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Eleição na Bahia teve desistência, choro, base em parafuso e desencontros

Rui Costa, Jerônimo e Wagner 17 de dezembro de 2023 | 10:29

Jaques Wagner estava decidido quando convocou uma reunião para uma manhã de sábado, em 8 de janeiro de 2022. Governador da Bahia de 2007 a 2014, o senador petista era o nome natural para a sucessão do governador Rui Costa (PT).

Ao chegar à casa do secretário estadual de Relações Institucionais, Luiz Caetano, em Camaçari, o petista imediatamente amassou os papéis na mesa que tratavam de sua pré-campanha e foi direto: “Não sou candidato. Avisem ao partido e ao governador”.

Atônitos, os petistas presentes viram a atitude como um rompante e tentaram demover o senador. Mas Wagner estava irredutível: disse que não retrocederia e chorou junto aos aliados mais próximos. Ainda não era meio-dia quando, para acalmar os ânimos, pediram uma cerveja.

A decisão do senador fazia recomeçar o jogo da sucessão na Bahia, que já vinha embaralhado em meio às tensões com Rui, que queria concorrer ao Senado, e às pretensões de PP e PSD, partidos que com o PT formavam o tripé central da base aliada.

O PT se preparava para aquela que seria sua campanha mais difícil para o Governo da Bahia, contra ACM Neto (União Brasil). Pela primeira vez desde 1990, enfrentaria um membro da família de Antônio Carlos Magalhães (1927-2007), líder que protagonizou a política da Bahia por mais de quatro décadas.

Uma nova candidatura a governador estava fora do radar de Wagner desde 2018, quando foi eleito para o Senado. Na época, acertou com a esposa e os filhos que aquela seria sua última campanha.

Mas o cenário mudou em 2020, quando o PT perdeu a eleição nas maiores cidades da Bahia e viu os aliados PP e PSD saírem fortalecidos das urnas. A avaliação era que só o nome de Wagner seria capaz de manter a base aliada unida e impedir uma guerra interna pela sucessão de Rui.

Assim foi feito. A pré-candidatura de Wagner foi lançada em fevereiro de 2021, nas comemorações do aniversário do PT. O movimento foi certeiro e refreou as articulações de partidos aliados.

Ao longo de 2021, o senador oscilava em relação à candidatura ao governo: ora tinha uma postura mais incisiva e se colocava no jogo, ora mostrava desânimo. Ao mesmo tempo, era pressionado pela família, contrária à ideia de um retorno ao governo.

A decisão de não concorrer, tomada em definitivo em janeiro de 2022, aconteceu em uma época de estranhamentos com Rui. Amigos há mais de quatro décadas, os dois se afastaram em meio a atritos e discordâncias nos últimos anos, mas se mantêm aliados politicamente.

De início, a desistência ficou restrita à cúpula do partido. Mas nas semanas seguintes a notícia se espalhou entre os aliados, que começaram a discutir possíveis alternativas para a sucessão.

A primeira opção foi lançar ao governo o senador Otto Alencar (PSD), aliado do PT na Bahia desde 2010 e considerado leal ao grupo. O movimento agradaria a Lula, que tentava atrair o PSD para uma aliança nacional, e também beneficiaria Rui, que poderia concorrer ao Senado.

Mas no meio do caminho havia o vice-governador João Leão (PP), cujo partido era aliado do então presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele assumiria o governo com a renúncia de Rui e seria o responsável por conduzir a sucessão na Bahia.

Líder político conservador, Leão também aderiu ao governo petista em 2010. Mas sempre teve uma relação cercada de tensão com Otto Alencar, eleito vice-governador pelo PP em 2010 e que três anos depois deixou o partido para fundar o PSD.

Escolhido candidato da base com o aval de Lula, Otto se reuniu com Leão para tratar da sucessão e não saiu satisfeito. Também sofreu fogo amigo de parte do PT, que resistia a abdicar de uma candidatura própria na Bahia. Logo depois do Carnaval, avisou que preferia concorrer ao Senado.

A segunda desistência fez uma parcela da base aliada entrar em parafuso, com ameaças de rompimento de debandadas. A cúpula do PT agiu rápido e definiu três nomes como possíveis candidatos ao governo: o secretário Luiz Caetano, a prefeita de Lauro de Freitas, Moema Gramacho, e o então secretário de Educação, Jerônimo Rodrigues.

