InícioEditorialEconomiaBaianos trocam bares de rua pelos dos shoppings em busca de segurança

Baianos trocam bares de rua pelos dos shoppings em busca de segurança

O clima de insegurança cada vez mais intenso nas ruas de Salvador tem feito com que muita gente mude seus hábitos de consumo. Antigos clientes assíduos em bares e restaurantes estão preferindo fazer refeições em casa com a família ou juntar os amigos para o happy hour nos shoppings centers da capital, em vez de ficarem expostos nos estabelecimentos de rua. Os reflexos na mudança de comportamento já são percebidos no aumento de faturamento e na contratação de novos funcionários pelos centros comerciais. 

Apesar dos meses de abril e maio não terem registrado mais movimentação nos shoppings centers por conta dos feriados, a rede Five Sport Bar foi surpreendida positivamente com os resultados ao fechar as contas no último mês. Os restaurantes chegaram a ter incremento de 15% no faturamento em abril, segundo a diretora de marketing Lara Morel. 

“Nosso faturamento aumentou e temos mais pessoas movimentando a casa. Um dos fatores que a gente acredita que possa explicar isso é a onda de criminalidade que está acontecendo nos bares e restaurantes de rua e levando mais as pessoas a procurarem um lugar mais seguro e controlado”, explica a diretora.

Segurança privada interna e externa, além de estacionamento próprio são fatores que trazem a sensação de mais segurança para os clientes. “As pessoas não se expõem para parar o carro na rua à noite e nos shoppings têm menos vulnerabilidade de acesso do que nas calçadas”, acrescenta Lara Morel. Tanto a movimentação de famílias como de jovens aumentaram nos estabelecimentos da rede nos últimos meses. 

No restaurante Ferreiro Café, localizado no Salvador Shopping, o aumento de clientes fez com que o restaurante contratasse pelo menos outros quatro funcionários em abril. O maître Raimundo Moraes conta que são comuns relatos de clientes que reclamam da insegurança das ruas. “Estão falando que o shopping ainda é um dos únicos lugares em que eles se sentem seguros. Muitos estão assustados com a violência e estão evitando sair com famílias e idoso”. 

Jeferson aproveitou o fim do expediente para tomar uma cerveja no shopping onde trabalha

(Foto: Paula Fróes/CORREIO)

Clientes
O promotor de merchandising Jeferson Cruz, 37, mora na Cidade Nova e diz que não se sente seguro para encontrar os amigos em bares da região onde vive. Nesta terça-feira (16), ele aproveitou o fim do expediente no Shopping Bela Vista para tomar uma cerveja com uma colega. “Aqui dentro tem mais segurança, é um lugar privado. Lá fora dependemos da segurança pública e nem sempre ela está disponível para atender a gente, ficam mais nos bairros nobres”, afirma. 

Ainda que lamente o cenário da violência na cidade, Ticiano Cortizo, diretor de marketing do Bela Vista, revela que houve um aumento no faturamento do shopping nos últimos meses. As pessoas não estão procurando mais somente restaurantes e lanchonetes, mas também a oferta de serviços, como clínicas e lazer. 

“Temos percebido um aumento no fluxo de pessoas e faturamento. Mas é uma hipótese que isso esteja acontecendo por conta da segurança pública, já que os shoppings centers transmitem segurança”, afirma. 

A Associação Brasileira de Shoppings Centers (Abrasce) registrou um acréscimo de 10% a 15% no público que frequenta os estabelecimentos em  relação a abril do ano passado. A Abrasce, no entanto, não tem informações que expliquem se a violência urbana é o principal fator. 

“Realmente está ocorrendo um aumento do público e atribuímos este fato à liberação do uso obrigatório de máscara e a redução dos caso de covid-19, o que está levando as pessoas a saírem mais de casa. O shopping é o lugar mais indicado pela segurança que oferece”, explica Edson Piaggio, coordenador regional da Abrasce na Bahia. 

Sensação de medo
A personal trainer Josi Torres, 42, é natural de Salvador, mas há dois anos vive em João Pessoa (PB). Ela conta que antes de se mudar para o outro estado costumava frequentar muitos bares perto de onde morava, no Parque Júlio César, Pituba. Agora, há uma semana na cidade, Josi diz que não se sente segura em ir aos locais que faziam parte da sua rotina antigamente. 

Relatos de colegas e notícias na imprensa fazem com que ela prefira ir aos shoppings e fazer programações em casa com as amigas. “Eu cheguei em Salvador e senti a diferença de estar andando na rua com medo, o que antes eu não tinha. Sempre saía à noite e frequentava barzinhos. Dessa vez só saí quatro vezes em uma semana porque estou com medo de ir para bares, pegar condução ou simplesmente estar parada e ser assaltada”. 

Jaqueline Benevides, 45, moradora da Boca do Rio, também evita sair de casa por conta da onda de criminalidade. Na tarde de ontem, ela abriu uma exceção e foi até o Shopping Salvador com uma vizinha e a neta. Mesmo assim, a sensação de insegurança persiste. 

“Quando a gente sai de casa não sabemos mais se vamos voltar. Não temos mais a segurança de estar com o celular na mão ou sair de bolsa, temos que sair com o mínimo possível. Mesmo com o policiamento, os marginais estão liderando a cidade”, afirma a dona de casa.

Jaqueline foi até o shopping com uma vizinha, mas desabafa que não se sente segura em lugar algum

(Foto: Paula Fróes/CORREIO)

Casos de arrastões

Pelo menos nos últimos dois meses, bairros como Pituba e Itaigara têm sido o alvo principal de criminosos que assaltam os clientes e os bares e restaurantes. No final de abril, a Polícia Militar reforçou o patrulhamento na Pituba depois que três restaurantes sofreram arrastões em uma mesma noite. Na sexta-feira 29 de abril, os crimes ocorreram na hamburgueria Red Burguer, no Cremonini Restaurante e na loja de vinhos Decanter. 

Em nota, a Polícia Militar informou que atua preventivamente por meio de rondas e abordagens em vias públicas e que cada localidade de Salvador é atendida por, pelo menos, uma unidade responsável pelo policiamento. A PM lembra que dispõe de operações específicas que atuam em corredores comerciais e de serviços, como a Força Atlântica, lançada em abril. 

Para tentar coibir os crimes, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) lançou o projeto Câmera Interativa. A iniciativa permite o uso de imagens cedidas pela sociedade civil para auxiliar no combate à criminalidade. Fazem parte da rede câmeras residenciais, do comércio e de entidades privadas destinadas à captação de imagens públicas. 

Questionada sobre os desdobramentos dos arrastões em três estabelecimentos em uma mesma noite na Pituba, a Polícia Civil informou que não divulga informações sobre o caso para não atrapalhar as investigações. Enquanto isso, os shoppings funcionam como refúgio para aqueles que sentem medo de circular na própria cidade. 

“É muito mais difícil alguém vir cometer crime no shopping porque temos segurança a cada esquina, literalmente a cada quatro ou cinco lojas tem um segurança. Então, os clientes aqui se sentem muito mais protegidos”, diz Ayna Fausto, empresária à frente do Outback do Shopping da Bahia.

*Com a orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo.

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