Nos últimos 40 anos, Sérgio Abranches, renomado cientista político, tem testemunhado a evolução institucional do Brasil após a ditadura. Agora, ele observa um momento crucial: o julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) relacionado à tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023. Para Abranches, este evento marca um novo capítulo na história democrática do país, onde pela primeira vez um ex-presidente e generais ativos estão sendo julgados por um tribunal civil.
A importância desse julgamento não pode ser subestimada. Abranches enfatiza que, diferente de países como Argentina e Chile, o Brasil nunca havia implementado uma justiça de transição para lidar com os crimes cometidos durante a ditadura. O fato de que militares agora são considerados culpáveis em tribunais civis representa uma transformação significativa na estrutura jurídica e institucional do país.
Em sua análise, o cientista político destaca a postura das Forças Armadas durante o processo. Apesar de protestos de militares da reserva, os atuais comandantes mantêm a ordem nos quartéis. Abranches acredita que a atual aceitação dos procedimentos é um sinal de controle recuperado após o tumulto vivido durante o governo Bolsonaro.
Ele afirma que, caso os réus sejam condenados, isso representará uma mudança decisiva na gestão das instituições brasileiras, pois nunca antes um evento desse tipo havia ocorrido. Para Abranches, o julgamento no STF se torna um exemplo internacional em tempos de crescente ascensão da extrema direita. “Isto mostra que é possível deter suas ações e manter o funcionamento das instituições”, defende ele.
No entanto, Abranches não se esquiva de criticar a disfuncionalidade do Congresso, que, segundo ele, não consegue formar coalizões eficazes. Ele observa que propostas de anistia apresentadas pelos parlamentares são um reflexo preocupante da falta de seriedade e técnica legislativa, impactando negativamente a democracia no país.
A movimentação política também envolve o governador Tarcísio de Freitas, que tem se posicionado contra o STF. Para Abranches, essa estratégia pode ser arriscada, já que Tarcísio, ao procurar fortalecer seu vínculo com a extrema direita, pode estar minando suas chances na disputa presidencial de 2026. “Na pré-campanha, não é o momento de riscos”, adverte Abranches.
O analista acredita que a eventual prisão de Jair Bolsonaro possa levar ao enfraquecimento da extrema direita no Brasil. A polarização política já está mostrando sinais de arrefecimento, com um número crescente de brasileiros se distanciando das extremidades ideológicas.
Ao entender a ascensão da extrema direita, Abranches observa que a insatisfação tende a ser mais relacionada com a economia, ao contrário de outros países, onde questões sociais como a imigração desempenham papel significativo. Ele argumenta que o Brasil, por sua vez, possui oportunidades de crescimento que ainda podem suplantar as frustrações impostas por dificuldades econômicas.
Em um cenário internacional, Abranches prevê um impacto desfavorável das ações do governo Trump na economia brasileira, o que pode, paradoxalmente, ajudar Lula em sua reeleição ao provocar reações negativas aos seus mandatos. O cientista político acredita que, apesar das tentativas de interferência, a soberania nacional se torna um tema inegociável para os eleitores brasileiros.
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