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Transição de carreira: profissão de assessor de investimentos cresce 237% na Bahia em quatro anos

A agenda se divide entre reuniões para encontrar clientes, estudar a plataforma, apresentar modelos de negócios e acompanhar cada atualização econômica brasileira – seja os horários e movimentações na bolsa de valores, sejam as notícias da vez. Desde o ano passado, assim é um dia na vida da assessora de investimentos Clarissa Ferrari, 34 anos, prestes a completar seu primeiro aniversário no mercado financeiro. 

“A gente parte do caminho inverso do banco tradicional, que atende o cliente conforme o produto do banco”, diz ela, que é sócia do Ápice Investimentos, escritório ligado à XP Investimentos em Salvador. Cada decisão é tomada a quatro mãos – sempre as dela e do cliente, de acordo com a necessidade de cada um, assim como seus interesses a longo prazo e até seu apetite por riscos. 

Talvez a Clarissa de alguns anos atrás, atuando na área comercial – primeiro com comércio exterior e, depois, por dez anos em uma empresa de telefonia – não imaginasse um dia trabalhar nessa área. No entanto, quando começou a fazer uma transição de carreira para a assessoria de investimentos, foi uma decisão bem avaliada. 

Na época, trabalhava na Oi, que passava por uma recuperação judicial – no início deste mês, a companhia entrou com um segundo pedido.

“Por ter um caminho na área comercial, pessoas que trabalham no meio já tinham me feito algumas propostas para vir para o mercado financeiro. Comecei a olhar para os lados, para o futuro, para ver onde eu queria estar com minha carreira em cinco, dez, 15 anos. Me senti confiante para fazer essa transição”, diz.  

Quando decidiu pela mudança de carreira, começou a estudar para a prova de certificação, promovida pela Associação Nacional das Corretoras de Valores (Ancord), entidade que é autorizada pela Comissão de Valores Mobiliários a credenciais os profissionais. Esse movimento tem sido seguido por quem busca uma profissão capaz de oferecer melhores ganhos a médio e longo prazo, além de rotinas mais flexíveis. 

Em quatro anos, o número de assessores de investimento credenciados na Bahia cresceu 237%. De acordo com a Ancord, os profissionais passaram de 154 em 2018 para 519 em 2022. O número segue a tendência nacional, que teve um incremento de 233% no mesmo período. 

Mesmo assim, o Nordeste ainda é a região com menos atividade nessa área. Por aqui, atuam apenas 7,3% dos assessores de investimento do país. Diante de um cenário em que o número de investidores em renda fixa já passa de 10 milhões de pessoas e existem ao menos cinco milhões de pessoas com contas em corretoras de investimento, a previsão é de que o número continue crescendo. A projeção da Acqua Vero Investimentos, holding de serviços financeiros sócia do BTG Pactual, é de que o número de profissionais no Nordeste aumente 20% em apenas dois anos. 

“Esse crescimento vem dos clientes bancarizados. Em comparação ao mercado americano, praticamente 90% dos investimentos lá estão dentro de escritórios de investimento e entre 5% e 10% em instituições bancárias. No Brasil, ainda é o inverso”, explica a assessora de investimentos e sócia da Acqua Vero em Fortaleza, Juliana Miranda. 

Nordeste
Uma vez que o mercado financeiro já é consolidado nas regiões Sul e Sudeste – a Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, desponta como o principal pólo onde essas empresas estão localizadas -, há também um movimento de expansão de grandes corretoras e plataformas para abrir filiais no Nordeste. A própria Acqua Vero é um dos exemplos, com escritórios abertos em Salvador, em 2018, e em Fortaleza, em 2019. 

Para Juliana, o crescimento da profissão também é um reflexo de uma mudança no perfil dos investidores, que estariam buscando, além de produtos diferenciados, maior proximidade e mais diversificação dos investimentos. 

“Investir lá fora, por exemplo, era uma coisa que um ou dois anos atrás, a gente só podia comprar para investidores acima de R$ 1 milhão. Desde setembro de 2021, isso mudou e qualquer pessoa com investimento pode comprar no exterior”, explica, citando ainda que se antes era difícil abrir conta no exterior pelos altos valores cobrados, hoje as próprias corretoras daqui conseguem fazer os investimentos. 

A demanda viria também de uma ausência dessa assessoria nas instituições financeiras tradicionais. Clientes começaram a se informar mais sobre investimentos que vão desde fundos imobiliários a criptomoedas e, com isso, estariam buscando mais acompanhamento. 

Para completar, outro aspecto costuma atrair novos profissionais: a possibilidade de fazer seus próprios horários e ter mais flexibilidade quanto ao local de trabalho.

“Quanto à questão de recebimento de faturamentos, o céu é o limite. Isso vai depender muito de você, do seu trabalho, da carteira que você vai formar. A longo prazo, proporciona a possibilidade de ganhos maiores do que você teria na CLT. Especificamente aqui no Nordeste, famílias e grandes e médias empresas estão buscando escritórios e assessorias. A demanda está fazendo com que cresça”, acrescenta.

