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J&F e Odebrecht usam lei de terras a estrangeiros em brigas de bilhões

O debate sobre restrições do acesso a terras por estrangeiros, objeto de ações no Supremo Tribunal Federal (STF), tem sido usado como carta na manga de empresas brasileiras em grandes brigas judiciais. Odebrecht e J&F lançaram mão do argumento nos últimos anos para tentar anular grandes negócios. Entre eles, está a maior disputa societária da história do país, no valor de R$ 15 bilhões.

Movimentos na Justiça e outros órgãos envolvem o uso da OAB para beneficiar a J&F, e até mesmo investidas no Ministério Público Federal (MPF) para anular um negócio bilionário. E a mobilização do presidente do Senado pela Odebrecht para frustrar a compra de uma de suas empresas.

Agro, Indústria e mineração insatisfeitos Como mostrou o Metrópoles, os setores da indústria, da mineração e do agronegócio foram ao STF para tentar derrubar restrições impostas a empresas com capital majoritário estrangeiro para obter terras no Brasil. A legislação sobre o tema prevê que estrangeiros só podem ter até 25% das terras em um mesmo município, entre outras limitações.

Uma lei dos anos 1990 prevê que a aquisição de terras por estrangeiros e empresas de capital majoritário estrangeiro só pode ser concluída caso os compradores obtenham autorização do Congresso Nacional.

Essas entidades argumentam ao STF que o trecho da lei que diz respeito à discriminação de empresas nacionais com capital estrangeiro não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988.

Um entendimento da Advocacia-Geral da União do segundo governo Lula, em 2008, diz o contrário. Esse parecer da AGU faz com que órgãos do governo, como o Incra, sejam orientados a questionar aquisições nesses moldes.

Para industriais, mineradores e agricultores, esse cenário atrasa e inibe investimentos e provoca insegurança jurídica no ambiente de negócios no Brasil. No entanto, parte das empresas nacionais não apenas apoiam como têm usado essa lei para tentar virar a mesa em grandes disputas contra estrangeiros.

Uma briga de R$ 15 bilhões Uma delas é a J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, que trava uma disputa há anos contra a indonésia Paper Excellence para anular a venda da Eldorado, seu braço na produção de celulose.

A disputa começou em 2017, quando a controladora da J&F vendeu 100% da Eldorado, seu braço na produção de celulose, para a Paper Excellence. A empresa indonésia chegou a comprar 49% da sociedade por R$ 3,8 bilhões. Na fase de conclusão do pagamento e da transferência da Eldorado, as empresas romperam.

O grupo brasileiro tentou, sem sucesso, uma vitória em uma câmara de arbitragem, uma espécie de tribunal privado, e há anos leva a briga para a Justiça. No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a J&F busca anular o resultado da arbitragem e o negócio.

Recentemente, movimentos na Justiça da própria J&F e ações de pessoas e entidades totalmente estranhas à briga bilionária têm usado o argumento de que a empresa indonésia não poderia assumir a Eldorado porque não teve autorização do Incra e do Congresso para ser dona de terras estrangeiras.

Essas ações mencionam que a Eldorado é dona e arrendatária de terras com árvores para a produção de celulose. Para que a Paper pudesse assumir o controle da empresa, segundo os argumentos da J&F, precisaria ter obtido autorização do Congresso Nacional.

Denúncias anônimas no Incra A história é recheada de denúncias anônimas e do uso de entidades que não têm qualquer relação com a briga para beneficiar a empresa brasileira. Uma das investidas, que acabou resultando no maior trunfo da J&F, foi no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

A superintendência do Incra do Mato Grosso do Sul recebeu uma representação anônima contra a aquisição da Eldorado de uma pessoa que diz ser “um cidadão brasileiro que passou a vida lutando pela reforma agrária”. Ele relatou ao órgão que a Eldorado detinha 14 mil hectares de terras no Estado e que a aquisição da empresa por um grupo estrangeiro estava em “etapa final” e não tinha “autorização governamental prévia”.

Com base nessa denúncia, o Incra notificou a Paper e a Eldorado para explicações e confeccionou uma nota técnica na qual recomendava que o negócio fosse cancelado e que, caso o grupo indonésio mantivesse interesse nele, voltasse ao órgão e pedisse autorização prévia.

Com base nesse documento, a J&F tem notificado a Paper para entrar em um acordo para desfazer o negócio. Também no Mato Grosso do Sul, a Federação dos Trabalhadores Agricultores do Mato Grosso do Sul (Fetagri) questionou a venda da Eldorado na Justiça Federal.

A entidade recuou e desistiu da ação. A J&F, então, entrou no processo e pediu para que ele prosseguisse. A empresa reforçou que a lei sobre aquisição de terras por estrangeiros foi violada pela Paper. O Ministério Público Federal, então, se manifestou contra a continuidade da ação.

O procurador do caso afirmou que bastava a empresa se desfazer das terras – um argumento semelhante ao que tem sido usado pela Paper. O MPF mudou diametralmente sua posição após uma dança das cadeiras mostrado pela revista piauí e confirmado pelo Metrópoles.

Quatro dias antes de sua saída do MPF, o ex-procurador-geral da República Augusto Aras designou outro procurador para atuar no caso. Esse procurador passou a concordar com a J&F e convenceu outro par a concordar com a empresa brasileira. A ação ainda não foi julgada.

