Junho é conhecido internacionalmente como o Mês do Orgulho LGBT+, uma homenagem ao episódio que muitos historiadores consideram como o início da luta organizada pelos direitos dessa comunidade nos Estados Unidos e, paralelamente, em outros países ocidentais. Foi em 28 de junho de 1969 que os frequentadores do Stonewall Inn., bar gay no vilarejo de Greenwich, em Nova York, resolveram dar um basta nos anos de violência e perseguição policial aos seus membros e espaços de convivência, causando o “levante” ou “revolta” que daria origem ao movimento LGBT+ de hoje.
Naquela época, a polícia de Nova York tinha o hábito de invadir bares e baladas gays para prender quem encontrasse no caminho, mesmo que o indivíduo em questão não estivesse violando a lei. Em 29 de junho, ao tentar fazer o mesmo com um grupo de lésbicas que estavam no Stonewall Inn, eles foram contra-atacados pelos outros frequentadores, que atiravam pedras, tijolos e moedas na viatura e davam início ao que mais tarde foi batizado de “levante” ou “revolta”, perdurando pelas semanas seguintes.
A história exata de “quem atirou a primeira pedra” na Revolta de Stonewall é incerta, mas muitos acreditam que uma das principais lideranças a instigar o levante dos gays e lésbicas frequentadores do bar foi a ativista transexual e drag queen Marsha P. Johnson. Em 2019, o jornal americano The New York Times entrevistou testemunhas vivas daquele episódio em busca de uma resposta, mas eles também divergem sobre a autoria do primeiro movimento, apesar de serem unânimes ao creditar boa parte da animosidade a Marsha.
Acompanhada de Sylvia Rivera, outra mulher transexual e imigrante latina que trabalhava ao seu lado como prostituta, Marsha liderou uma passeata até o Central Park que começou naquele dia e se repetiu pelos próximos. Era a primeira vez que a comunidade LGBT+ ocupava um espaço público e em movimento, com placas, gritos e reivindicações de direitos básicos. Nascia, assim, a primeira Parada do Orgulho.
Movimento LGBT+ no Brasil
Apesar de diferentes, os movimentos LGBT+ do Brasil e dos Estados Unidos carregam algumas semelhanças. Talvez a principal delas seja que o nascimento de ambos se fez pela necessidade de uma estrutura social organizada frente às violências policiais. Aqui, isso se tornou imperativo durante a ditadura militar.
Mesmo que o regime militar à frente do Brasil entre 1964 e 1985 destinasse a censura e outras táticas de silenciamento ou intimidação a qualquer grupo de oposição, havia uma perseguição específica à comunidade LGBT+, especialmente em São Paulo. No Estado, as operações “Sapatão” e “Tarântula”, lideradas pelo delegado José Wilson Richetti, do Departamento Estadual de Investigações Criminais, tinham por objetivo a prisão arbitrária de lésbicas e travestis, respectivamente.
No Memorial da Resistência de São Paulo, portal mantido pelo governo do Estado, a predileção de Richetti é explicada por aspas dele próprio, que defendia a ideia de “limpar a cidade dos assaltantes, traficantes de drogas, prostitutas, travestis, homossexuais e desocupados”. Ele mesmo declarava que cerca de 300 a 500 pessoas eram levadas diariamente à delegacia.
Contra a perseguição, membros da comunidade LGBT+ começaram a se organizar com publicações alternativas, como o Lampião da Esquina e o ChanacomChana, periódicos de nicho, vendidos às escondidas em bancas de jornal ou bares, que traziam informações sobre as operações contra gays, lésbicas e travestis.
Foi, inclusive, graças ao Chanacomchana e à organização de mulheres lésbicas que temos o episódio conhecido como o “Stonewall brasileiro”. Em 19 de agosto de 1983, membros do Grupo Ação Lésbica Feminista (Galf), organizadoras e leitoras da publicação, se revoltaram contra o dono do Ferro’s Bar, que não queria mais a distribuição do periódico por ali, e protestaram em frente ao estabelecimento, dando origem também à data em que hoje celebra-se o Dia do Orgulho Lésbico.
Apesar da articulação iniciada nesse período, o fim da ditadura militar coincidiu com a pandemia da Aids e o movimento LGBT+ organizado demorou anos até se reerguer novamente de forma organizada. Por aqui, a nossa primeira marcha foi em 1995, com poucas dezenas de pessoas andando pela Avenida Atlântica, em Copacabana, após o fim da 17ª conferência da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersex (ILGA).
A primeira Parada do Orgulho LGBT+ (à época chamada apenas “Orgulho Gay”) viria apenas em 1997, na Avenida Paulista, na região central de São Paulo. Inspirado nas “marchas do orgulho” iniciadas por Marsha P. Johnson quase 30 anos antes e já popularizadas nos Estados Unidos, o evento que hoje é o maior desse segmento em todo o mundo reuniu pouco mais de duas mil pessoas naquela edição.
No ano seguinte, como mostra matéria publicada pelo Estadão, o evento já contava com apoio dos sindicatos das costureiras e dos bancários, além de ter se espalhado por outras cinco capitais: Brasília, Salvador, Belo Horizonte, Curitiba e Rio. Aqui, o jornal descrevia o início da marcha: “Os carros passavam com os motoristas assustados, alguns com sorriso no rosto, admirando a passeata. Um arco-íris de balões coloridos abriu passagem para os participantes que aguardavam o início da parada.”