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Banho de rio e briga em mercado: falta de água gera caos em Salvador

Após três dias de enfrentamento dos transtornos provocados pelo desabastecimento de água, o grito de alegria da vizinhança foi sinal de que o serviço havia sido normalizado em dezenas de bairros de Salvador e Região Metropolitana. Mas quem correu para tomar banho ou lavar a louça acumulada levou um susto: a água chegou barrenta e assim permaneceu por mais de dez horas. Na quinta-feira (16), a oferta continuava instável e dificultava o cotidiano dos moradores da capital.

No domingo à noite, a publicitária Lorena Souza, 26, foi dormir sem ter ideia da semana difícil que enfrentaria. Moradora de São Gonçalo do Retiro, a jovem está sem água em casa desde a segunda-feira (13), quando a Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa) iniciou reparos na rede de distribuição. Três dias depois, a água até voltou, mas em péssimo estado. 

“A água veio muito suja, fiquei com receio de tomar banho, mas não tive escolha. Na quinta-feira faltou novamente e até agora estou sem”, relata. Para economizar a pouca quantidade que conseguiu reservar em baldes, vale de tudo, inclusive evitar ao máximo o uso da descarga de casa. 

“Até para fazer as necessidades fisiológicas fica difícil. Sem água, não tem como dar descarga. A saída é colecionar o ‘número um’”, conta. 

A publicitária ficou com receio de utilizar a água com coloração escura

(Foto: Acervo Pessoal)

Até a noite de ontem, Lorena continuava desabastecida. Do outro lado da Av. Paralela, no Bairro da Paz, Clarice Nascimento, 57, também pedia para que os clientes do bar não usassem a descarga se fizessem somente xixi. Por lá, a água só voltou na madrugada de quarta (15) para quinta-feira (16). Nos momentos de sufoco, há espaço para a solidariedade. 

“Para mim não foi tão ruim porque tenho tanque, mas enchi baldes de quatro vizinhos que não tinham nada de água em casa nesses dias”, conta Clarice. 

Para a infelicidade de boa parte da vizinhança, a água não chegou cristalina e muitos tiveram receio de utilizá-la para tomar banho e cozinhar. “A água voltou muito suja, parecia borra de café e até agora está meio turva. No final de semana vou ter que limpar o tanque, que deve ter ficado imundo”, analisa o prejuízo. 

Clarice Nascimento precisou economizar para que a água do tanque de casa não acabasse

(Foto: Paula Fróes/CORREIO)

A coloração diferente se deve aos minerais presentes na água que ficam retidos na tubulação quando o serviço é interrompido. No entanto, o fenômeno deve ser temporário e não perdurar por horas, como moradores relataram à reportagem. A Embasa indica que se a água permanecer barrenta, o usuário solicite uma verificação da rede.

Sem informar quantos bairros ainda enfrentavam o desabastecimento, a empresa informou que o serviço seria regularizado na quinta-feira (16) à noite. As localidades foram afetadas por conta do serviço de ligação de um novo trecho duplicado da adutora principal da distribuidora e manutenção. A partir desta sexta-feira (17), quem não estiver com água nas torneiras deve procurar a Embasa para fazer uma reclamação através dos canais de atendimento. 

Leia mais: Entenda o que está por trás dos rompimentos de tubulações em Salvador

Caos
Para quem está acostumado com o serviço regularizado, ficar sem água por algumas horas já causa impactos no cotidiano. Não é exagero dizer que quando as horas viram dias, o caos é instaurado na cidade. Em Itapuã, houve até disputa no mercado para quem compraria as duas últimas garrafas de água mineral do mercado.

“Foi uma confusão, um rapaz empurrou a senhora que também queria levar as últimas”, diz Vivian Batista, 22. 

Além da conta da Embasa que paga mensalmente, a dona de casa precisou desembolsar ao menos R$50 para comprar água engarrafada no mercado da região. O garrafão que normalmente custa R$5 subiu para R$13 com o aumento da procura, que deixou prateleiras vazias.

Depois de 48 horas sem tomar banho, Vivian tomou uma atitude inusitada para quem vive na capital: levou o marido e o filho pequeno para se banharem em um córrego próximo ao Parque de Exposições, em Itapuã. “Eu não aguentava mais ficar sem tomar banho. Levei sabonete e tudo. A água não estava muito limpa, mas foi o que deu para fazer”, relata. 

Em um salão de beleza localizado no setor B de Mussurunga, os funcionários tiveram que lavar o cabelo de uma cliente com água mineral quando o fornecimento foi interrompido durante a semana. “A cliente estava com o shampoo na cabeça e a água acabou. Tivemos que pegar água mineral e terminar o serviço com caneca”, conta Valdemir Costa, 37. Por lá, os três dias sem água renderam prejuízo estimado em R$3 devido aos atendimentos não realizados.

Nem os artistas escaparam do sufoco. Lore Improta postou um vídeo nas redes sociais na quarta-feira (16), em que reclamou do desabastecimento e contou que a água do reservatório de sua casa estava no final. “Estamos sem água há dois dias. A água do tanque está acabando e aí, como que a gente lava o suvaco (sic)?”, brincou. 

O sofrimento não ficou restrito à Salvador. Ao menos 15 municípios ficaram sem água desde o primeiro dia útil desta semana. Na quinta-feira (16), Lauro de Freitas, Simões Filho, Candeias, Madre de Deus e São Francisco do Conde ainda não tinham o fornecimento completamente regularizado.

ACM Neto critica falta de agilidade da Embasa e agência reguladora deve ter que prestar esclarecimento à Câmara

O ex-prefeito de Salvador e secretário-geral do União Brasil Nacional, ACM Neto, criticou, na quinta-feira (15), a falta de agilidade da Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa) em restabelecer o fornecimento de água para cidades da Bahia. 

“A gente pede que o governador ouça a voz das ruas e tenha um pouco de sensibilidade, sobretudo com as pessoas mais pobres, que vêm sendo as mais afetadas”, enfatizou. 

Neto destacou ainda que, em 2023, a empresa responsável pelo desabastecimento de água em casas de toda a Bahia registrou aumento de 11% na tarifa aplicada aos cidadãos do estado, mas segue ocupando o primeiro lugar no número de reclamações feitas ao Procon-BA. 

Já o vereador André Fraga (PV), que mora em Stella Maris e também sofreu com o desabastecimento nos últimos dias, disse que vai fazer um requerimento para que a Agência Reguladora de Saneamento Básico da Bahia (Agersa) dê explicações à Câmara de Salvador. A empresa é a responsável por fiscalizar os serviços prestados pela Embasa.

“A Embasa fica completamente à vontade para fazer o que quer sem nenhum tipo de punição e existe uma agência reguladora que nunca fez nada contra à Embasa. Na Câmara, vou convocar a Agersa para dar explicações sobre a falta de fiscalização”, revela. Na quarta-feira (15), o vereador foi à sessão sem tomar banho por conta da falta de água.

*Com orientação da subeditora Fernanda Varela.

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