idades; cretinos e gênios habitam em todas as gerações.
Nelson, com sua postura provocadora, iluminava questões que hoje seriam apagadas pelo politicamente correto. Como resposta ao meu desafio, procurei escutar os mais experientes. Afinal, saber ouvir, ou como diria Horácio, “sapere aude”, é um convite para conhecer e crescer.
Em uma dessas audiências, conheci um deputado estadual, figura respeitada e amigo de meu pai. Seu pragmatismo era reconhecido, e sua experiência política, um verdadeiro aprendizado. Após cumprirmos as formalidades, e enquanto esclarecíamos pendências, ele, com um tom caloroso, me lançou uma lição de vida: “Governar é arrecadar e gastar, nomear e demitir; aos amigos, os favores; aos inimigos, os rigores da lei. Aqui, quem manda pode, e quem obedece, tem juízo”.
Sua fórmula, embora surpreendente à época, ainda ecoa na atualidade. Este “quem pode, manda; quem deve, obedece” não apenas permeia nosso sistema, mas também revela o autoritarismo que se infiltra na administração pública, onde a máxima do “sabe com quem está falando” ainda ressoa.
A reflexão sobre os interesses particulares que dominam as decisões públicas remete à obra de Frei Vicente do Salvador, que em 1627 já alertava: “Nem um homem nesta terra é de um bem comum”. Essa crueza se revela nos noticiários, onde o conflito entre Legislativo, Executivo e Judiciário deveria ser uma harmonia, mas frequentemente se transforma em crise, ferindo a estabilidade política.
Neste cenário de polarização e disputas acirradas, surge o lema individualista. Recursos são almejados por todos, enquanto vozes minoritárias tentam, silenciosamente, buscar soluções. A arte da governança se perde na luta pelo poder, onde o estado se torna um reflexo do ineficiente e esbanjador interesse privado.
A teoria da Separação dos Poderes, legada por Montesquieu, deveria nos guiar, mas a união entre poder e patrimonialismo continua a prevalecer. O mal se perpetua quando o interesse público é relegado ao segundo plano e as instituições são manipuladas em favor de um estamento burocrático que conquista privilégios.
Raimundo Faoro, em seu clássico “Os Donos do Poder”, identificou essa estrutura como particularmente perigosa. Os “donos” não formam uma casta; são habilidosos em extrair o máximo proveito dos sistemas de poder em que operam. Faoro, um democrata convicto, nos traz à mente a crítica à falta de objetividade e responsabilidade que, juntos, enfraquecem a política.
Em momentos como os atuais, a reflexão de Max Weber sobre o poder se faz ainda mais pertinente. Ele sugere que o desejo de poder pode se tornar uma autoembriaguez, desviando-se do serviço à causa, levando a perigosas irresponsabilidades que ecoam o egoísmo sob o manto da política.
Assim, se há dois pecados capitais na política, são a falta de objetividade e a vaidade exacerbada. E, no momento em que vivemos, o perigo de transformar o poder em um palco de ambições pessoais nunca foi tão real.
E você, o que pensa sobre o estado atual da política? Compartilhe suas reflexões e ajude a promover um diálogo construtivo. Sua voz é importante!