O ex-prefeito “inspirado” Um ofício do Incra à Eldorado no caso em que o órgão recomendou a anulação do negócio foi usado em uma ação popular movida por um ex-prefeito de Chapecó, Luciano Buligon (Republicanos), também contra o negócio.

Com base em um depoimento feito em cartório por um aliado político que já doou R$ 20 mil para uma de suas campanhas, ele afirmou que a Eldorado estava sondando agricultores do Oeste de Santa Catarina para comprar suas terras.

Mencionou ainda que a empresa passaria a ser dona de 249 mil hectares de terras em florestas de eucalipto caso assuma a Eldorado Celulose. A ação foi rejeitada pela Justiça Federal, mas, liminarmente, o desembargador Rogerio Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a acolheu e deu liminar para suspender o negócio.

Luciano Buligon nega qualquer relação com a J&F e afirma que foi inspirado a mover a ação após ser indagado por um aluno de direito sobre a discussão no STF sobre venda de terras a estrangeiros. “Não é entrar numa encrenca em uma briga de uma empresa e outra. Eu não tenho nada a ver com isso”. “Eu tenho que preservar minha região, e preservar acima de tudo a posição que defendo e sempre defendi como prefeito. Estou defendendo uma região que, quem mora em Santa Cataria sabe que uma empresa de reflorestamento termina com a economia do Estado”, diz.

Buligon diz que a Paper Excellence não pode “ter mais do que 25% em terras de cada município”. “O Oeste de Santa Catarina é o maior região produtora de proteína animal do mundo. Nós temos aqui o berço onde nasceram Seara, Sadia, Perdigão, a JBS mesma tem grandes frigoríficos aqui. Se essa moda pega, se uma empresa dessas vem aqui comprar e reflorestar, são pequenos agricultores que alimentam esse processo social e econômico”, afirma.

J&F e “Direitos Humanos” A OAB Nacional moveu um amicus curiae – do latim, amigo da causa – para apoiar uma ação no STF para que fosse suspensa a possibilidade de venda de terras a empresas com capital estrangeiro. A ação cita especificamente a disputa da J&F contra a Paper Excellence.

Nesse processo, o ministro André Mendonça chegou a dar uma liminar para suspender todos os processos relacionados à aquisição de terras por estrangeiros, acolhendo o pedido da OAB. O STF acabou cassando esse decisão no plenário.

Cabe à Procuradoria de Assuntos Constitucionais da OAB mover uma ação como essa. Há anos, o órgão é chefiado pelo ex-presidente da OAB Marcus Vinicius Furtado Coelho, que é advogado da J&F na briga contra a Paper. Suas digitais, no entanto, não estão diretamente na ação. Ele não assina a ação, e a ideia de levar a OAB ao STF foi proposta, oficialmente, pela Comissão de Direitos Humanos da Ordem.

A presidente do colegiado, Silvia Souza, afirma ao Metrópoles que propôs a ação porque a questão de aquisição de terras por estrangeiros pode afetar a situação de movimentos quilombolas. Ela afirma que citou a briga da J&F contra a Paper Excellence na ação porque encontrou o caso quando pesquisava por precedentes e jurisprudência sobre o tema debatido no STF.

No entanto, no caso específico da Eldorado, a entidade não anexou nada além de comunicados da Paper Excellence ao mercado financeiro sobre a vitória na arbitragem contra a J&F.

Questionada novamente, Silvia Souza recuou e afirmou que pinçou este caso específico porque o negócio é relevante para o tema.”Esse caso foi fartamente divulgado na impressa e o pano de fundo dele é a não aplicação do direito positivado na lei objeto da ação”, disse.

A Odebrecht e Alcolumbre Em outra briga bilionária, a Odebrecht resistia à compra de seu braço no setor sucroalcoleeiro, a Atvos (ex-Odebrecht Agroindustrial) pelo fundo norte-americano Lone Star, que havia adquirido a empresa de um banco que detinha garantias dela em sua recuperação judicial.

A Odebrecht entrou uma briga na Justiça para barrar a transferência na Justiça. O negócio envolvia US$ 5 milhões da aquisição das garantias do banco mais a dívida de mais de US$ 300 milhões.

De um lado a empreiteira pedia para que Justiça barrasse o fundo estrangeiro de assumir o controle da empresa. De outro, a Lone Star pedia para que a Justiça avalizasse a compra.

Diante de derrotas na Justiça, a Atvos pediu, em 2020, ao então presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União), para que se manifestasse sobre sua aquisição pela Lone Star. O argumento era de que ao adquiri-la, o fundo estrangeiro se tornaria, de quebra, sócio majoritário de uma empresa dona de terras.

Alcolumbre, então, enviou uma carta ao escritório de advocacia que defendia a Lone Star para notificá-lo de que a aquisição não pode ser concluída caso não haja autorização prévia do Congresso Nacional, sob pena de enviar o caso para o Ministério Público Federal, entre outras medidas.

O ofício foi feito em meio à briga no Tribunal de Justiça, que acabou permitindo a aquisição. A Atvos acabou não ficando com a Lone Star, mas está nas mãos de outro grupo estrangeiro, o fundo árabe Mubadala, que brigou com os norte-americanos mas acabou firmando, em janeiro de 2024, um acordo para comprar a empresa.

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