Está nos jornais (sim, eles ainda existem em papel, embora com tiragens cada vez menores):
“O governo age para apaziguar a caserna após a CPI do golpe”
Caserna é a construção destinada ao alojamento de soldados num quartel. Não é ali que os ânimos militares estão acirrados, mas nas casas ocupadas por oficiais das Forças Armadas, Exército e Marinha sempre à frente.
A Aeronáutica é um caso à parte. Ela está também insatisfeita com o relatório final da CPI que culpou 31 militares pelo golpe abortado pelo menos duas vezes – em dezembro quando Bolsonaro o propôs em conversa com os comandantes das três Armas, e em janeiro.
Mas o Exército e a Marinha costumam referir a Aeronáutica como se fosse uma Ong e não a levam muito a sério: é só liberar um pouco de dinheiro para a compra de aviões e outras coisitas que a Aeronáutica se dá por satisfeita. Não foi bem assim no passado.
Os aviadores no governo Juscelino Kubistchek rebelaram-se duas vezes com a pretensão de depô-lo. Na primeira, em 1956, tomaram por 20 dias a base aérea de Jacareacanga, no Pará. Na segunda, em 1959, ocuparam Aragarças, em Goiás, por menos de 48 horas.
Refaça o enunciado acima trocando CPI do golpe por outra coisa. Sugestão:
“O governo age para apaziguar a caserna após a ideia de recriar a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos”.
Ou:
“O governo age para apaziguar a caserna após a Proposta de Emenda à Constituição que restringe a entrada na política de militares da ativa”.
Ou ainda:
“O governo age para apaziguar a caserna após saber-se que o Exército comprou software para fazer escutas telefônicas e localizar pessoas”.
Basta ou quer mais?
Está para nascer o governo com coragem de pagar para ver no que daria não se render à vontade dos militares. O de Fernando Henrique Cardoso contrariou os militares duas vezes: quando criou o Ministério da Defesa e cortou verbas para seus projetos.
No Ministério da Defesa pôs um civil. As verbas foram cortadas simplesmente porque o governo ficou sem dinheiro. Do ponto de vista dos seus interesses, os militares apontam Fernando Henrique como o pior presidente desde o fim da ditadura de 64.
O melhor foi Lula, eles reconhecem. Não faltou dinheiro para nada nos seus dois governos. Lula dispensou-lhes o tratamento mais cordial possível. Lula nada tem de esquerda, como confessou mais de uma vez o coronel torturador Brilhante Ulstra. Mas…
Mas assim mesmo, não gostam de Lula. Como não gostavam de Bolsonaro até verem nele a chance de retornar ao poder pelo voto, sem o uso de tanques modernos ou fumacentos. Retornaram ao poder, pessoalmente deram-se bem, mas como instituição…
Como instituição, correm atrás do prejuízo. Sem perder a pose, contudo. Valendo-se dos mesmos instrumentos de pressão fora de moda em países que evoluíram. Parte da culpa cabe aos políticos que os ignoram ou que então se borram de medo diante deles.