InícioEditorialPMs participam de reconstituição das mortes de três jovens negros na Gamboa 

PMs participam de reconstituição das mortes de três jovens negros na Gamboa 

Teve início por volta das 19h desta segunda-feira (31) na Gamboa de Baixo a reconstituição das mortes dos três jovens negros baleados numa suposta troca de tiros com policiais militares na comunidade, ocorridas em março deste ano. Os quatro PMs envolvidos no episódio participam da simulação dos fatos, solicitada pelo Ministério Público do Estado (MP-BA). 

A reconstituição é realizada dois dias após o CORREIO divulgar com exclusividade que o comando da Polícia Militar optou por não instaurar o Processo Administrativo Disciplinar (PAD), alegando não ter indícios para a continuidade da investigação. A decisão do comandante-geral da PM, coronel Paulo Coutinho, contraria a recomendação do corregedor-geral da Secretaria de Segurança Pública, Nelson Gaspar, que pontou evidências para a abertura do procedimento, tais como:  as armas encontradas com os jovens estavam com defeito e pelo menos uma das mortes tem características de uma execução.

A simulação dos fatos foi solicitada pela promotora Aline Cotrim, do Controle Externo da Atividade Policial (GASEC) do Ministério Público.  Em nota enviada ao CORREIO na última sexta-feira, após questionamento sobre a não abertura do PAD pelo comando da PM, o MP-BA respondeu que “a investigação do MP apura eventual responsabilidade criminal dos PMs e está em fase de conclusão”. A reconstituição será realizada em duas etapas. A primeira começou às 19h de hoje, com a participação dos quatros soldados que alegaram que os três jovens reagiram a abordagem a tiros.  

Morreram: Alexandre Santos dos Reis, 20, Patrick Sousa Sapucaia, 16, e Cleverson Guimarães Cruz, 22. Os três foram baleados na madrugada do dia 1 de março, na Gamboa de Baixo. De acordo com a versão dos policiais que consta no documento da Corregedoria-Geral, enquanto realizavam um patrulhamento na Avenida Lafayete Coutinho [Avenida Contorno], um motociclista [não identificado na apuração] teria lhes dito que havia vários homens armados na avenida e esse teria sido o motivo da ação policial. Ainda segundo os PMs, teria ocorrido um confronto e os supostos criminosos teriam fugido para a Gamboa, entrando em um imóvel onde aconteceram as mortes dos três rapazes. 

A segunda etapa da reconstituição será realizada nesta terça-feira, também às 19h, desta vez com a versão dos moradores, que negam o confronto, inclusive relataram que as vítimas foram surpreendidas pelos policiais quando voltavam de uma festa e em seguida levadas para o imóvel, onde teriam sido executadas. 

O procedimento será acompanhado pela Coordenação Especializada de Direitos Humanos da Defensoria Pública e pelo coordenador do IDEAS (Assessoria Popular) e integrante da Rede Justiça Criminal e da Coalizão Negra Por Direitos, Wagner Moreira. 

Entidades

Entidades ligadas aos direitos humanos comentaram a importância da reconstituição das mortes na Gamboa, como a Rede de Justiça Criminal, que disse que o Brasil é recordista em letalidade policial e o oitavo país mais violento do mundo. ” A ausência de uma política criminal de longo prazo pautada em direitos humanos, aliada ao persistente racismo e hierarquização de nossa sociedade fazem com que o Estado brasileiro e suas polícias sejam os grandes patrocinadores de uma política de estado genocida, cujos principais alvos de extermínio são jovens negros e periféricos. Os números alarmantes de mortes decorrentes de confrontos com a polícia escancaram a necessidade de cobrar que o Ministério Público cumpra com seu dever constitucional de controle externo e mecanismos democráticos, participativos e efetivos de vigilância da atividade policial”, declarou a secretária-executiva Rede Justiça Criminal, Janine Carvalho.

A Polícia Militar da Bahia tem acumulado corpos negros que tombaram em decorrência da alta letalidade de sua atuação em bairros periféricos. O Odara acompanha casos em que sequer o inquérito foi concluído e nenhuma instituição fiscaliza de modo sistemático. Há um imperativo de que o Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP acompanhe com maior atenção a atuação dos Ministérios Públicos estaduais no controle externo da atividade policial.
Gabriela Ramos, defensora de direitos humanos, ativista do Odara Instituto da Mulher Negra

O Fórum Popular de Segurança Pública do Nordeste também repercutiu o assunto.  “Nós, sociedade civil, não deixaremos que nossos jovens sejam dizimados pela polícia sem exigir responsabilização e agilidade na apuração das circunstâncias. A polícia da Bahia é das polícias que mais mata no nordeste, e acreditamos que o esclarecimentos dos fatos e devida aplicação da lei para os responsáveis, deve contribuir para cessar essa prática que se perpetua em grande medida pela omissão dos órgãos responsáveis e a certeza da impunidade” pontuou a articuladora do Fórum Popular de Segurança Pública do Nordeste, Edna Jatobá, que também é coordenadora-executiva da Ong GAJOP (Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares). 

Por fim, a Anistia Internacional Brasil falou que há um padrão explícito de assassinatos de jovens negros e pobres em todo país pelas armas das polícias. “É  preciso enxergar e enfrentar o racismo. Entender as causas por trás dos desvios das polícias e atuar para corrigir. A sociedade civil precisa se unir para cobrar do Ministério Público e dos gestores públicos o fim da brutalidade policial”, disse a diretora-executiva Anistia Internacional Brasil, Jurema Werneck. 

O controle rígido sobre os órgãos de Estado que detêm o monopólio da força é a contrapartida estabelecida pelo Estado Democrático de Direito, para assegurar o funcionamento adequado dessas instituições e seu respeito aos direitos e garantias fundamentais. É também a forma de evitar que o monopólio estatal seja capturado por interesses privados de grupos criminosos e milícias. Portanto, as formas de controle da atividade policial  (disciplinar, judicial e externo-social) são pilares essenciais para o Estado de Direito e devem ensejar apurações e prestações de contas rigorosas sobre o uso da força, especialmente, quando há perda de vidas e denúncias da sociedade civil sobre atos abusivos.
Gabriel Sampaio, coordenador do programa de Enfrentamento à Violência Institucional e de Litígio estratégico

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