Mesmo debaixo da chuva que caiu após a meia-noite deste sábado (18), o sorriso negro do bloco Cortejo Afro se manteve firme durante seu desfile no circuito Osmar, no Campo Grande. Ali, ficou nítido que, depois da lacuna provocada pela pandemia, nada seria capaz de estragar a comemoração dos 25 anos de fundação do Cortejo.
O segredo da longevidade está na raiz, fincada no bairro de Pirajá e irrigada pelos mais de 2 mil integrantes do bloco que, mais uma vez, desceram à Avenida, durante a noite desta sexta-feira de Carnaval.
“Pra mim, é uma felicidade, porque estamos levando o legado, também, de Augusto Omolú, que fazia parte do Cortejo”, falou a coordenadora administrativa Jaciara Purificação, de 63 anos, em referência ao bailarino e coreógrafo assassinado em 2013.
“A nossa ancestralidade faz parte do Cortejo”, ressaltou a mulher, que, além de moradora de Pirajá, integra o bloco desde seu início. E, mesmo após 25 anos, ele segue sendo resistência. “Ainda hoje, ele continua a enfrentar os desafios que o Carnaval impõe”, disse seu idealizador, o artista plástico Alberto Pitta.
Isso, porém, não o impede de figurar entre os maiores blocos afro e afoxés de Salvador. “O Cortejo Afro está, hoje, a nivel do Ilê Aiyê, Olodum e Filhos de Gandhy; já traz uma história, mesmo com a metade da idade de todos os outros”, garantiu Pitta.
Para isso, é necessária muita dedicação. O músico Denny Conceição, 45, por exemplo, até já perdeu as contas de em quantas edições da folia momesca já esteve presente com o bloco. “A gente ensaia o máximo que puder, pra chegar agora no Carnaval e fazer bonito. Fora as viagens que a gente faz”, contou o percussionista, também oriundo de Pirajá.
Celebração a Logunedé
‘Tanta beleza, Logunedé é demais’, diz a música de Gil que leva o nome do orixá-menino que velho respeita e filho do grande caçador Oxóssi com a deusa das águas doces, Oxum. Não à toa, foi o tema escolhido pelo bloco Cortejo Afro para voltar à Avenida.
Segundo Alberto Pitta, a ideia teve relação com o momento de retomada do Carnaval. “É um orixá com a ideia de revigorar. […] Nós entendemos que, para se reapresentar à cidade, só o orixá jovem [poderia fazê-lo]”, explicou.
Logunedé foi reverenciado com cores, sons e símbolos. “Se você observar as fantasias, elas justamente contam essa história do orixá: tem pele de animal e a minha leitura do que é um pavão, símbolo de Logunedé”, detalhou Pitta.
“Ela é chique e elegante, e, ao mesmo tempo, remete às fantasias dos antigos blocos afro e afoxés. Eu falo sempre: ‘O Cortejo Afro é um deslocamento estético’”, definiu o artista.
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