Majestosos, começam a chegar em junho os primeiros grupos de baleia-jubarte, que circulam principalmente no Banco de Abrolhos, região do sul da Bahia, para reprodução em águas quentes até novembro. É estimada uma aglomeração de 20 a 25 mil mamíferos no litoral brasileiro, segundo o Instituto Baleia Jubarte (IBJ). A chegada dos animais, no entanto, colide com a presença de embarcações na mesma região. Para evitar acidentes fatais, o IBJ, em parceria com a Norsul e a Veracel S/A, desenvolveu uma tecnologia pioneira em detectar baleias em até 2km e emitir, com o radar, alarme para desvio ou redução de velocidade.
Podendo pesar até 40 toneladas, o mamífero aquático pode sair ferido ou morto após um caso de atropelamento, assim como a tripulação que recebeu o impacto. O veterinário e coordenador de pesquisas do IBJ, Milton Marcondes, classifica o caso de encalhe de uma baleia em 2017 na Baía de Todos os Santos como atropelamento. “[Comparamos] a foto de quando a baleia foi vista à deriva antes de encalhar e um frame dela presa no navio e vimos a mesma marca. No exame tinha a marca de atropelamento logo atrás da nadadeira peitoral”, conta.
“O atropelamento acontece no nosso litoral e tende a aumentar porque tem cada vez mais baleias e navegações. Mas, com a barcaça [das empresas envolvidas no projeto] nunca tivemos um caso. Estamos nos antecipando ao que pode vir acontecer”, afirma.
Atualmente, a tecnologia está sendo aperfeiçoada e utilizada apenas pelas organizações envolvidas na iniciativa. O objetivo, assim que o aprimoramento for feito, é divulgar para que outras empresas se interessem e ajudem na prevenção de outros grupos, como a baleia franca, ameaçada de extinção.
A câmera está instalada no ponto mais alto do empurrador, barco com motor projetado para empurrar barcaças. O objeto captura as imagens e alimenta um software que armazena os dados. Por enquanto, a tecnologia ainda necessita de reparos, vez ou outra identifica objetos que não são baleias, a exemplo de pássaros. Em paralelo, um observador com binóculo também monitora as movimentações e auxilia na necessidade de correção da inteligência artificial, explica o coordenador de Meio Ambiente da Veracel, Tarciso Andrade Matos.
“A Veracel já tem experiência com câmera térmica […] precisava adaptar isso para a baleia. A Aton desenvolveu software de reconhecimento. Quanto mais você vai alimentando com imagens, mais ele vai aprendendo e começa a identificar só a baleia”, elucida.
A ideia surgiu quando, já fechada a parceria entre as entidades, foi lembrado o uso de câmeras de alto alcance para detecção de fumaças na região de plantio da Veracel. A organização ainda precisou de autorização do Exército e tem aplicado melhorias desde a instalação, em agosto do ano passado. Exemplo disso são os ajustes na câmera, que agora podem ser feitos remotamente pela equipe de tecnologia.
Cada participante também tem seu benefício. Além do ecológico, a Veracel e Norsul ganham respeito público devido às atuações ambientais. Já o Instituto, conseguirá trabalhar dados através das informações coletadas pela câmera. “Faz parte da DNA da companhia a sustentabilidade. Queremos ser protagonistas em questões voltadas para o meio ambiente. Nossa função é ter ações que minimizem colisões […] temos várias ações para preservar a vida das baleias”, declara Fabiano Lorenzi, diretor de operações da Norsul.
Dentre as ações ecológicas estão o ajuste da rota das embarcações em 7 milhas náuticas para distanciar possíveis contatos com baleias, treinamento da tripulação para entender a visualização dos animais e diminuição da velocidade de navegação a fim de conseguir tempo de desaceleração, caso alguma baleia esteja no trajeto.
Câmera também consegue capturar imagens durante a noite Foto: Divulgação |
Caça predatória
De acordo com Milton Marcondes, a caça predatória começou no Brasil em 1602, justamente na Bahia. Ele cita a cidade de Caravelas, no sul do estado, como município onde era comum o extermínio dos animais para produção do óleo de baleia, usado em casarões, uma vez que funciona como cimento ao dar liga entre os tijolos. Outro uso comum era o “azeite” das baleias na iluminação das cidades antes do uso comum de eletricidade. “A carne era utilizada para dar aos escravos”, comenta sobre outros usos, dado que carnes nobres eram a de boi e galinha
Com a revolução industrial, a caça foi potencializada no século XX, o que também culminou no risco de desaparecimento do grupo. A perseguição só foi proibida em 1986, quando a Comissão Baleeira Internacional decretou a recomendação. Hoje, estima-se mais de 20 mil baleias nas águas brasileiras. No entanto, o número já chegou a 27 mil antes do extermínio. Em 1988, havia apenas mil animais vivos, conforme conta o IBJ. Em 2002, o número cresceu para 3 mil, graças a fiscalizações do governo e a pressão de organizações ambientais.
População de baleias do Brasil vale US$ 82 bilhões para turismo e serviços ambientais
Conforme relatório publicado por economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI) em parceria com Instituto Baleia Jubarte e a Great Whale Conservancy, a população de baleias no Brasil vale US$ 82 bilhões, equivalente a cerca de R$ 394 bilhões. Isso por conta do alto valor monetário que trazem para o país, em dólares de turismo e serviços ao ecossistema. A estimativa é que cada mamífero tenha o valor de US$ 2 milhões (R$ 9,6 milhões),
Marcondes enumera ainda outros benefícios que ajudam na valorização, a exemplo do aumento da atividade pesqueira como consequência dos nutrientes atrativos a outras espécies e que são trazidos da Antártica, de onde as baleias saem para o Brasil.
Assim como no equilíbrio climático do planeta, pois retiram carbono da atmosfera e o estocam no corpo, além do estímulo à proliferação das algas, responsáveis por jogar oxigênio da atmosfera.
A reportagem entrou em contato com as prefeituras de Viçosa, Caravelas e Prado, cidades que já registraram aparições das baleias-jubarte, para verificar o impacto que os animais têm no setor turístico da cidade. No entanto, não recebeu retorno.
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro