14 outubro, 2025
terça-feira, 14 outubro, 2025

Burnout, ansiedade, depressão: DF registra 45 ocorrências relacionadas ao trabalho por dia

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Provavelmente, você não deve saber o significado da sigla DART. Porém, com toda certeza, já sofreu ou conhece alguém que tenha sofrido um acidente de trabalho ou desenvolvido um burnout por causa do ambiente de trabalho. No Distrito Federal, isso é mais comum do que se pode imaginar.

Somente até o fim de setembro, 12.237 registros de doenças e agravos relacionados ao trabalho (DARTs) foram notificados à Secretaria de Saúde (SES-DF) — uma média diária de 45 casos. A maioria está relacionada a acidentes de trabalho (9508).

Além disso, outras doenças e agravos são comuns, de acordo com a psicóloga e especialista em saúde mental no trabalho Denise Milk. “Destacam-se as LER/DORT (lesões por esforço repetitivo e distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho), o estresse ocupacional, a síndrome de burnout, os transtornos de ansiedade e as depressões reativas ao ambiente laboral”, comentou.

Veja os números do DF:

Segundo a especialista, geralmente, as DARTs aparecem de forma gradual e silenciosa. “Podem ser fruto da exposição contínua a condições adversas, como sobrecarga de trabalho, falta de pausas, posturas inadequadas, metas inalcançáveis, ausência de reconhecimento e relações interpessoais desgastantes”, avaliou.

“Com o tempo, o corpo e a mente sinalizam o excesso — primeiro com pequenas dores, cansaço, irritabilidade — até evoluir para quadros clínicos mais sérios”, alertou Denise.

Trabalho exaustivo

Foi o que aconteceu com uma trabalhadora do DF, de 33 anos, que não quis se identificar, por medo de represálias. Ela contou que foi diagnosticada com síndrome de burnout, depois de um período muito intenso de cobrança e excesso de tarefas no trabalho.

“Comecei a perceber que algo estava errado quando mesmo descansando eu não conseguia relaxar. Tinha crises de ansiedade antes de ir trabalhar, insônia e uma sensação constante de exaustão”, relatou. “Foi aí que percebi que o problema estava diretamente ligado à rotina profissional. Comecei também a desenvolver depressão, a me cobrar absurdamente”, acrescentou.

Ela disse que tinha todos os sintomas e não sabia do que se tratava. “Não entendia também que o trabalho era tóxico. O meu chefe falava do meu corpo, que tinha engordado demais. A outra chefe só passava demandas aos gritos. Era surreal”, recordou.

Quando precisou se afastar, por causa do burnout, ela afirmou que, no início, foi difícil. “Me sentia culpada por ter me afastado. Mas, com o tempo, e com acompanhamento médico e psicológico, entendi que precisava desse tempo para me recuperar”, pontuou.

Retorno complicado

De acordo com a trabalhadora, durante o afastamento, o suporte por parte da empresa foi limitado. “Era basicamente o contato com o RH (recursos humanos) para resolver a parte burocrática”, lamentou.

“Na volta, senti falta de um acompanhamento real, tanto da liderança quanto de ações voltadas à saúde mental. Foi um retorno complicado. Só fui melhorar depois que troquei de emprego”, afirmou.

Depois da experiência ruim, ela disse que passou a reavaliar as prioridades. “Hoje, tento impor limites, cuidar mais de mim e manter um equilíbrio maior entre vida pessoal e profissional. Ainda é um desafio, mas aprendi a reconhecer os sinais de sobrecarga”, ressaltou.

Espaços seguros

Mestre em desenvolvimento humano pela Universidade de Brasília (UnB), a psicóloga Thirza Reis afirmou que o tratamento das DARTs precisa ser integral: corpo, mente e contexto.

“Na prática, envolve psicoterapia, acompanhamento médico e, às vezes, fisioterapia ou medicação. Mas, o principal é entender que não adianta tratar o indivíduo e manter o ambiente que o adoeceu”, alertou.

Por isso, segundo a especialista, o empregador tem um papel essencial. “Prevenir DARTs não é oferecer café especial ou um dia de palestra sobre bem-estar. É rever a forma como o trabalho acontece”, avaliou.

“Empresas corajosas criam espaços seguros onde as pessoas possam dizer ‘não estou bem’ sem medo. Elas formam líderes com inteligência relacional, capazes de escutar e agir com empatia. E entendem que limite é cuidado, não preguiça”, ressaltou a psicóloga.

Direitos trabalhistas

Além da recuperação plena da saúde, uma pessoa que contrai uma doença ou agravo relacionado ao trabalho também tem outros direitos. A advogada especializada em direito do trabalho Rita Cássia Biondo pontuou que, quando o trabalhador adquire uma doença ocupacional — seja profissional (decorrente da atividade em si) ou do trabalho (decorrente das condições em que o serviço é prestado) — a lei equipara essa situação a um acidente de trabalho.

Segundo a especialista, após o afastamento, o trabalhador passa a ter diversos direitos assegurados, tanto de natureza previdenciária quanto trabalhista.

De acordo com a advogada, alguns deles são:

– Auxílio-doença acidentário, pago pelo INSS após os 15 primeiros dias de afastamento pagos pelo empregador;

– Depósito do FGTS durante todo o período de afastamento;

– Reintegração ou indenização substitutiva, caso seja dispensado durante o período de estabilidade, o colaborador pode ser reintegrado ao trabalho ou receber uma indenização desse período;

– Direito à reabilitação profissional pelo INSS, caso fique impossibilitado de exercer sua função original;

– Indenizações por danos morais, materiais e estéticos, se houver culpa da empresa.

Para fazer valer seus direitos, segundo Rita, o trabalhador deve comprovar o nexo causal entre a doença e a atividade laboral. “É praticamente um passo a passo jurídico, começando por laudos e atestados médicos que relacionem a doença ao trabalho, solicitar e cobrar da empresa a emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT)”, explicou.

Urgência na ação

Procurada pela reportagem, a Secretaria de Saúde informou que os dados de notificações de doenças e agravos relacionados ao trabalho dos anos de 2024 e 2025 apontam um cenário de crescimento expressivo no número de registros, “evidenciando a necessidade de maior atenção às políticas de prevenção e segurança no ambiente de trabalho”.

“Esses dados não apenas evidenciam a magnitude do problema, mas também reforçam a necessidade urgente de ação”, ressaltou a pasta.

De acordo com a secretaria, as iniciativas alinhadas à Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, com foco em ações educativas, fiscalização e promoção da saúde no ambiente de trabalho foram intensificadas. “Essas medidas visam proteger a saúde dos trabalhadores, prevenir riscos e garantir condições adequadas para o exercício de suas funções, conforme preconizado pela política nacional”, afirmou a nota.

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