Casa Branca vê o acordo como uma oportunidade de reposicionar os EUA como mediadores globais de confiança, depois de meses de críticas ao apoio militar irrestrito aos israelenses
John Wessels/AFP
Um casal se abraça na Praça dos Reféns, em Tel Aviv, após o anúncio do novo acordo de cessar-fogo em Gaza
Em um movimento histórico e inesperado, Estados Unidos, Israel e Hamas chegaram a um acordo que promete encerrar um dos conflitos mais sangrentos e duradouros do Oriente Médio. A trégua, costurada sob intensa mediação americana, prevê cessar-fogo em Gaza, libertação progressiva de reféns e prisioneiros, além do início de um plano de reconstrução supervisionado por forças internacionais.
O anúncio foi recebido com esperança e prudência pela comunidade internacional. Já em Washington, o tom foi de alívio estratégico, mas não de euforia. Para os americanos, a paz é bem-vinda — mas precisa ser controlada, verificável e sustentável.
O olhar americano: paz como estratégia Sob a ótica dos Estados Unidos, o acordo não é apenas um gesto humanitário — é também uma manobra geopolítica calculada. Ao assumir a liderança do processo de paz, Washington retoma o protagonismo no Oriente Médio, num momento em que sua influência vinha sendo desafiada por potências como China e Rússia.
Segundo o analista Nick Cleveland, do Quincy Institute, em Washington DC, a Casa Branca vê o acordo como uma oportunidade de reposicionar os EUA como mediadores globais de confiança, depois de meses de críticas ao apoio militar irrestrito a Israel e ao impacto humanitário da guerra em Gaza. A trégua, portanto, funciona como um freio diplomático e um resgate moral.
“Após dois anos desse cerco militar brutal de Israel a Gaza, o acordo oferece esperança para o fim da violência e uma rara oportunidade para os EUA recuperarem alguma confiança como mediadores mundias. No entanto, a comunidade internacional deve esperar para celebrar; Israel rompeu rapidamente o último acordo de cessar-fogo e, sem pressão do governo Trump ao governo israelense, a história pode se repetir”, afirmou o analista.
Os pontos do acordo O entendimento firmado inclui:
Cessar-fogo imediato e suspensão das operações militares em Gaza; Libertação gradual de reféns israelenses e de prisioneiros palestinos; Entrada de ajuda humanitária e médica supervisionada por organismos internacionais; Formação de um governo transitório em Gaza, com presença técnica internacional; E, em fases posteriores, um plano de reconstrução financiado por países ocidentais e árabes. Fontes diplomáticas afirmam que o documento teve a marca direta da equipe americana de mediação, que atuou em conjunto com Egito e Catar.
Washington quer paz — mas sem ingenuidade Apesar do tom otimista, o olhar americano permanece pragmático. A visão em Washington é que a paz verdadeira dependerá da capacidade de implementação. Isso inclui o desarmamento progressivo do Hamas, o comprometimento de Israel com a retirada gradual de Gaza e, sobretudo, a criação de uma estrutura de governança estável para evitar o retorno da violência.
Para os Estados Unidos, a trégua é também um teste de credibilidade: se o acordo se sustentar, a diplomacia americana volta a ser vista como eficaz; se ruir, o fracasso recairá sobre a própria liderança dos EUA. “Essa paz é mais uma engenharia política do que um abraço entre inimigos. Mas é justamente isso que a torna possível”, resume o analista Nick Cleveland.
Interesses e riscos Por trás do discurso de paz, há claros interesses estratégicos americanos:
Evitar uma escalada regional que envolva Irã e Hezbollah; Reduzir o desgaste político de Washington diante das críticas internas sobre a guerra; E preservar a estabilidade energética e comercial na região. Ainda assim, há riscos evidentes. Setores da coalizão israelense consideram o acordo uma concessão perigosa. Já o Hamas, segundo fontes internacionais, aceitou a trégua sem abrir mão completamente do controle político sobre Gaza, o que pode gerar tensões futuras.
Uma paz pragmática A trégua entre Israel e Hamas, com mediação americana, não é o fim da guerra — é o começo de uma administração da paz. Do ponto de vista dos Estados Unidos, o acordo representa um avanço diplomático e uma chance de reconstruir a confiança internacional, mas não elimina os riscos de recaída. Washington comemora, mas mantém os olhos abertos. A paz chegou — ainda que em formato provisório, vigiado e calculado.