Os novos líderes da Síria prometeram, nesta quinta-feira (12), estabelecer um “Estado de direito” depois de anos de abusos durante o regime do presidente Bashar al Assad, deposto em uma ofensiva-relâmpago liderada por islamistas. Após uma ofensiva de 11 dias, uma coalizão de movimentos rebeldes liderada pelo grupo sunita radical Hayat Tahrir al Sham (HTS) derrubou Assad, que fugiu para a Rússia. A comunidade internacional está preocupada com o tratamento que os novos governantes podem reservar às várias minorias que vivem na Síria e muitos países pediram um governo “inclusivo”.
O porta-voz do governo sírio, Obaida Arnaut, garantiu à AFP, nesta quinta, que os novos líderes sírios querem estabelecer um “Estado de direito” no país. “Todos aqueles que cometeram crimes contra o povo sírio serão julgados de acordo com as leis”, disse ele. O novo poder irá “congelar a Constituição e o Parlamento” durante um período de transição, em princípio de três meses, acrescentou. “Será formado um comitê jurídico e de direitos humanos para examinar a Constituição e introduzir alterações”, disse. Questionado sobre as liberdades pessoais e religiosas, o porta-voz afirmou que “respeitamos a diversidade cultural e religiosa na Síria”.
Transição “inclusiva” O G7, que reúne as principais potências ocidentais, informou que apoiará um governo “inclusivo” e exigiu que respeite os direitos das mulheres e das minorias. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, viajou para a Jordânia e a Turquia para abordar a nova situação no país, devastado e dividido após 13 anos de guerra, e também fez um apelo por uma “transição inclusiva”.
Em Ancara, ele se reuniu com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, com quem insistiu na importância de respeitar os direitos humanos e tomar “todas as medidas possíveis para proteger os civis” na Síria. Após a visita de Blinken, a Jordânia anunciou que sediará no sábado uma cúpula sobre a Síria com os ministros das Relações Exteriores e diplomatas de Estados Unidos, Europa, países árabes e Turquia. Por sua vez, Israel justificou as centenas de bombardeios dos últimos dias contra instalações militares na Síria como uma medida para evitar que “elementos terroristas” se apoderem delas.
Blinken assegurou que Israel não quer que os equipamentos do exército sírio caiam em “mãos erradas”, mas indicou que Washington está conversando “com Israel” e com “outros” sobre “qual caminho seguir”. Além disso, nos últimos dias, insurgentes apoiados pela Turquia travaram combates com as forças pró-curdas no norte da Síria, onde as Forças Democráticas Sírias (FDS), dominadas pelos curdos e apoiadas pelos EUA, controlam amplas regiões. Na quarta-feira, com mediação dos EUA, ambas as partes acordaram um cessar-fogo. Blinken lembrou nesta quinta-feira que as FDS são “essenciais” para evitar que o grupo jihadista Estado Islâmico (EI) ressurja na Síria.
“Reconstruir” Para acalmar os temores da comunidade internacional, o primeiro-ministro sírio, Mohamad al-Bashir, nomeado até 1º de março, quis se mostrar tranquilizador. “Garantiremos os direitos de toda a população e de todas as confissões na Síria”, prometeu em entrevista ao jornal italiano Corriere della Sera, publicada na quarta-feira. Bashir também pediu aos milhões de sírios no exílio que retornem para “reconstruir” o país, de maioria árabe sunita, mas onde convivem diversas comunidades étnicas e religiosas.
O HTS garante que rompeu com o jihadismo, mas continua na lista de organizações “terroristas” de vários países ocidentais, incluindo os Estados Unidos. Cerca de seis milhões de sírios, ou seja, um quarto da população, fugiram do país desde 2011, quando a repressão às manifestações pró-democracia desencadeou uma guerra que já deixou mais de 500 mil mortos.
A agência humanitária das Nações Unidas declarou, nesta quinta-feira, que mais de um milhão de pessoas, principalmente mulheres e crianças, foram deslocados na Síria desde que os rebeldes lançaram a ofensiva. Após a queda do clã Assad, que governou com mão de ferro por mais de meio século, os moradores de Damasco não escondem sua felicidade. “Vendo as pessoas nas ruas, temos a impressão de que estávamos todos presos sob a terra e agora saímos para a luz do dia”, disse Razan al-Halabi, de 38 anos. Desde 2011, mais de 100.000 pessoas morreram em prisões sírias, estimou em 2022 o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH).
“Barbárie inimaginável” O enviado da ONU na Síria, Geir Pedersen, pediu, nesta quinta-feira, a libertação imediata das “incontáveis” pessoas ainda detidas arbitrariamente e denunciou a “barbárie inimaginável” que os sírios sofreram nos últimos anos. As novas autoridades anunciaram que o cidadão americano Travis Timmerman havia sido libertado e se disseram dispostas “a cooperar” com Washington para encontrar outros americanos desaparecidos, incluindo o jornalista Austin Tice, sequestrado em 2012 durante uma operação do exército na periferia de Damasco.
Por sua vez, o Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU fez um apelo urgente para obter 250 milhões de dólares (R$ 1,48 bilhão) para fornecer “ajuda alimentar a até 2,8 milhões de pessoas deslocadas e vulneráveis” no país.
*Com informações da AFP
Publicado por Victor Oliveira