InícioEntretenimentoCelebridadeAbaixo a sensibilidade, acima o PIB!

Abaixo a sensibilidade, acima o PIB!

Em 2020, a área da cultura foi a primeira a parar, com a pandemia. Área que vinha sendo atacada, perdendo seu ministério no ano anterior, e com parte considerável de seu orçamento definhando nos últimos anos.

Tudo isso, aos olhos cúmplices dos conservadores, da extrema direita, e de setores evangélicos que resolveram travar uma cruzada contra os “pervertidos mamadores do erário”. Setor, que na cabeça dessa gente, além de não contribuir em nada, ainda dilapida os cofres públicos com uma verba que poderia estar sendo usada para algo que desenvolvesse o país. Pior, uma área que, segundo eles, estimula drogas, pedofilia, que quer destruir a família, Deus, a propriedade e a família.

Essa gente poderia ser a escumalha fascista da década de 20, na Itália, de 30 na Alemanha, de 40 e 50 nos EUA, ou de 60, aqui mesmo. No século passado. Mas existe uma máxima, que se não existe eu inventei agora, que se a gente não aprende com a história, nos tornamos vítimas dela.

O ambiente persecutório e censor que foi criado, e bem retratado no filme “Quem tem medo” (2022), de Dellani Lima, Henrique Zanoni e Ricardo Alves Jr, criou as bases para que parte da sociedade usasse as artes como bode expiatório da decadência dos valores cristãos e da família.

Acontece, inclusive, um fenômeno muito triste, com essa gente. Ela não gosta de Arte e Cultura. É o tipo de gente que se fossem fechados todos os teatros e museus e transformados em igrejas, ou centros comerciais, ficaria mais feliz. Veria sinais de progresso, em nome de Deus, da família, e do desenvolvimento econômico do país. Para que termos teatros e museus, se podemos ter, por exemplo, a indústria automobilística para alavancar a economia, emprego, renda e aumento do PIB?

A má notícia que tenho pra essa gente é que o Observatório Itaú Cultural divulgou uma pesquisa com números preocupantes. Primeiro, que o PIB da cultura foi maior que o da indústria automobilística. Sim, meus caros, a cultura foi melhor para a economia que a venda de automóveis em 2020, justo num ano tão ruim para as artes e a cultura. Segundo, que a indústria cultural emprega 7% dos trabalhadores brasileiros.

Levando em consideração a pandemia, a queda drástica de investimento em cultura e o  desmoronamento de políticas públicas, chega-se fácil à conclusão de que, aquecido, com investimento público e políticas efetivas, podemos ter no setor cultural um dos principais alavancadores de nossa economia, da geração de emprego e renda para o país.

Voltemos rapidamente à questão do gosto pela Arte. Algumas das obras mais incríveis da humanidade foram de cunho religioso. Sempre tentou-se associar o estético ao religioso, como maneira de encantar, alumbrar a pessoa frente à grandiosidade de Deus. Seja “A paixão segundo São Mateus”, de Bach, a Capela Sistina, de Michelangelo, ou “O auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna, a associação entre o religioso e grandes obras da humanidade foi algo notável.

Basta ver que, mesmo um ateu convicto, ao levar alguém para passear em sua cidade, prontamente leva a pessoa à principal igreja como um dos pontos turísticos esteticamente importantes de sua terra. Museus de arte sacra são visitas quase obrigatórias em diversos países, e, seja no museu de arte pré-colombiana de Santiago, no Chile, ou no Museu Afro Brasileiro da UFBA, os motivos religiosos são a base do acervo, por vezes deslumbrante.

Pois é. Ninguém se imagina fazendo um tour artístico e arquitetônico pela Catedral da Fé, no Iguatemi, Salvador, ou pelo templo de Salomão, no Brás, em São Paulo. Tampouco deve existir algum único ser humano no mundo que ouça música gospel sendo ateu, judeu ou budista.

As referências autocentradas e sem preocupações estéticas mais artísticas e poéticas acabam por não deixar um legado criativo e cultural, e acabam por deixar limítrofe a apreciação estética dos seus. Respeito. Que haja um projeto de repressão estética, de mediocridade artística, não cabe a mim condenar; as pessoas aceitam porque acatam.

O mesmo serve aos conservadores e reacionários que, no Brasil, passam ao largo do que podemos ver geralmente noutros países. Aquele conservador cuja leitura e audição dos clássicos é de um apuro invejável, aquele conservador que admira obras de artes tradicionais e religiosas, sem engajamento e questões políticas envolvidas, sem a transgressão experimental e a provocação vanguardista, é personagem raro, por aqui. A maioria só faz condenar a parte que considera ruim, sem apreciar sequer alguma arte, literatura e arquitetura que sirva de contraponto.

Eis a questão. Eis o conflito. Bem incentivado, bem estruturado e bem organizado, o setor cultural pode ser um dos setores a gerar mais empregos, mais renda, elevar o PIB do país, fazendo-o crescer, com um adendo importante: ninguém viaja para outro país para visitar fábrica de automóveis. Ninguém vai passar férias nalguma cidade para consumir um carro zero. Mas nas cidades onde a cultura pulsa, além de toda importância econômica que gera para o país, comprovada por números, a cultura atrai turistas. Temos um setor que internamente, como diversos outros, contribui de forma sólida para nossa economia, mas traz ainda como cereja do bolo seu potencial turístico.

Não faço juízo de valor quanto ao gosto de ninguém. Vocês podem não querer apreciar as maravilhas que a arte brasileira produz, reconhecidas mundialmente, e referência em qualquer lugar que chegamos. Você pode até condenar a maneira como artistas se comportam, pensam, transgridem.

Mas torcer contra um setor que emprega 7% da mão de obra do país e cresce mais que a indústria automobilística?

Imaginem quantas não seriam as benesses com um devido impulsionamento do setor?

Esqueçam essa coisa de subjetividade, espírito crítico, êxtase estético. Pensemos apenas no lucro.

Abaixo então a sensibilidade, e acima o PIB!

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