A Ancord tem a mesma avaliação quanto ao potencial de crescimento no Nordeste, devido ao aquecimento do mercado como um todo. Por muito tempo, os investidores nordestinos foram vistos como mais conservadores – ou seja, tinham mais aversão ao risco do que investidores de outros estados do Sul e do Sudeste do país. No entanto, mesmo isso tem mudado. 

Só em janeiro, foram 14 novos assessores credenciados na Bahia. Para se tornar um assessor, não é preciso ter curso superior. O mínimo exigido é o nível médio, mas os candidatos devem fazer a prova de certificação. Para quem não sabe por onde começar, o próprio site da entidade pode ser um ponto de partida quanto ao conteúdo exigido, segundo a coordenadora da área de certificação e credenciamento da Ancord, Victtoria Mancusi. 

“A gente não oferece apostila porque, pelo conflito de interesses, a gente não ministra cursos voltados para a certificação. Mas temos as fontes de onde consultar, as leis, tudo esquematizado”. 

Carreira
A assessora Clarissa Ferrari decidiu trocar a preparação que vinha fazendo para começar um MBA no exterior pelos estudos para a prova da Ancord. Passou quatro semanas focada nos assuntos e foi aprovada logo na primeira tentativa. “É uma prova que eu não diria que é difícil se você estiver bem preparado. É bem coerente, mas exige que você se dedique”, analisa. 

Em seguida, veio o processo de se associar a um escritório – em seu caso, o Ápice Investimentos. Já na empresa, passou por 21 dias de encontros com assessores mais experientes, acompanhando os especializados em cada produto, como a renda fixa e a renda variável. Era uma espécie de rotação, como o que acontece com os programas de trainee de grandes empresas. 

“Uma transição de carreira é sempre momento de insegurança, você deixar de ser sênior no que fazia para aprender numa área totalmente nova. Mas eles têm um processo muito organizado que me deu segurança”, conta. 

Ela também acredita que o mercado ainda tem muito a crescer, embora ressalte que futuros profissionais devem ter uma veia comercial forte. “Acho que o brasileiro vem despertando para estar mais atento no que se refere ao seu patrimônio. Acho que a maioria dos clientes entende que não é só o que está na internet e que a maioria das pessoas está procurando uma instituição que dê segurança”. 

O próprio Ápice é um dos representantes desse crescimento no Nordeste e na Bahia. Fundado em 2017 por três mulheres, a ideia partiu também da experiência delas com o mercado. Até então, todas trabalhavam em instituições bancárias, como conta a sócia-fundadora Poliana Viana. Na época, ela já atuava como especialista em investimentos, mas no banco. 

“A gente começou a ter um incômodo grande, porque como profissional de captação, você vai sempre perder para alguma casa (de investimentos). Em paralelo a isso, aconteceu uma mudança no banco em que eu trabalhava, que foi o fato de terem extinguido o cargo de especialista em investimentos”, lembra ela, citando que outras instituições tinham feito o mesmo movimento. “Acho que foi um ato falho deles, tanto que agora voltaram atrás”. 

Aquilo serviu para que elas decidissem empreender e abrir o escritório em Salvador. Representantes da XP, ela conta que, no começo, quando falavam da empresa, a maioria achava que era só para investimentos de risco. 

“Foi um período de desbravar. Nesses seis anos, toda a proporção que esse mercado tomou fez crescer muito. No momento em que os bancos cortaram os especialistas de investimento, acabaram criando um terreno favorável para o assessor”, pontua. 

Com clientes sempre mais exigentes, ela avalia que o terreno ainda é fértil. O caso da XP, especificamente, não é muito diferente do universo total brasileiro: o Nordeste ainda tem a menor quota de mercado – o chamado market share – da companhia. 

A pandemia também teve um papel importante. Numa época em que muitos investidores entraram em pânico, o profissional de investimentos aparecia como uma possibilidade de oferecer atendimento técnico e personalizado. 

Para entrar na profissão, gostar do mercado financeiro seria uma premissa básica. Além disso, Poliana elenca outros requisitos, como a facilidade de se comunicar e se expressar, inclusive compreender o perfil de cada investidor. 

No entanto, não há resultados milagrosos. “Assessor de investimento pode ganhar muito, mas precisa ter noção de que é diretamente proporcional à energia que vai trabalhar. Fala-se muito na flexibilidade de autonomia e horários, mas é uma via de mão dupla. É possível fazer uma renda bem acima da média, mas o ritmo de trabalho para impor essa renda acima da média também é muito intenso”. 

Planejar
O gosto por investimentos do planejador financeiro Raphael Carneiro, que começou há dez anos, acabou virando parte de sua profissão. Na época, lembra ele, nem assessores, nem planejadores eram comuns quanto hoje. Tudo era por conta própria. Mesmo antes de se tornar planejador financeiro, ele já tinha virado referência de amigos e conhecidos quanto aos movimentos que deveriam fazer. 

“O meu interesse veio da preocupação com o futuro, de não depender somente da aposentadoria. Ter uma estabilidade, em caso de perder um emprego e ter uma reserva. Comecei com títulos de governo, sem muito conhecimento, e renda fixa, sem aventurar tanto”, conta. 

