São Paulo — O investigador classe especial da Polícia Civil de São Paulo Marcelo Marques de Souza, o Bombom, preso após inquérito da Polícia Federal (PF) ligá-lo ao crime organizado, é apontado como um dos responsáveis por fazer a “ponte” entre bandidos e a chamada “banda podre” da polícia.
Bombom era chefe de investigações do Corpo Especial de Repressão ao Crime Organizado (Cerco), da 5ª Delegacia Seccional da capital paulista. Em depoimento ao Ministério Público de São Paulo (MPSP), o corretor de imóveis Vinícius Gritzbach, assassinado em 8 de novembro no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, descreve como Bombom atuava nos bastidores corruptos da instituição.
No depoimento, Gritzbach afirma que o empresário Reinaldo Muhammad Mahmud Ayesh, o Vida, investigado por lavagem de dinheiro, seria padrinho de batismo de Bombom. Por intermédio do policial civil, Reinaldo teria sido apresentado para fazer “o trampo”, tanto no Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) quanto no Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP).
O “trampo”, como é explicado pelos investigadores da PF, em relatório obtido pelo Metrópoles, seria a introdução de criminosos, de preferência responsáveis pela movimentação de altos valores, “nas estruturas corruptas subjacentes às estruturas oficiais da Polícia Civil“.
“Possibilitando”, com isso, “o desenvolvimento das atividades criminosas de diversos grupos criminosos sob a égide da corrupção policial, numa espécie de simbiose”, aponta o relatório.
Bombom, segue a PF, moraria no mesmo prédio que Reinaldo Muhammad, apontado como empresário, sócio em diversas empresas e inclusive com participação “substancial” — em 2016 — dos direitos do jogador de futebol Gabriel Jesus, na ocasião do Palmeiras.
A defesa de Reinaldo Muhammad não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestações.
Mesmo endereço que Gritzbach
A investigação da PF levantou ainda que a esposa de Reinaldo Muhammad declarou um endereço no Jardim Anália Franco, bairro nobre da zona leste paulistana, quando solicitou seu passaporte, em 2015. O “mesmo exato” endereço também foi indicado pela mulher de Bombom para solicitar um passaporte, já em 2023.
Bombom comprou o apartamento de alto padrão em junho de 2018 por R$ 700 mil, “[valor] dificilmente compatível com os rendimentos de um investigador de polícia classe especial”, pontuam investigadores federais. Imóveis similares, no mesmo condomínio, conforme apurado, custam R$ 2,7 milhões. Na mesma rua do imóvel, Gritzbach também possuía um apartamento de luxo.
“Tamo rico”
Foi para Bombom que o delegado Fábio Baena e o investigador-chefe Eduardo Monteiro, ambos do DHPP na ocasião, telefonaram e, no viva voz, comemoraram a prisão de Vinícius Gritzbach — que testemunhou a conversa e a relatou ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPSP. Gritzbach era investigado pelo suposto envolvimento no assassinato de dois membros do Primeiro Comando da Capital (PCC).
“A todo instante, eles só comemoram que [foi] ‘cana de bi, cana de milhões’, tamo rico”.
Gritzbach disse, ainda, que em um áudio Bombom lamentou que ele tenha sido preso por Baena e Monteiro. O policial civil teria insinuado que, se fosse ele a fazer a prisão do delator do PCC, eles teriam “feito um acerto” e ele não teria sido detido.
Isso, conforme o relatório da PF, indica que Bombom era umas “das pessoas que faziam os acertos”, ou seja, “a corrupção dentro das estruturas da Polícia Civil”.
Levantamento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) aponta que, entre janeiro de 2017 e julho de 2022, o investigador movimentou quase R$ 34,5 milhões em transações bancárias.
Com centenas de depósitos fragmentados, em uma tática de lavagem de dinheiro conhecida como smurfing, o policial civil realizou transações com cidades do interior paulista, Paraná, Ceará, Bahia, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Pernambuco.
Entre julho de 2022 e fevereiro do ano seguinte, ele ainda movimentou mais R$ 1,7 milhão.
O Metrópoles busca a defesa do investigador Bombom. O espaço está aberto para manifestação.
Presos
Como resultado da delação premiada de Vinícius Gritzbach, aliada à investigação da PF, foram presos no último dia 17 o investigador chefe Eduardo Monteiro, o delegado Fábio Baena, os investigadores Marcelo Marques de Souza, o Bombom, e Marcelo Roberto Ruggieri, o Xará, o advogado Ahmed Hassan Saleh, o Mude, além dos empresários Ademir Pereira Andrade e Robinson Granger de Moura, o Molly.
O agente de telecomunicações da Polícia Civil Rogério de Almeida Felício, o Rogerinho, também foi alvo de um dos mandados de prisão. Ele ficou foragido da Justiça por quase uma semana e se entregou na segunda-feira (23/12), após sua defesa negociar a rendição dele com a Delegacia Geral.
Além deles, foram presos em setembro os policiais civis Valdenir Paulo de Almeida, o Xixo, e Valmir Pinheiro, o Bolsonaro, ambos suspeitos de receber propina ou de subornar criminosos para interromper investigações sobre ações do PCC.
Os policiais presos vão responder pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e passiva, além de ocultação de capitais, cujas penas somadas podem alcançar 30 anos de prisão