Exames de vista em óticas se popularizaram pelo apelo da conveniência: são rápidos, gratuitos e logo após você pode sair com um par de óculos novinho em folha. Mas será que esse modelo é confiável? O que você realmente está avaliando ali? E quais são os riscos de se apoiar exclusivamente nesse tipo de atendimento para cuidar da sua saúde ocular?
Antes de qualquer julgamento, é preciso entender o que é realmente oferecido em uma ótica.
- Consulta oftalmológica completa: conduzida por um médico oftalmologista, formado em medicina com especialização de três anos, essa consulta avalia a saúde do olho como um todo — retina, córnea, pressão intraocular, fundo de olho e possíveis doenças ocultas como glaucoma ou degeneração macular.
- Exame de refração: também chamado popularmente de “exame de vista”, é apenas a medição da acuidade visual e da necessidade de correção por óculos ou lentes. Ele identifica se você tem miopia, hipermetropia, astigmatismo ou presbiopia.
A maior parte das óticas oferece somente o exame de refração, muitas vezes realizado por técnicos de óptica ou optometristas — que, no Brasil, não são reconhecidos como substitutos do médico oftalmologista em diagnósticos clínicos.
O Que Diz a Lei Sobre Exame de Vista em Óticas?
No Brasil, apenas médicos com CRM ativo têm autorização para diagnosticar doenças e prescrever tratamentos. Isso inclui a prescrição de óculos, que, legalmente, deve ser feita após avaliação médica completa.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) é claro: a prática da medicina, incluindo a avaliação de condições oculares, é exclusiva dos médicos. Portanto:
- O exame de refração pode ser feito por técnicos, mas não substitui a consulta oftalmológica.
- Uma ótica não pode diagnosticar doenças oculares, muito menos emitir receitas para tratamento medicamentoso ou cirurgias.
Riscos Ocultos de Fazer Apenas o Exame em Ótica
Embora muitas pessoas saiam satisfeitas de uma ótica com um novo par de óculos, há armadilhas importantes ao ignorar a consulta médica:
1. Doenças Silenciosas Não São Detectadas
Doenças como glaucoma, retinopatia diabética e degeneração macular podem evoluir sem sintomas. Sem um exame de fundo de olho ou aferição de pressão intraocular, elas passam despercebidas.
2. Prescrição Incorreta
Refrações mal feitas podem gerar dores de cabeça, tontura, fadiga visual e desconforto contínuo. A experiência e treinamento do profissional fazem toda a diferença.
3. Confusão com Condições Neurológicas
Problemas de visão às vezes têm origem neurológica (como tumores, AVCs ou neuropatias ópticas). Um técnico pode interpretar erroneamente um sintoma grave como um simples erro refrativo.
A Visão de Especialistas
Para aprofundar essa análise, conversamos com o oftalmologista Dr. Aron Guimarães, que atua na Clínica Vizon, em Campinas. Segundo ele, “os exames realizados em óticas não são padronizados como os exames médicos. Muitos pacientes chegam ao consultório com sintomas que não foram identificados previamente porque acreditavam que o exame feito na ótica era suficiente”. Dr. Guimarães reforça que o exame de refração, por mais bem feito que seja, não substitui a avaliação médica completa, especialmente quando se trata da detecção precoce de doenças oculares.
Quando a Ótica Pode Ser Útil?
Mesmo com suas limitações, a ótica pode ter um papel complementar — especialmente após você já ter passado por uma consulta oftalmológica:
- Ajustes de grau simples: para quem já conhece sua condição e quer verificar pequenas mudanças na acuidade visual.
- Confecção de novos óculos: a ótica pode usar uma receita recente para confeccionar a lente ideal.
- Testes de adaptação a lentes progressivas ou multifocais.
Nesse contexto, a ótica atua como parceira, e não substituta do médico.
Exames Avançados Só o Oftalmologista Realiza
A medicina oftalmológica moderna usa recursos que estão muito além da alçada das óticas:
Exame | Finalidade |
Fundo de olho | Avaliação da retina, mácula e nervo óptico |
Tonometria (pressão ocular) | Diagnóstico de glaucoma |
Mapeamento de retina | Detecção de tumores e hemorragias |
OCT | Tomografia de retina para doenças como DMRI |
Campimetria visual | Avaliação de perda de campo visual, comum no glaucoma |
Esses exames exigem equipamentos especializados e interpretação médica qualificada.
A Regra de Ouro: Visite o Oftalmologista Uma Vez Por Ano
A recomendação universal dos órgãos de saúde é clara: todo adulto deve visitar o oftalmologista ao menos uma vez por ano, mesmo sem sintomas. Crianças, idosos e diabéticos precisam de ainda mais atenção.
A ótica pode ser parte do cuidado visual, mas não pode (e não deve) substituir o médico. Ignorar isso pode sair caro — tanto financeiramente quanto em termos de saúde.
Considerações finais
Fazer exame de vista em ótica é prático, mas não é o bastante. É confiável dentro de um escopo restrito: apenas para verificar o grau da visão, e mesmo assim com limitações importantes. Para qualquer avaliação séria, diagnóstico de doenças, prescrição precisa ou tratamento, é indispensável passar por um médico oftalmologista.
Cuidar da visão exige mais do que conveniência — exige precisão, responsabilidade e, principalmente, acompanhamento profissional de verdade.