A Sabesp, em uma movimentação que promete gerar discussões, anunciou a possibilidade de recarregar os mananciais que abastecem a Grande São Paulo com água tratada de estações de esgoto. Essa medida visa aumentar a disponibilidade hídrica, mas detalhes sobre como será operacionalizada ainda estão em estudo. Até agora, a companhia planeja capturar 2.000 litros por segundo no Alto Cotia, provenientes da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Barueri, e 800 litros por segundo no reservatório de Taiaçupeba, vindos da ETE de Suzano.
A legislação atual proíbe a utilização direta dessa água de reuso para consumo, estabelecendo que, antes de chegar às residências, ela deve passar por processos adequados de diluição. Um trecho de água tratada precisa primeiro ser lançado em um curso d’água de vazão suficiente para permitir a mistura segura antes de ser captada novamente, garantindo que atenda às normas de potabilidade.
O especialista em gestão de recursos hídricos, Antônio Carlos Zuffo, explica que o que se permite é um reuso indireto. “A água que relutantemente vai para a rede de esgoto, ainda que tratada, acaba entrando em cursos d’água, sendo depois captada por diversas cidades e indústrias abaixo”, esclarece. Esse método, embora mais seguro do que a captação de esgoto bruto, ainda carrega seus riscos.
Amauri Pollachi, coordenador do Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento (Ondas), enfatiza a complexidade dessa solução, sugerindo que a ampliação do uso de água de reuso para outras finalidades, como irrigação e lavagem de ruas, seria uma estratégia mais eficaz do que para recarga de mananciais. “As ETEs estão dispersas em relação ao sistema que abastece a população”, alerta.
Historicamente, a Sabesp já havia experimentado essa abordagem. Há cerca de 20 anos, testes com efluentes da ETE Barueri foram realizados, mas não conseguiram comprovar viabilidade imediata. Essa proposta originou de estudos que datam de 1997, que previam a substituição da vazão natural do Alto Cotia pelo efluente tratado, passando por áreas alagadiças para uma purificação natural.
A situação se torna ainda mais crítica ao se considerar os custos cada vez mais altos para buscar novos mananciais. Pollachi destaca que, por um custo exorbitante de R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões para a captação de água a 250 km de distância, é crucial que o foco se dirija à diminuição das perdas de água, um verdadeiro “enxugar gelo”, segundo ele.
Enquanto isso, alternativas como a perfuração de poços artesianos são vistas como soluções locais e limitadas. Com a Grande São Paulo sendo predominantemente composta por rochas cristalinas, a quantidade de água subterrânea é escassa e muitas vezes contaminada. A busca por recursos hídricos distantes é inviável sem o desenvolvimento de novas tecnologias.
O potencial de reuso na Grande São Paulo ainda é subutilizado. Pollachi sugere que se metade da água tratada nas ETEs fosse direcionada para finalidades como a limpeza de veículos e pátios, isso poderia preservar até 15 metros cúbicos de água potável para o consumo humano. “Isso deve ser incentivado”, diz ele, enfatizando a necessidade de uma abordagem mais racional.
Exemplos internacionais mostram que a reusabilidade de efluentes, quando bem manejada, pode ser uma solução eficaz. Na Califórnia e em várias cidades europeias, efluentes são direcionados a aquíferos, onde se diluem naturalmente, aumentando a segurança do abastecimento. “Israel também lança efluentes tratados em rios para serem captados posteriormente para irrigação”, acrescenta Zuffo.
Em resposta às crescentes dúvidas, a Sabesp afirma estar explorando a recarga de mananciais como parte de uma estratégia sustentável para enfrentar os desafios hídricos. A companhia está envolvida em estudos que comparam tecnologias globais avançadas e ressalta que qualquer projeto passará por rigorosas análises e aprovação de órgãos competentes.
O debate sobre o uso de água de reuso é vital. Ao pensarmos nas mudanças climáticas e na escassez hídrica, como você imagina que poderiam ser implementadas soluções mais eficazes para garantir o abastecimento de água na sua região? Compartilhe suas ideias e contribuições nos comentários!