Moema era a preferida de Wagner, que dizia a aliados que a candidatura feminina traria um frescor de novidade à chapa. Também era um nome próximo a ele desde o tempo do sindicalismo.

Ela chegou a fazer treinamento com uma consultora de comunicação e testes de vídeo que não agradaram à equipe de marketing. Também havia uma avaliação de que ela enfrentava um desgaste natural de quatro mandatos como prefeita.

Rui, por sua vez, via Luiz Caetano como candidato natural pela relação próxima com prefeitos e líderes políticos do interior. A tese prevaleceu, e Caetano foi sacramentado como candidato ao Governo da Bahia em um sábado, dia 5 de março, e saiu do Palácio de Ondina parabenizado pelos aliados.

A pré-candidatura, contudo, durou apenas dois dias. Havia dúvidas quanto à sua elegibilidade devido a pendências judiciais do período em que foi prefeito de Camaçari.

Membros da cúpula do PT encomendaram um parecer jurídico a um advogado e fizeram uma consulta informal a um desembargador. A avaliação de ambos foi semelhante: eram grandes as chances de absolvição, mas até o julgamento a candidatura seria assombrada pelo tema da inelegibilidade.

Na segunda-feira, dia 7, sem avisar nem aos aliados mais próximos, Wagner concedeu uma entrevista ao radialista Mário Kertész. Disse que colocaria “um ponto final” naquela história, anunciando publicamente que Rui permaneceria no cargo e o PT indicaria um candidato, citando os nomes de Caetano, Moema e Jerônimo.

A citação aos três nomes naquela altura era só jogo de cena. No mesmo dia, Caetano foi informado de que não era mais candidato. Jerônimo foi chamado ao Palácio de Ondina e recebeu a pergunta de bate-pronto: “E aí, está preparado?”, perguntou Rui.

Jerônimo aceitou a missão e não houve nem comemoração: na mesma hora, dividiram tarefas e planejaram um cronograma de trabalho. A avaliação era a de que seria preciso correr contra o tempo para colocar a pré-candidatura na rua.

No dia 11 de março, uma sexta-feira, a decisão foi comunicada ao partido. Na semana seguinte, o petista estava em um estúdio para fazer os primeiros testes de imagem. Semanas depois, iniciou um tratamento com fonoaudiólogo e fez um procedimento estético nos dentes para ressaltar seu sorriso.

Quarta opção colocada na mesa para a sucessão, o nome de Jerônimo não surgiu por acaso: havia sido coordenador dos programas de governo das duas campanhas de Rui e não tinha arestas no partido pelo fato de nunca ter sido candidato ou dirigente partidário.

Ainda em 2019, Wagner havia sugerido que ele assumisse a Casa Civil, já de olho na sucessão, mas Rui optou por deslocá-lo para a pasta da Educação. Em maio daquele ano, Jerônimo foi citado como aposta de Rui para a sucessão, mas o movimento não prosperou. Seu nome só viria a ser lembrado novamente após os recuos de Wagner e Otto em 2022.

De início, o clima era de velório dentre os deputados e prefeitos de partidos aliados, que viram no bate-cabeça um sinal de que o navio governista poderia naufragar. Na ocasião, ACM Neto era visto como favorito pela boa avaliação em Salvador e por ser o nome mais forte da oposição.

O PP deu início à debandada e rompeu com o governo alegando quebra de acordo.

Para neutralizar a perda, Wagner foi atrás do MDB e iniciou as tratativas com os irmãos Geddel e Lúcio Vieira Lima. Rui assumiu a articulação política e ajudou a frear a debandada de prefeitos. No cargo, multiplicou convênios e anunciou obras nos municípios, afagando líderes locais.

Na campanha, avaliam os petistas, a escolha de Jerônimo se mostrou a mais acertada do ponto de vista da estratégia eleitoral. Foi ressaltada sua história de homem do interior, filho de um vaqueiro, como uma forma de contrapor ACM Neto, cuja família sempre respirou política.

O avanço da candidatura de Lula nacionalmente, aliado a erros de ACM Neto na condução da campanha, deram o impulso final.

Jerônimo foi eleito governador no segundo turno, em 30 de outubro, com 52,8% dos votos válidos, contra 47,2% de ACM Neto. Era o início do quinto governo do PT na Bahia, um ciclo petista que completa duas décadas em 2026.

João Pedro Pitombo / Folhapress

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