A guerra que se desenrola no Oriente Médio há quase um ano e meio passou por muitas etapas de negociação infrutíferas. Dezenas de encontros entre os mediadores norte-americanos, cataris e egípcios com a presença de oficiais de Israel e lideranças terroristas do Hamas não chegaram muito longe, sendo uma constante frustração para as famílias dos reféns, uma crescente preocupação para os civis em Gaza e uma imensa pressão para os beligerantes por parte de agências humanitárias internacionais. Com a iminente saída de Joe Biden da presidência dos Estados Unidos, os norte-americanos desejam selar o acordo e colher um trunfo diplomático nessa parte do mundo onde estão tão descredibilizados.
Desde o ataque terrorista em outubro de 2023, foram 250 reféns levados para a Faixa de Gaza, dos quais 157 foram recuperados por Israel, mas apenas 117 com vida. Dos 94 reféns ainda sob a custódia do Hamas, os órgãos de inteligência israelenses acreditam que 34 estejam mortos, o que reduz a 60 o número de sequestrados com vida, e que ainda podem retornar para casa após um acordo. Durante esses 15 meses de guerra, foram vários os protestos realizados nas ruas de Telavive e Jerusalém exigindo o retorno dos reféns e demandando maior apoio do premiê Benjamin Netanyahu para um acordo que os libertassem. O custo político para o Likud, partido do primeiro-ministro, e para o próprio Netanyahu tem sido muito grande, mas ambos parecem se preocupar com outros objetivos por hora.
Os mediadores cataris anunciaram hoje que o rascunho final de um acordo de cessar-fogo negociado por semanas estaria muito próximo de ser assinado. O presidente Biden disse que “o acordo foi estruturado para libertar os reféns, paralisar as hostilidades, promover segurança a Israel e nos permitir aumentar significativamente a assistência humanitária para os palestinos, que sofreram terrivelmente nessa guerra iniciada pelo Hamas”.
As falas de Biden e detalhes revelados pelo Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan ressaltam que o acordo passaria por duas etapas iniciais. A primeira fase envolveria a libertação de 33 reféns de uma lista já previamente discutida pelos beligerantes, a retirada de tropas israelenses de algumas partes do enclave palestino, permitindo a volta da população de Gaza para o norte do território. Nos moldes desse acordo, os israelenses ainda teriam presença nas fronteiras externas da Faixa de Gaza, principalmente o chamado corredor Filadélfia, na fronteira com o Egito. Após 16 dias, a segunda fase seria implementada com o objetivo de finalizar de maneira definitiva a guerra.
As palavras de Joe Biden e a concordância israelense momentânea são encorajadoras para muitos que clamam pela paz, contudo, os objetivos militares e estratégicos de Israel estão incompletos e caso não sejam alcançados em sua plenitude podem colocar em descrédito a conduta do mais forte exército do Oriente Médio.
Desde o primeiro dia, Benjamin Netanyahu deixou claro que destruir o Hamas em todas as suas capacidades político, administrativas e militares dentro da Faixa de Gaza é a principal meta a ser alcançada. Assinar um cessar-fogo aparentemente tão leniente com o Hamas, poderia significar o fortalecimento do grupo no futuro e o recrudescimento do conflito em outro momento, apenas postergando o sofrimento para palestinos e israelenses.
A chegada de Donald Trump a Washington DC na próxima semana, pode trazer uma série de novas variáveis para essa equação ainda não resolvida no Levante, reacendendo o conflito de forma ainda mais imprevisível. Conhecendo o passado político de Netanyahu e sua amizade de longa data com o futuro presidente norte-americano, fica evidente que o acordo proposto agora, pode ser apenas uma estratégia para ganhar mais tempo e moral, até que o seu aliado mais importante retorne ao status quo.