InícioEditorialA apuração dos votos a partir do cercadinho do Alvorada

A apuração dos votos a partir do cercadinho do Alvorada

Domingo, 30 de outubro. Brasília. São 15h50. Falta pouco mais de uma hora para o fechamento das urnas. O movimento em frente ao Palácio da Alvorada, a residência oficial do presidente da República, ainda é tímido. Os apoiadores de Jair Bolsonaro de plantão no local não passam de dez. Há alguns poucos carros com bandeiras do Brasil estacionados nas proximidades. Aos poucos, outros bolsonaristas vão chegando.

A coluna consegue entrar, sem chamar atenção. A camisa da Seleção ajuda o repórter a passar despercebido. A ideia é acompanhar de perto, de dentro do famoso cercadinho do Alvorada, as reações da militância à totalização dos votos da eleição mais polarizada da história nacional.

Como a segurança ainda não havia liberado a entrada no cercadinho propriamente dito, foi preciso que todos aguardassem a uma distância razoável até receberem o sinal verde para ultrapassar a barreira. Os ânimos, porém, já estavam exaltados.

“STF e TSE: estão todos f.” “Se o Bolsonaro ganhar, essa galera do TSE e do STF estão (sic) todos f. O presidente não vai deixar passar”, dispara um homem de meia idade, envergando uma camisa amarela onde se lia “Brasil”.

O tom é o mesmo entre outros quatro interlocutores que participam da conversa. Eles vão até um pouco além. Dizem que é preciso organizar o impeachment de “pelo menos” três ministros do Supremo. Os radicais se referem ao ministro Alexandre de Moraes como “Carequinha”. E o colocam no topo da lista.

Já são 17 horas. As urnas fecham e a apuração começa. O clima é de apreensão. Os bolsonaristas passam a acompanha as notícias ao vivo na Jovem Pan. Vinte minutos depois, Bolsonaro aparece com quase 53% dos votos. Animados, os apoiadores do presidente voltam a bater papo tranquilamente.

“Você nunca viu o Bolsonaro de perto?”, pergunta uma mulher que aparentava ter 40 anos. “Eu não, meu sonho é pegar na mão dele alguma vez”, responde outra mulher, de ceca de 25 anos, enrolada em uma bandeira do Brasil.

O comboio passa Por volta das 17h30, o comboio presidencial deixa o Palácio da Alvorada. Ninguém tem certeza se Bolsonaro está dentro do carro principal – mais tarde, à CNN, a assessoria palaciana disse que não estava, mas ainda há dúvidas. Os seguranças do Gabinete de Segurança Institucional dizem que o comboio está a caminho da Esplanada dos Ministérios. Depois, circulou a notícia de que teria ido para Granja do Torto.

A vantagem de Bolsonaro sobre Lula começava a se estreitar. Uma senhora de aproximadamente 60 anos se ajoelha em cima de uma bandeira e começa a orar pelo presidente. Dez minutos depois, os militantes rezam o primeiro Pai Nosso do domingo no cercadinho. A oração é puxada pela mulher que, um pouco antes, disse sonhar com o dia em que pegaria na mão de Bolsonaro.

O sol já está se pondo e junto com ele vai a confiança dos bolsonaristas. Exatamente às 18h45, o TSE atualiza mais uma vez os números e Lula ultrapassa Bolsonaro. Um misto de desânimo e indignação toma conta dos militantes. Eles são 50, aproximadamente. Alguns se inflamam.

“Falei com meu irmão e ele disse que todas as Forças Armadas estão de prontidão para agir. Está tudo muito tenso”, afirma o mesmo homem meia idade que, horas antes, defendia medidas duras contra o STF.

Pai Nosso São 19 horas e a apuração está avançada, com Lula na frente. O segundo Pai Nosso é puxado, novamente pela mulher que sonha em pegar na mão de Bolsonaro. Eles ainda tentam demonstrar esperança, mas o pessimismo vai ficando cada vez mais visível.

Poucos minutos depois, vem o anúncio: Lula está oficialmente eleito. Só se ouve o som da Jovem Pan nos aparelhos de rádio dos carros e, ao fundo, os grilos. Muitos dos apoiadores já tinham ido embora. Os que ainda seguiam na frente do Alvorada estavam dentro de seus carros ou sentados no meio fio, em prantos, inconformados com a derrota.

Outros apoiadores chegam. Alguns vêm com a família inteira. Eles tinham a expectativa de ouvir o primeiro discurso de Bolsonaro após a proclamação do resultado. A expectativa em relação à reação do presidente era grande.

Um grupo de quase dez militantes desenvolve teorias sobre os números finais anunciados pelo TSE. Bem na toada do discurso repetido por Bolsonaro já há algum tempo, eles têm certeza de que houve fraude.

“Ganhamos no voto, mas não na urna. Era óbvio que isso iria acontecer. Foi tudo fraude”, esbraveja uma mulher de aproximadamente 40 anos, de vestido verde e com uma bandeira do Brasil amarrada no pescoço.

Quem chegava e quem já estava no cercadinho dizia que o momento pedia um discurso agressivo de Bolsonaro A conversa sobre “intervenção militar” volta à tona. “Agora é hora de ir pra cima deles”, diz um. “Os militares da reserva têm que se juntar ao Exército e pegar em armas”, defendia outro.

Tentativa de invasão Já são 20h15, os ânimos estão exaltados, um homem fura o bloqueio montado pela segurança e caminha em direção à residência presidencial balançando uma bandeira de Bolsonaro. Ele é calmamente contido pelos homens do GSI.

Precisamente às 21 horas, vem o terceiro Pai Nosso entoado pelos bolsonaristas. Vinte minutos depois, o comboio presidencial chega de volta ao Alvorada. Os militantes entram em êxtase, esperando que finalmente ouviriam Bolsonaro. Os carros passam, os portões se fecham, e nada.

Ao longo das horas seguintes, a turma chama Bolsonaro. O hino nacional é cantado à capela. Os bordões bolsonaristas são entoados. “A nossa bandeira jamais será vermelha”, “Ô Bolsonaro cadê você, eu vim aqui só pra te ver”, repetiam. Tudo em vão.

Espera em vão Já perto das 22 horas, eles organizam um buzinaço e um foguetório para chamar a atenção do presidente, que não aparece. Inconformado, um outro homem, com camisa do Brasil, ultrapassa o bloqueio da segurança e vai em direção ao palácio. Ele exigia uma satisfação de Bolsonaro. Assim como aconteceu na primeira tentativa, de forma tranquila os seguranças fizeram o homem voltar para onde estava, atrás dos gradis.

Faltando pouco para a meia-noite, alguns apoiadores seguiam plantados, em vão, à espera do presidente. Bolsonaro, desta vez, não se animou a animar o cercadinho, que estava triste como nunca.

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