16 outubro, 2025
quinta-feira, 16 outubro, 2025

“Tem que sofrer”, disse bombeiro que socorreu estudante morto pela PM

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Novas gravações das câmeras corporais de policiais envolvidos na morte do estudante de medicina Marco Aurélio Cárdenas Acosta mostram a ação dos agentes durante o socorro dado ao jovem, baleado em novembro de 2024. Após levar a vítima para a sala de cirurgia do hospital, um dos bombeiros que participou do resgate foi filmado zombando do atendimento.

Marco Aurélio tinha 22 anos quando foi morto, após levar um tiro à queima-roupa de um policial militar, durante abordagem dentro de um hotel, na Vila Mariana, na zona sul de São Paulo.

A bodycam de um dos agentes registrou o resgate do estudante no Hospital Ipiranga. Nas imagens, é possível ver os primeiros atendimentos, ainda na entrada da unidade hosptitalar. A instituição estava sem equipamento para tomografia e socorristas chegam a colocar o dedo dentro da ferida da vítima na tentativa de localizar a bala alojada.

Depois, o jovem foi encaminhado para o centro cirúrgico. Um policial, acompanhado de dois bombeiros, vai até o local, mas é impedido de entrar na sala de cirurgia. “Só queria saber onde ele estava”, diz o PM para um dos bombeiros.

“Agora ele vai para a cirurgia e está na mão dos médicos”, responde o socorrista, enquanto eles deixam o centro cirúrgico. “Mas eles falaram que estão sem tomografia, não tem como localizar [o projétil]. Vai ser na mão mesmo”, completa.

Outro bombeiro comenta: “Tem que sofrer mesmo, pô”, e o primeiro sorri.

Então, o agente que zombou da situação parece perguntar para o policial se a bodycam estava desligada. Ele ainda se aproxima do PM e os dois sussurram. A conversa é inaudível.

Veja:


Relembre o caso

  • Marco Aurélio Cardenas Acosta, 22 anos, estudante do 5º ano de medicina, foi morto por policiais na madrugada de 20 de novembro de 2024, dentro de um hotel na Vila Mariana, zona sul de São Paulo.
  • Ele teria dado um tapa no retrovisor da viatura policial, enquanto aparentava estar alterado e seguiu correndo até o hotel.
  • Os policiais o perseguiram até o hotel. No saguão, houve confronto: ele tentou se soltar e caiu no pé de um dos agentes.
  • Um dos PMs sacou a arma e disparou no abdômen de Marco Aurélio, que caiu.
  • Ele foi atendido no Hospital Ipiranga, mas não resistiu e faleceu horas depois.
  • O Ministério Público do estado (MPSP) denunciou os dois PMs por homicídio qualificado, com descrições de “motivo torpe” e “impossibilidade de defesa da vítima” — para um dos PMs, pediu prisão preventiva, e o outro figura como cúmplice.
  • Os PMs foram afastados das atividades operacionais enquanto o caso é analisado.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) afirmou que os diálogos “não representam o posicionamento institucional do Corpo de Bombeiros, tampouco condizem com as diretrizes e protocolos adotados pela Instituição”.

“Era folgado”, dizem PMs sobre jovem morto

Em outro momento, já dentro do hospital, enquanto a vítima estava deitada em uma maca, agonizando de dor, outro policial, não identificado, disse saber que se tratava de um estudante de medicina e disse que o jovem era “folgado”.

Com base nas novas filmagens, os advogados da família do estudante fizeram um novo pedido de prisão dos policiais militares envolvidos. Para os pais de Marco Aurélio, os diálogos indicam que a ação violenta não teria sido motivada por um tapa dado no retrovisor, como afirmaram os PMs, mas sim “por um viés discriminatório”.

As novas imagens também mostram que, minutos após o ocorrido, os policiais mentiram aos colegas sobre a ocorrência. O agente responsável pelo disparo, Guilherme Macedo afirma que, após derrubar o policial Bruno Prado, o jovem “veio para cima”, o que não aconteceu.

“Veio para cima, ele derrubou o Prado na escada. Aí eu tentei fazer a detenção dele de outra maneira, ele veio para cima de novo. Foi a hora que eu efetuei o disparo nele”, disse.

Julgamento

Ainda não está definido se os réus, os policiais Guilherme Augusto Macedo e Bruno Carvalho do Prado, serão ou não submetidos a julgamento pelo Tribunal do Júri. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou ao Metrópoles que a segunda audiência de instrução do caso foi realizada no dia 9 de outubro, encerrando a instrução do processo. Agora, as partes apresentarão suas alegações finais por escrito e, depois de encerrada essa etapa, será decidido sobre o júri.

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Estudante é encurralado por PMs

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Estudante é encurralado por PMs

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PM tenta conter estudante

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Estudante segura perna de policial

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Estudante segura perna de policial

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Estudante segura perna de policial

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Estudante empurra policial, que cai no chão

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A Secretaria da Segurança Pública afirma que os fatos foram rigorosamente investigados pelas polícias Civil e Militar. “As imagens registradas pelas câmeras operacionais portáteis (COPs) foram anexadas aos procedimentos conduzidos pela Corregedoria da PM e pelo Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP)”, diz a pasta.

“O policial militar envolvido foi indiciado por homicídio doloso [intencional] no Inquérito Policial Militar (IPM) e permanece, desde o ocorrido, afastado de suas atividades operacionais. A Instituição aguarda a conclusão do processo criminal e a manifestação do Poder Judiciário”, conclui a nota.

Segundo o Ministério Público de São Paulo, os autos serão disponibilizados em breve para as alegações finais do órgão. “No momento, não há fato novo que pudesse justificar o aditamento da denúncia, tampouco alteração no estado de liberdade dos acusados, haja vista que o TJ negou provimento ao recurso do MPSP e manteve a liberdade provisória de ambos, existindo recurso interposto pelo assistente da acusação ainda pendente de julgamento”, disse o MP.

Denúncia à ONU

Em painel realizado no dia 19 de julho na 59ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), os pais do estudante de medicina pediram a responsabilização do governo de São Paulo pela morte de seu filho e do estado brasileiro pelas violações de direitos humanos decorrentes da violência policial que ocorre em todo o país.

Além disso, Julio Cesar Acosta Navarro e Silvia Mônica Cardenas Prado entregaram uma denúncia, realizada juntamente com a entidade Conectas Direitos Humanos, pedindo responsabilização dos policiais envolvidos no caso de Marco Aurélio.

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