O leitor do CORREIO conhece bem Paulo Sales, 52 anos. De 2000 a 2007, ele foi repórter de cultura do jornal. Mas, se você não acompanhou os textos dele naquela época, tem acompanhado as crônicas que ele tem escrito aqui no jornal às segundas-feiras, desde 2019. Agora, Paulo se prepara para publicar o livro Pegadas no Solo do Tempo, uma seleção desses textos que será lançada no próximo dia 2.
Amante das artes, ele diz que elas são um elemento importante para ajudá-lo a entender o que é o ser humano. E é isso que notamos em seus textos, segundo ele mesmo:
“Nas crônicas, tento captar a essência do ser humano, busco algo que vá além da rotina. Afinal, nossa vida é tão medíocre, tão dura… mas, ainda assim, pode produzir beleza e questionamentos”, revela o cronista, que, hoje, dedica-se profissionalmente à publicidade.
O livro é dividido em duas partes, com títulos aproveitados de duas crônicas: a primeira se chama Contra a Barbárie, a Beleza. E a segunda, A Persistência da Memória. “A primeira é mais voltada para a criação artística e a cultura, no sentido mais amplo. Já a segunda é mais confessional. Nela, me exponho muito, mas esse é meu jeito de escrever. A primeira é mais reflexiva no sentido coletivo; a segunda, mais individual”, revela Paulo.
Às vezes, o cronista se expõe tanto que, recentemente, um leitor lhe escreveu dizendo que isso devia ser efeito de muitos anos de divã. “Mas nunca fiz terapia”, observa Paulo, com bom-humor.
Ao selecionar os textos que iriam para o livro, Paulo ficou atento à “permanência” das crônicas. “As mais datadas falam de coisas pontuais, episódicas e preferi tirar”, diz o autor.
Arquitetura da destruição
Por isso, ficaram de fora os textos mais “ferinos” contra o atual governo federal. Não que seja uma autocensura, claro, mas, como tratam muitas vezes de assuntos relacionados ao noticiário, corria risco de os textos soarem envelhecidos.
“Às vezes, as críticas que fiz ao governo também são feitas por outras pessoas, então ficam meio ‘datadas’. Além disso, a ideia é que o livro vá além da crônica diária”.
Para o escritor, os últimos quatro anos poderiam ser definidos como a “arquitetura da destruição”: “O que a gente vive hoje é muito parecido com o que aconteceu nos anos 1930, quando a gente via o ‘ovo da serpente’ ser gerado e ninguém fazia nada. Mas essa não é uma exclusividade do Brasil. Veja o que está acontecendo na Hungria. Isso está atingindo níveis perigosos e não sabemos onde vai parar”, alerta Paulo, em tom de preocupação.
Mas, mesmo em tempos da tão falada “polarização”, Paulo consegue sair ileso e não coleciona “haters”. “As pessoas com quem me relaciono, mesmo na internet, pensam mais ou menos como eu, então acaba havendo uma reação de apoio ao que escrevo”, diz. Longe de ser um polemista, não escreve para ganhar cliques: “Meu objetivo é colocar fagulhas de dúvidas no leitor”.
As fontes de inspiração para os textos variam, segundo o autor. Vai desde filmes a que assistiu até livros que leu ou a pequenos acontecimentos da própria rotina. “Às vezes, a inspiração vem de alguma matéria interessante que li. A crônica desta semana [publicada dia 23 no CORREIO] nasceu de um fragmento de uma carta de uma leitora para o jornal El País”, exemplifica.
Para Paulo, a crônica é um gênero literário marcado por dar permanência àquilo que é efêmero. “Fatos fugazes e prosaicos podem gerar textos que podem ser eternizados e isso é o mais legal da crônica. Hoje, você pode ler Rubem Braga [um dos maiores cronistas do país, morto em 1990] e ele continua muito atual”, defende o autor.
Além de Rubem Braga, Paulo cita Ruy Castro como um de seus cronistas favoritos, além de Sergio Augusto. Paulo Mendes Campos também tem sua admiração e até já inspirou um texto dele: “Paulo Mendes Campos escreveu um texto chamado O Amor Acaba. Mas eu fiz um chamado O Amor Começa. A dele era baixo-astral e a minha, era mais ‘pra cima'”, defende.
Mas, para Paulo, Luis Fernando Veríssimo está um patamar acima dos outros cronistas: “É o meu ídolo, gostaria de saber escrever como ele, com a leveza e o humor que marcam o estilo dele. Um gênio”.
SERVIÇO
Livro: Pegadas no Solo do Tempo
Autor: Paulo Sales
Editora: Penalux
Preço: R$ 44
Lançamento: Quinta-feira, 2/06, a partir das 19h30, no espaço cultural Oito Imagem (Rua Dinah Silveira de Queirós, nº 6, Condomínio Quinta do Candeal – Horto Florestal)