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Esquema limpa-nome: juiz denuncia fraude para direcionar processos

São Paulo – Um juiz de Pernambuco denunciou à Corregedoria do Tribunal de Justiça (TJPE), à Polícia Civil e à OAB um esquema para fraudar o sistema de distribuição de processos e permitir que a indústria limpa nome escolha os magistrados que vão julgar suas demandas.

O magistrado também determinou a extinção de um processo em que outro juiz chegou a tirar, de maneira indiscriminada, 5,1 mil nomes do Serasa a pedido de uma associação que faz parte do esquema.

A decisão expõe as entranhas de um esquema que foi revelado pelo Metrópoles, movido por pedidos liminares de associações ligadas a empresas que vendem a limpeza de nome na praça e recuperação do score de crédito.

As empresas recebem até R$ 3 mil de pessoas empresas que querem tirar seus nomes de mecanismo de buscas de endividados. Estas pessoas são apresentadas à Justiça como associadas de entidades que defendem consumidores.

Mais de 60 ações foram distribuídas nas Justiças da Paraíba, Pernambuco e Piauí – algumas, em cidades interioranas, com apenas um juiz.

Magistrados chegaram a determinar a retirada de mais de 700 mil nomes e R$ 20 bilhões em dívidas do Serasa. Desde a publicação da reportagem do Metrópoles, o Conselho Nacional de Justiça abriu uma investigação e juízes promoveram um revogaço de 11 liminares. Juízes investigados promoviam decisões com trechos idênticos em benefício às associações envolvidas no esquema.

outdoor vende esquema limpa nome com liminar

Outdoor em estrada exibe anúncio do esquema para limpar nome em cartórios de protestos de dívida por meio de liminar judicial Arquivo pessoal

FOTO INTERNA DA EMPRESA CREDCEM – METROPOLES

Empresa CredCem é sediada no mesmo endereço da Associação Abrae, que move ações na Justiça de Pernambuco Luiz Vassallo/Metrópoles

ANÚNCIO DA PRÓXIMA AÇÃO LIMPA NOME DE ASSOCIAÇÃO

Associação anuncia próxima “ação limpa nome” Reprodução

TRECHO IDÊNTICO DE DECISÃO DO JUIZ DA COMARCA DE CORTÊS

Em decisão de 2023, juiz de Cortês, a 100 km de Recife, escreve de maneira idêntica a magistrado da capital para dar liminar a associação “limpa nome” Reprodução

TRECHO DE DECISÃO DE ROBINSON ALBUQUERQUE DE RECIFE

Trecho de decisão do juiz Robinson de Albuquerque, de Recife, datada de 2021, a favor da indústria limpa nome Reprodução

Escolha do juiz O caso mais recente é do juiz José Alberto de Barros Freitas Filho. Ele recebeu em seu gabinete uma ação do Instituto Internacional de Arbitragem e Mediações do Brasil com o pedido pela retirada de 2,3 mil nomes do Serasa.

Logo em seguida, a entidade desistiu da ação. Estranhou, fez uma pesquisa no sistema de processos da Justiça pernambucana, e acabou descobrindo que o tal Instituto moveu 22 ações e desistiu de todas, menos aquela que caiu com a de um colega de outra vara.

O processo já havia caído com outro juiz que, não apenas concedeu o primeiro pedido, como, depois, estendeu a decisão para mais 2,3 mil pessoas.

Bloqueio milionário O Instituto que moveu a ação, àquela altura, estava pedindo, também, o bloqueio de R$ 103 milhões das contas do Serasa e do Instituto de Protestos de São Paulo, responsáveis por manter os bancos de nomes de endividados inadimplentes.

Freitas Filho pediu para que o processo fosse encaminhado a ele por se considerar seu juiz natural. O outro magistrado acabou declinando a ação. Ele revogou todas as liminares e extinguiu a ação rejeitando todos os pedidos do instituto.

No mérito, ele pescou o argumento fraudulento da entidade de que a lista de milhares de nomes que apresentou à Justiça era de associados com um problema em comum: nunca foram notificados pelos cartórios sobre os protestos que recaiam sobre eles.

” O juízo precisa analisar, caso a caso, se ocorreu ou não a notificação prévia, de modo que não se há que falar em “origem comum” a autorizar uma ação coletiva”, escreveu.

“Evidente má-fé” Sobre a tentativa de escolher um juiz, o magistrado afirmou que o Instituto moveu todas as ações em uma mesma madrugada, e argumentou que isso se deu por uma “falha no sistema” da Justiça de Pernambuco. “A alegação não é verdadeira”, disse.

“Não restam dúvidas de que a parte autora agiu imbuída de evidente má-fé e em burla ao princípio do Juiz Natural, ao distribuir uma ação 22 vezes durante a madrugada e com poucos minutos de diferença entre elas, até finalmente cair para o juízo que escolheu”, afirmou.

O juiz ainda põe em xeque a existência da própria entidade. “Além disso, percebe-se que a associação autora, apesar do nome, não possui qualquer vestígio de atuação na área de arbitragem ou em qualquer área, sendo que qualquer pesquisa em buscadores na internet retorna sem resultados, não obstante possuir milhares de associados. Aliás, a única característica comum aos seus associados é possuírem inscrição em cadastros de restrição ao crédito”, diz.

Caso de Polícia Freire Filho mandou o caso para a Corregedoria do TJ de Pernambuco, para a Polícia Civil e para a OAB, com a finalidade de investigar o caso e aprimorar o sistema processual da Corte para evitar que demandas predatórias permitam que advogados escolham os juízes de suas causas e driblem o sorteio dos magistrados.

O advogado do Instituto é Delmo Ferreira Neto, um dos mais atuantes em nome dessas entidades. Ele defende, além do Instituto, a Associação Brasileira de Defesa do Empresário e do Consumidor (ABDEC) e a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Abrae). Como mostrou o Metrópoles, ambas as entidades têm ligação com empresários que vendem limpeza de nome na praça.

Uma delas tem em seu site o endereço, em Barueri, da CredCem – que atua no ramo -, e seu fundador é sócio da empresa. A outra é usada por empresários que pregam uma vida de ostentação, carrões, e mansões, e vendem abertamente o serviço de limpeza de nome por meio de liminares. Uma dessas empresas chega a ser citada por um “associado” no processo que disse desconhecer a entidade e apenas tê-la contratado para limpar seu nome.

“Ampla defesa” Procurado, Delmo Ferreira Neto não se manifestou. Ao Metrópoles, ele já havia afirmado que os empresários que usam a entidade não “têm autorização ou legitimidade para falar ou agir em nome da associação, bem como na associação não há nenhum tipo de cargo simbólico ou emérito”. “A Abdec não endossa nem respalda qualquer ato de qualquer pessoa que não seja de seu quadro formal e que não milite exclusivamente em favor dos consumidores vulneráveis associados”.

“Destacamos que é uma associação aberta, com portas franqueadas aos que buscam por Justiça, não podendo responder por eventuais abusos ou desvios de quem não seja parte escrupulosa de seus quadros ou não comungue estritamente dos seus fins sociais”, diz.

Segundo o advogado, “todos os associados estão sob a mesma condição de fato e de direito, pois foram desabonados no mercado sem a garantia do contraditório e da ampla defesa”.

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