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Mulheres se juntam para conquistar mais espaço na capoeira

Abia França e Professora Negona

Rodas de capoeira são comuns em Salvador, sobretudo no Centro da cidade. Mais uma roda formada – quase exclusivamente – por mulheres é coisa rara, como provou mais uma vez a  30ª Roda Feminina de Capoeira, que aconteceu na última sexta-feira  e reuniu cerca de 50 capoeiristas, vindas de diversas cidades do estado. Havia homens também, é verdade, mas eles eram apenas convidados.

Há 40 ou 50 anos, no entanto, uma roda de capoeira feminina era praticamente impossível de se encontrar na cidade. As mulheres então começaram a se mobilizar, para reagir contra o machismo que, como em outras áreas, predominava na capoeira. A roda formada na Cruz Caída, na última sexta-feira, é um dos resultados dessa mobilização.

“No interior, para as mulheres, é mais difícil ainda entrar na capoeira. Às vezes, elas entram na roda, não chegam a dar um golpe sequer e um homem já tira ela. Sempre é a mulher que sai”, diz Professora Negona, há 25 anos adepta da capoeiragem.

Criada em Irará, no interior da Bahia, ela percebeu as dificuldades que as mulheres enfrentavam e decidiu se tornar uma ativista pela presença feminina na capoeira.

Embora haja registros da participação feminina desde o século XIX, foi só no final do século XX que se tornou mais comum. Abia França, capoeirista e professora de educação física, observa que Joaquina Angola de João dos Fatos, uma das mulheres pioneiras capoeiragem, foi açoitada em 1819 por ser “flagrada” na prática. A baiana Maria Felipa, no século XIX, foi uma das mulheres pioneiras na capoeira no estado.

Mesmo no século XX, havia ainda muita resistência por parte dos pais em deixarem as mulheres se dedicarem à capoeira, diz Abia. isso acontecia porque era comum associar a capoeira à vagabundagem e a uma masculinização da mulher. A professora, que defendeu na Uneb sua tese de doutorado sobre mestras de capoeira, revela ainda que, segundo seus estudos, os múltiplos papéis sociais que a mulher exerce contribuem para que elas tenham menos tempo para se dedicar à capoeira.

Encontro na sexta-feira (21) para falar sobre presença feminina na capoeira (Foto: Paula Fróes/CORREIO)

“Conheço uma professora que é chamada de Mulher Homem porque achavam que ela tinha um jeito bruto”, diz Negona, para confirmar a ideia do preconceito. A professora também aponta os múltiplos papéis sociais que a mulheres exerce como dificuldade: “Faço capoeira, trabalho e dou conta da casa. Tenho uma filha e, quando ela nasceu, não parei de dar aula. Mas muitas mulheres têm que para e às vezes não conseguem voltar a treinar”.

Professora Negona é uma das fundadoras do movimento Mulher na Capoeira Tem Axé, coletivo que se dedica a desconstruir o machismo que ainda persiste na capoeiragem. O grupo promove rodas de conversa para debater o assunto e os homens são convidados. “Não adianta conversar só com as mulheres. Afinal, são eles que nos excluem das rodas”, diz Negona. Os debates já aconteceram em cidades como Camaçari, Conceição da Feira e Serrinha.

A professora diz que as ações têm dado resultados e muitos homens que participam das conversas dizem estar desconstruindo o machismo que reconhecem existir neles. Muitos mestres, mais conscientes, passaram a desenvolver um trabalho para que os próprios homens enfrentem esse machismo e o superem.

O mestre Tonho Matéria – que também é cantor e já integrou o Olodum – é um desses que se empenha na desconstrução do machismo. Fundador da Associação Cultural de Capoeira Mangangá, ele diz que implanta em seu grupo práticas para isso.

“Quando comecei, a presença da mulher na capoeira era muito tímida e muitas vezes elas eram limitadas a ajudar na realização de um evento ou ficavam batendo palma na roda. Entrei na capoeira na década de 1970 e notei a partir dos anos 1990 um crescimento desta participação feminina”.

Tonho Matéria diz que no Mangangá, sempre incentivou a participação feminina, inclusive cantando e tocando instrumentos.

O mestre aponta ainda uma razão histórica para este machismo na capoeira: “Muitos mestres antigos trouxeram o ensino da capoeira de uma maneira mais ‘bruta’ e passaram isso para os homens por conta do processo escravocrata e porque a capoeira sempre foi perseguida pela polícia e pelos governos. Então, a capoeira era usada como defesa. Mas hoje, felizmente, muitos mestres dão mais espaço às mulheres, formando mestras, contramestras, estagiárias e professoras”, diz Tonho.

Tonho Matéria (divulgação)

A capoeira é tema do Afro Fashion Day 2022, que acontece no dia 19 de novembro, no Terreiro de Jesus, e vai inspirar os estilistas e suas criações no desfile.

O Afro Fashion Day é um projeto do jornal Correio com o apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador e Sebrae, apoio do Shopping Barra, Suzano, Vult e Salvador Bahia Airport.

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