Entre marés e memórias: a trajetória da Cidade Baixa

Cine Roma – Foto: Cedoc A TARDE 1976

A história da Cidade Baixa é indissociável das águas da Baía de Todos-os-Santos, que moldaram não só sua geografia, mas também a cultura e os hábitos de seus habitantes. O historiador Milton Moura destaca que os nomes dos bairros refletem essa relação íntima com a água, desde Ribeira até Água de Meninos, revelando um passado marcado pela conexão com o mar e rios locais.

Antes da chegada dos portugueses, a área já era um espaço de rituais indígenas, com sambaquis que atestam o profundo vínculo das comunidades nativas com a terra. Com a colonização, o potencial defensivo da região foi prejudicado, limitando a ocupação e direcionando as atividades para a pesca e o reparo de embarcações. A Ribeira, com suas águas calmas, tornou-se um ponto crucial para a manutenção das embarcações que plenas de histórias cruzavam os mares.

A realidade da Cidade Baixa começou a mudar no século XVIII, com a construção da Igreja do Bonfim. Antes disso, a região não possuía grande população, mas a nova edificação atraiu romeiros e trabalhadores, impulsionando o crescimento local e dando início a um adensamento populacional significativo.

O Crescimento e a Indústria

Com a chegada do século XIX, a transformação da Cidade Baixa foi ainda mais acentuada pela instalação de indústrias e pela construção da linha férrea da Bahia de São Francisco Railway. Essa infraestrutura não apenas facilitou o transporte, mas também atraiu um número crescente de trabalhadores, transformando a dinâmica econômica e social da região.

Luiz Tarquínio, um empresário visionário, fundou em 1891 a primeira vila operária do Brasil, com condições de moradia que superavam em muito as da cidade. Essa vila, além de residências, oferecia serviços essenciais como escola e saúde, estabelecendo um novo padrão de vida no trabalho industrial.

Luiz Tarquinio criou a primeira Vila Operária em 1891 | Foto: Fernando Amorim / Cedoc A TARDE 1996

As indústrias floresceram, elevando a Cidade Baixa a um polo econômico até então desconhecido. Com o tempo, contudo, as mudanças econômicas levaram muitas empresas a deixar a região, mudando o cenário industrial de Salvador.

Memórias do Hidroporto

Ainda que as indústrias tenham deixado marcas profundas, um outro aspecto marcante da história da Cidade Baixa foi o hidroporto, inaugurado em 1935. Essa estrutura tornou-se sinônimo de inovação e modernidade, atraindo a atenção de personalidades como o presidente Getúlio Vargas, que desembarcou ali em 1939.

Infelizmente, o tempo trouxe o abandono, e hoje restam poucas evidências de sua grandiosidade. Ruínas silenciosas têm histórias para contar, lembrando a empolgação de um passado vibrante.

O Cine Roma e o Rock Baiano

Na década de 1940, os moradores da Cidade Baixa desfrutaram de um novo espaço de entretenimento: o Cine Roma. Inaugurado por Irmã Dulce e frei Hildebrando, o cinema não apenas projetava filmes, mas tornou-se um centro cultural vibrante, especialmente durante o auge do rock baiano. O Cine Roma foi o berço de grandes nomes como Raul Seixas, que moldaram a cena musical da época.

Cine Roma, epicentro do rock na Bahia | Foto: Geraldo Ataíde / Cedoc A TARDE 1987

Com sua programação diversificada, o Cine Roma se tornava palco de importantes apresentações musicais, atraindo não apenas os jovens da Cidade Baixa, mas também aqueles da Cidade Alta. Seu papel na formação cultural da Bahia não pode ser subestimado.

Raul Seixas, uma das figuras mais emblemáticas do rock nacional, viveu na Cidade Baixa, onde iniciou sua trajetória musical ao lado de Waldir Serrão. A história de Raul é um testemunho do espírito criativo e da intensidade cultural que floresceu na região.

A Cidade Baixa, com suas camadas de histórias e transformações, é um microcosmo da história da Bahia. Nós convidamos você a se aprofundar mais nesse passado vibrante. O que mais te fascina sobre a história da Cidade Baixa? Compartilhe nos comentários!