São Paulo — O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou neste sábado (6/4), em palestra nos Estados Unidos, que o Brasil viveu um período de “populismo autoritário”, nos anos de governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e que chegou “muito perto do impensável”.
Em palestra na Brazil Conference, evento realizado na Universidade de Harvard, em Cambridge (EUA), o ministro do STF também criticou as Forças Armadas por tentarem “desacreditar” o sistema eleitoral brasileiro e afirmou que as instituições brasileiras ficaram “por um triz”.
O tema da palestra era “Populismo Autoritário, Resiliência Democrática e as Supremas Cortes”. Um debate com o professor de Harvard Steven Levitsky, autor do livro Como as Democracias Morrem, marcou o fim do evento.
Sem citar o nome de Bolsonaro, mas em referência clara ao período de governo do ex-presidente, Barroso afirmou que o Brasil passou por um processo de “erosão democrática, tijolo a tijolo”.
“Não é um golpe, é um esvaziamento progressivo. Começou com o esvaziamento da participação da sociedade civil nos órgãos de formulação de políticas públicas e ambientais e de crianças e diversas outras”, disse Barroso.
“Depois, no Brasil, estou descrevendo fatos, e não emitindo opinião, houve um desmonte dos órgãos de proteção ambiental, de proteção às comunidades indígenas e não demarcação de um milímetro sequer de terras indígenas, como determina a Constituição, um negacionismo pleno da ciência durante a pandemia”, afirmou o ministro.
O presidente do STF ressaltou ainda que, apesar de ter 2,7% da população mundial, o Brasil teve 10,2% das mortes na pandemia. “Esse foi o tamanho da má gestão da pandemia no Brasil”, frisou.
O ministro afirmou que, assim como em outros países, a Suprema Corte foi atacada por um movimento de “populismo autoritário”.
“O populismo autoritário precisa ter inimigos. E na maior parte dos casos, embora não nos EUA, por razões relativamente óbvias, um dos inimigos eleitos pelo populismo autoritário são as Supremas Cortes, os tribunais constitucionais. Foi o que aconteceu na Hungria, na Polônia, Turquia, Rússia, Venezuela, e foi também o que aconteceu no Brasil.”
Barroso lembrou ainda como o bolsonarismo fez de tudo para emplacar o “voto impresso” e descredibilizar o sistema eleitoral brasileiro. E criticou as Forças Armadas por terem feito parte dessa empreitada. Em referência a elas, disse que “mentem e depois dizem que não fizeram”.
“Como aconteceu no TSE [Tribunal Superior Eleitoral]. Devidamente avisado, eu disse: infelizmente, a representação das Forças vai usar esse assento para tentar desacreditar o sistema. Veio uma nota das Forças Armadas dizendo que nunca haviam sido tão ofendidos. E 48h depois fizeram isso. O Brasil é um país em que as pessoas se ofendem com o que fazem”, disse.
O relato do ministro se refere ao acompanhamento que militares fizeram das eleições de 2022. O ministro tem criticado o levantamento de suspeitas sobre a higidez do sistema eleitoral em meio ao pleito em que Bolsonaro saiu derrotado pelo presidente Lula.
O ministro disse ainda que o país chegou “perto do impensável”. “Foi isso que o Brasil viveu e passou dentro desse contexto histórico, teórico, que eu procurei retratar: um populismo autoritário e como ele impactou o mundo. A verdade é que, felizmente, as instituições venceram no Brasil. Mas, como os fatos têm demonstrado, nós ficamos por um triz, chegamos muito perto do impensável no Brasil”.