O ministro José Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), baseou-se numa perícia contratada pela defesa do presidente Lula ao decidir pela anulação das provas do acordo de leniência da Odebrecht. O perito Cláudio Wagner, indicado pelos advogados do petista, sustentou que a Lava Jato cometeu diversas falhas ao colher evidências dos crimes da empreiteira e comparou a situação a uma investigação de estupro que usa como prova um material genético coletado pelo próprio estuprador, sem a presença de autoridades.
O documento foi concluído em 2019. No último dia 6, Toffoli acatou um pedido da defesa de Lula e anulou provas do acordo de leniência da Odebrecht firmado pelo Ministério Público Federal (MPF).
O perito indicado pela defesa de Lula apontou irregularidades na obtenção de provas de dois sistemas usados pela Odebrecht, Drousys e My Web Day B. Essas tecnologias funcionavam no Departamento de Operações Estruturadas, que, segundo a Lava Jato descobriu e a própria Odebrecht admitiu, funcionava como um “departamento da propina“.
Na decisão deste mês, Toffoli tornou nulas todas as provas obtidas nesses dois sistemas, que considerou “imprestáveis”.
Em suma, o perito apontou uma quebra na “cadeia de custódia da prova”, ou seja, disse não ser possível verificar que as provas são fidedignas e garantem um julgamento justo. Em um homicídio, por exemplo, é preciso garantir que o local do crime não seja alterado antes da chegada das autoridades, para manter a cadeia de custódia.
“É como se em um crime de estupro o próprio criminoso estuprador efetuasse a coleta — em sua residência e sem a vigilância das autoridades — do material necessário ao exame pericial de DNA e, posteriormente, entregasse esse material às autoridades policiais. De posse desse material, as autoridades policiais encaminhariam o mesmo para análise dos peritos criminais federais, como se material autêntico e íntegro do criminoso fosse!”, escreveu o perito indicado pela defesa de Lula.
Wagner apontou diferentes razões para o argumento: o material recebido pelo MPF foi preparado e enviado pela própria Odebrecht, sem a presença de nenhum agente público; a Odebrecht ficou com o material por nove meses antes de entregá-lo; e nesse período, os arquivos foram “trabalhados” por diversas pessoas contratadas pela empresa.
Segundo procuradores que atuaram na Lava Jato, contudo, a tese da defesa de Lula não se sustenta. Um integrante da força-tarefa afirmou em reserva que todos os procedimentos legais foram seguidos, e que as provas apresentadas pela Odebrecht no acordo foram checadas e confirmadas com os dados compartilhados depois pelas autoridades suíças.
Esse procurador ressaltou que dois anos antes de aceitar fazer um acordo com o MPF, a Odebrecht negava qualquer acusação e enfrentava o órgão na Justiça.