Em 2019, ele decidiu obter a certificação de planejador financeiro e passou a atuar na profissão. A priori, pode parecer a mesma coisa que um assessor de investimentos, mas não é bem assim. Os dois profissionais trabalham com as necessidades de cada cliente, mas as certificações são diferentes. Um planejador não vende produtos específicos, mas tem uma abordagem de tentar traçar e acompanhar todos os aspectos da vida financeira da pessoa. 

Ainda assim, Carneiro também percebe o aumento do interesse dos clientes pelos investimentos, especialmente após 2017. Segundo ele, muita gente tem se arriscado na renda variável – as ações – sem conhecer muito bem. Um desses exemplos é o de quem se aventura no day trade, a modalidade de negociação que acompanha as movimentações diárias da bolsa de valores, como se fosse um passatempo. 

“Exige dedicação, tempo. As pessoas saem com a ideia de que é um dinheiro fácil. Só é dinheiro fácil para quem vende essa ideia. Mas é um trabalho que exige estudo como qualquer outro. É importante as pessoas terem consciência de que não vão ficar milionárias de um dia para a noite, mas que podem se organizar melhor, dentro de sua realidade”, acrescenta. 

Por isso, ele acredita que buscar um acompanhamento de profissionais para os investimentos pode ser uma boa saída para qualquer pessoa que deseja investir. “Se você quer se preocupar com trabalho, com estudo e se dedicar aos investimentos, alguma coisa vai faltar. Se você quer uma alimentação saudável, você vai num nutricionista para focar nas maiores necessidades daquele momento. Da mesma forma se encaixam tanto o assessor quanto o planejador”. 

Interesse dos investidores também está por trás da alta da profissão

O crescimento da profissão de assessor de investimentos está diretamente ligado a um aumento da demanda. Há cada vez mais pessoas interessadas em aprender mais e fazer investimentos, independente da condição financeira atual. A administradora Monique Tamiozo, 42 anos, buscou uma assessoria de investimentos quando quis mudar a forma de guardar seu dinheiro. 

“Venho de uma família muito humilde, então eu sempre ouvi que não era possível fazer algumas coisas porque não tinha dinheiro. Sempre tive em mente que não ia repetir essa abordagem, então eu sempre guardei. Hoje, tenho plena consciência de que não só guardei como perdi dinheiro, por não ter feito investimentos desde o início”, conta. 

Até quatro anos atrás, ela só guardava dinheiro na poupança do banco. Aos poucos, foi percebendo que amigos estavam fazendo esse movimento de investir. 

Ainda assim, ela sentia que precisava de assessoria para ter mais confiança em suas escolhas. O máximo que Monique havia feito até ali era investir em renda fixa ou em alguma previdência privada. Aos poucos, começou a arriscar mais em sua carteira. 

“Estava indo almoçar no trabalho e ouvia pessoas falando sobre isso. Eram pessoas jovens e eu comecei a sentir que estava ficando para trás. Eu não sentia que estava sendo cuidada pelos bancos. Estava sendo vista só como cifrão”, lembra. 

Desde então, ela faz investimentos pensando no futuro. Continua trabalhando em uma grande empresa, mas também virou nômade digital. Há dois anos, vive em diferentes cidades do país. “Os investimentos me ajudaram porque me dão certo conforto. Tenho como meta viver dentro do que eu já vivia e não mudar nada. Não mexo na grana que tenho investida, mas mexo na minha rotina. Antes, meu aluguel era muito alto”. 

Já a publicitária Ivna Pires, 32, buscou um planejador financeiro para ajudá-la a direcionar melhor nos investimentos. Por muito tempo, ela tinha apenas dinheiro guardado na poupança. Até que, quatro anos atrás, decidiu investir também. “Fui procurar ajuda profissional partindo das minhas necessidades e expectativas para o futuro. Foi assim que fui entender o que era uma carteira de investimentos”, conta. 

Quando começou, tinha acabado de trocar de emprego, onde saiu de um contrato em regime CLT, com todos os direitos trabalhistas, para o de pessoa jurídica.

“Fiquei muito preocupada porque eu não tinha FGTS, por exemplo. Pensava: e se eu for demitida amanhã e precisar de dinheiro?”

Dentro dos objetivos dela, Ivna começou a montar planos e metas mensais. Começou com renda fixa e, hoje, já tem também ativos em renda variável. “Meus pais e minha família não tinham dinheiro para investir, só para sobreviver. Só colocavam na poupança. A consultoria me deu segurança porque eu não entendia nada sobre isso, precisava entender como funciona e quais eram os caminhos”. 

Quer entender mais sobre planejamento financeiro?

Além dos assessores e planejadores de investimento, há economistas e administradores que são criadores de conteúdo especializados na área e dão dicas diariamente. 

Alguns perfis para seguir: 

Nath Finanças – @nathfinancas (Instagram, Twitter e Youtube)

Luiz Persechini – @luizpersechini (Twitter e Instagram)

Me Poupe – @mepoupenaweb (Instagram)

Murilo Duarte – @faveladoinvestidor (Instagram e Youtube)

Gustavo Cerbasi – @gustavocerbasi (Instagram)

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