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Mais um passo antes da aposentadoria

Em um país com mais de 160 milhões de pessoas registradas e aptas a votar, a logística é sempre um grande desafio. Nós como brasileiros, sabemos o quão desafiador é para a Justiça Eleitoral garantir a todos os cidadãos de nossa república seu direito ao voto, especialmente nas regiões mais remotas de nosso território na Amazônia. Nos Estados Unidos da América o terreno é igualmente desafiador, mas com questões eleitorais tão peculiares em cada um dos estados e com grande grau de autonomia em cada membro da federação, vemos que uma eleição nacional e com impactos mundiais começa muito mais cedo. Para evitar as grandes filas e problemas organizacionais em zonas tão heterogêneas do país, muitos estados oferecem três tipos diferentes de votação: aquelas por correio, a votação presencial antecipada e a votação presencial no dia oficial das eleições (o próximo 05 de novembro). As eleições que tradicionalmente acontecem em uma terça-feira, a primeira do mês de novembro, representa para muitos americanos uma dificuldade em mudar seus afazeres por conta do voto, portanto a antecipação acaba sendo uma escolha cada vez mais recorrente dentro do eleitorado. Tal fato se mostra verdadeiro quando os dados indicam que até agora mais de 40 milhões de americanos já votaram, ou seja, um quarto dos votos já estariam decididos.

Hoje mais um cidadão americano, talvez o mais importante deles na atualidade, o presidente Joe Biden votou de maneira antecipada na cidade de Wilmington no pequeno estado de Delaware. De maneira discreta para um presidente, Biden esperou na fila com todos os demais, ajudou a empurrar a cadeira de rodas de uma senhora que também esperava para votar, entrou na cabine e votou em uma cédula sem o seu nome. O voto de Joe Biden em sua vice Kamala Harris, carrega enorme simbolismo em diversas frentes para a atual fase em que atravessa os Estados Unidos. Joe Biden, um descendente de irlandeses, nascido no rico estado da Pensilvânia, católico, homem público com 5 décadas de experiência como senador, vice-presidente e presidente no alto de seus 81 anos espera passar adiante a tocha da democracia para uma candidata que tem a face de uma América mais moderna. Kamala Harris, filha de uma indiana com um jamaicano, nascida no grande estado da Califórnia, procuradora-geral do estado, senadora e vice-presidente, com a boa disposição de seus 60 anos, espera receber do povo americano em uma semana, a chance de liderar a nação mais poderosa do planeta. Tais questões biográficas são tratadas por muitos como clichês, mas trazem importante reflexão acerca de um país que mudou bastante demograficamente e que necessita urgentemente de lideranças mais jovens, sejam republicanas ou democratas, para fazer os Estados Unidos superar os desafios de um mundo em constante transformação.

A maneira como votou Joe Biden hoje, sem holofotes, sem muito entusiasmo, remete a também enfadonha forma como encerrou sua campanha forçadamente e endossou sua vice. Após a decepcionante performance em seu primeiro debate em 2024 contra Donald Trump no mês de junho, a pressão partidária e as críticas da imprensa, Biden se deu conta que a idade chega para todos. Por mais que nos preparemos para a velhice, por mais que pensemos estar acima da média, uma hora ou outra, as décadas servindo uma nação, o peso dos anos vividos, a tensão de dias de muita responsabilidade, todos eles nos cobrarão a conta em algum momento. Para Joe Biden, esse dia de votação em Delaware o colocou de frente ao passado e ao futuro. Remete ao passado quando era um cidadão comum, que esperava na fila com os demais e votava sem imaginar que viria se tornar o 46º presidente dos EUA. Projeta o futuro porque em menos de três meses terá a sua aposentadoria, uma vida dedicada a família, longe dos telejornais e da opinião pública, muito parecido com a vida de tantos outros senhores que aguardavam com ele na fila de votação hoje. Seja qual for o resultado no próximo dia 05 de novembro, certamente, Joe Biden e a América não se esquecerão desse dia tão pacato de votação, quando um presidente quase aposentado viu seu passado e seu futuro em uma cédula eleitoral.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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