O cabelo é um lugar de dor e liberdade para pessoas negras, principalmente mulheres, que sofrem pressões estéticas mais violentas em decorrência do machismo e do racismo. E as tranças são um importante fator de identidade e resistência, unindo historicamente diferentes gerações.
Encantado com a força dos penteados, o fotógrafo Robério Braga convidou a trancista e antropóloga Mariana Desidério para realizarem conjuntamente o livro Tranças Barrocas – que estabelece uma conexção entre tranças e arte. O fotógrafo baiano cria contrastes e diálogos entre a arquitetura das igrejas barrocas de Salvador e a herança milenar africana dos penteados com tranças.
O livro surgiu de registros e observação de Robério Braga entre as cidades de Cachoeira e Salvador, e também inspirado na obra do nigeriano J. D. Okhai, que expõe seu trabalho de penteados afros em fundo neutro.
Robério se diz hipnotizado pelo trabalho e queria imaginar algo sobre o tema, mas com sua assinatura. O contato com Mariana foi determinante para esse sonho se tornar real. No livro, ele explora a beleza das tranças utilizando fundos desfocados e modelos de lado ou de costas. Segundo Robério, a ideia era, dessa maneira, dar volume e contraste aos penteados.
Mariana, que mora em Portugal há cinco anos, conta que realiza pesquisas sobre o tema antes de sua mudança para a Europa. “Esse foi um dos motivos que o fotógrafo Robério Braga me escolheu para dar corpo a essa obra”, explica.
“Eu não sou apenas uma trançadeira, sou uma pesquisadora e mestranda do curso de antropologia. Minha pesquisa pretende propagar muito mais esse meu interesse em enfatizar a minha cultura negra ancestral, tendo o livro com transportador dessa intenção, já que muitos estão abrindo os olhos para esse tema”, completa a trancista, que também é artista plástica.
Foi com Mariana que Robério chegou à ideia do Barroco. Ao sobrepor os trançados das modelos com o ambiente das antigas igrejas baianas, colocou em movimento duas referências fundamentais no violento processo de transplante da cultura negra para o Brasil.
Os trançados são um elemento da cultura corporal africana enquanto as igrejas barrocas da Bahia são símbolo do poder da igreja e dos colonizadores na época – mas ambos feitos pelas mãos dos negros. “Não queria particularizar as pessoas retratadas, já que não estou falando de um indivíduo único e sim de uma identidade cultural de vários povos”, defende Robério, que apresenta 17 belas imagens em preto e branco, em um jogo de claro/escuro e luz e sombra.
Em texto no final do livro, a pesquisadora Hanayrá Negreiros destaca a força poética do trabalho: “A partir das esculturas dos cabelos crespos, Mariana criou verdadeiras esculturas que são vestidas por cabeças negras”. Já as imagens de Robério “carregam a dramaticidade , a ideia do jogo, o fluxo dinâmico, o que dialoga com a cátedra barroca”.
A versão audiobook do livro está disponível no youtube e Instagram do autor: @roberiobraga. A versão física será vendida pela plataforma Kickante ainda neste mês, segundo Robério Braga.
Ficha
Tranças Barrocas
Autor: Robério Braga
Editora: Fotô Editorial
Páginas: 33
Valor: R$99