Foto: Fábio Pozzebom/Arquivo/Agência Brasil
O presidente Lula 04 de abril de 2024 | 11:33
Servidores públicos federais intensificaram a pressão sobre o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e iniciaram um movimento grevista, numa escalada das mobilizações por reajustes salariais que já vinha ocorrendo nos últimos meses.
Funcionários dos institutos federais cruzaram os braços nesta quarta-feira (3) e prometem paralisar até mesmo programas sociais executados pelas instituições. Professores do ensino superior, por sua vez, aprovaram indicativo de greve a partir de 15 de abril. Técnicos das universidades param antes, em 11 de abril.
Outras carreiras fazem paralisações pontuais, atuam em “operação-padrão” (rotina de maior burocracia, com impacto negativo no tempo dos serviços) ou promovem ações de mobilização. A lista inclui servidores do Banco Central, do Tesouro Nacional, da Receita Federal, da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), analistas de comércio exterior e membros de carreiras ambientais (como ICMBio e Ibama).
Diante do acirramento, o governo sinalizou aos sindicatos a retomada da mesa nacional de negociação, paralisada desde 28 de fevereiro. Uma nova reunião deve ocorrer na semana que vem.
O Ministério da Gestão e Inovação conta com a liberação de um crédito extra de até R$ 15 bilhões a partir de 22 de maio para conseguir aplacar as demandas do funcionalismo. Por isso, as conversas tinham esfriado, e havia uma expectativa de retomá-las entre o fim de maio e o início de junho.
Interlocutores do governo, no entanto, reconhecem que a temperatura subiu com o movimento grevista na educação. Há o temor de que isso puxe a fila das demais categorias, criando um problema não só fiscal, mas político.
O Fonasefe (Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais) convocou para 17 de abril uma marcha nacional em Brasília.
Outro fator deve manter o MGI sob pressão na primeira quinzena de abril. As entidades cobram o aumento de cerca de 51% nos auxílios de alimentação, saúde e creche prometido pelo governo em sua proposta original.
A intenção do Executivo era usar o R$ 1,5 bilhão já reservado no Orçamento para turbinar esses benefícios a partir de maio, mas as categorias recusaram porque entenderam que teriam de abrir mão de um reajuste ainda em 2024.
Com a proximidade de maio, porém, as categorias passaram a cobrar a atualização dos valores, uma vez que o dinheiro já está no Orçamento. O auxílio-alimentação no Executivo passaria de R$ 658 para R$ 1.000, próximo a valores praticados no Legislativo e no Judiciário, que pagam R$ 1.393 (quase um salário mínimo, hoje em R$ 1.412).
O Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado) enviou na segunda-feira (1º) um ofício ao MGI pedindo “providências para implementação imediata do reajuste de benefícios”. O Fonasefe apresentou documento com teor semelhante.
A questão dos reajustes é mais complexa. Para conceder algum percentual, o governo depende do crédito extra, que será liberado caso a projeção de arrecadação para 2024 seja favorável.
As categorias, no entanto, temem que não sobre dinheiro para negociar com o funcionalismo diante da lista de contas “penduradas” nesse crédito.
O Congresso Nacional cobra a recomposição de R$ 5,6 bilhões em emendas parlamentares que foram vetadas por Lula. Já o Executivo espera usar parte da verba para reverter o bloqueio de R$ 2,9 bilhões sobre despesas de custeio e investimentos.
“O governo precisa colocar dinheiro para a reestruturação das carreiras de educação e docentes. Queremos disputar o dinheiro que está na mão do governo neste momento e o dinheiro que estará na LOA [Lei Orçamentária Anual] de 2025”, afirmou David Lobão, coordenador-geral do Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica).
No ano passado, o governo firmou acordos com carreiras da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal para a concessão de reajustes e reestruturação da carreira, além de ter iniciado a regulamentação do bônus para auditores da Receita Federal.
Os atos inflamaram as demais categorias, que se sentiram preteridas. Há também incômodo porque alguns dos integrantes dessas carreiras eram da base de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que manteve uma política salarial mais restritiva.
“O governo está seletivamente dando prioridade para o andar de cima. É como diz aquela música, o de cima sobe e o de baixo desce”, criticou Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Condsef (Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal) e representante do Fonasef.
“Muitas categorias já negociaram, então deve sair nos próximos dias uma MP [medida provisória] concedendo reajuste para esse pessoal. À medida que vai ocorrendo destravamento da pauta para algumas categorias, as outras ficam ansiosas porque sua situação não está resolvida”, afirmou Rudinei Marques, presidente do Fonacate.
Lobão, do Sinasefe, resgatou uma declaração do ministro Fernando Haddad (Fazenda) de fevereiro de 2023, quando ele disse que o governo iria “tirar a granada do bolso” dos servidores. Era uma alusão ao que disse o ex-ministro da Economia Paulo Guedes em 2020, ao celebrar uma lei que congelaria os salários do funcionalismo por dois anos.
“Apostamos muito na mesa de negociação. Na construção da LOA de 2024, fomos chamados às vésperas da entrega e soubemos que teria zero para aumento. Caiu o mundo na nossa cabeça. Haddad firmou compromisso de tirar a granada do nosso bolso, foi uma decepção muito grande”, disse.
O MGI diz já ter assinado dez acordos específicos e que há oito negociações em andamento, inclusive com servidores de Ibama e ICMBio e com a área de educação.
“Especificamente para a carreira educacional, os Ministérios da Gestão e da Educação criaram um grupo de trabalho para tratar da reestruturação. O relatório final, entregue no dia 27 de março à ministra Esther Dweck, servirá como insumo para a proposta do governo de reestruturação da carreira, que será apresentada aos servidores na mesa específica de negociação”, diz a pasta.
No primeiro dia de greve nos institutos federais, mais de 320 dos 648 campi aderiram à paralisação, segundo o Sinasefe. Isso teria potencial para abarcar metade dos cerca de 72 mil servidores.
A ordem é para manter apenas atividades essenciais, como pagamento de bolsas e auxílios a estudantes carentes, e suspender atendimentos administrativos (como os relacionados a matrículas) e programas sociais, como o Mulheres Mil, focado na inclusão educacional, social e produtiva de mulheres em situação de vulnerabilidade.
Segundo Lobão, a mensagem para o governo é “seu programa social vai parar se não atender a gente”.
Idiana Tomazelli/Folhapress