“Por mais estranho que soe, o fato de meu pai já não estar aqui me dá uma liberdade que eu não tinha antes”, diz o fotógrafo Christian Cravo, em referência ao pai, o também fotógrafo Mario Cravo Neto, que morreu em 2009 aos 62 anos. “Tenha muito cuidado na hora que você escrever isso”, alerta Christian. Mas o alerta está longe de ser ameaçador: ao contrário, é um pedido, feito com muita cortesia ao repórter.
Muito natural e compreensível a preocupação de Christian, afinal algum leitor pode achar, precipitadamente, que ele esteja falando da morte do pai como se ela tivesse sido para ele uma espécie de alívio, o que, óbvio, não foi.
“Meu pai tinha a complexidade dele e tinha muitas virtudes, que eu herdei. Assim como herdei de meu avô”, reconhece Christian, neto do artista plástico Mario Cravo Júnior.
Mas ele fala abertamente dos problemas de relacionamento que tinha com o pai e com o avô e reconhece também que os dois eram muito geniosos.
Aos 48 anos, Christian vai aprendendo a lidar com os traumas e o privilégio de ser herdeiro desses dois enormes talentos, como ele também é. E a nova exposição do fotógrafo, Anima, que será aberta nesta quinta-feira na Galeria Paulo Darzé, é, para ele, uma espécie de catarse, quase uma sessão terapêutica. Pela primeira vez, Christian fotografou a própria família: as filhas Sophia (19 anos), Stella (9) e Helena (8), além de Adriana, esposa dele desde 2002.
Quando criança, Christian e o irmão serviam de modelo para as fotos do que o pai tirava. Mas naquela ocasião, o contexto, segundo ele, era outro.
“Meu pai ‘encarava o modelo’. Eu faço um trabalho de observação. Pensando mais profundamente, todos temos algo a dizer numa foto. Até o ato de não querer ser fotografado é algo a dizer”, defende o fotógrafo.
Ele diz que cada uma das filhas fotografadas tem seu próprio drama. “Às vezes, me veem com a câmera na mão e já saem correndo. Mas em outros momentos, podem me chamar e dizer: ‘Pai, olha que luz linda! Faz uma foto minha agora”, revela Christian. Em algumas imagens da exposição, as modelos aparecem espontaneamente; em outras, são dirigidas por ele.
A mostra será aberta quinta (4) na Paulo Darzé Galeria (Foto: Christian Cravo/Divulgação) |
As fotografias da exposição são apresentadas em dupla: ao lado da imagem da esposa ou das filhas, está uma outra foto, de dunas que ele fotografou em Namíbia, no continente africano. A ideia deste trabalho atual surgiu há cerca de dez anos, quando Christian estava na África realizando outra produção. Sophia tinha cerca de sete anos e Stella nasceu em 2013, quando ele realizava as viagens para lá. “Eu passava meses longe de casa e quando voltava, buscava a intimidade nos momentos em que estava com a família. Mas a exposição surgiu de uma ideia muito pessoal, como tudo que faço”.
“Entre as minhas longas ausências, fazer essas fotos era uma maneira de me entender como pai neste quadrilátero feminino. Sou o único homem no meio delas. Mas eu venho de uma família que sempre foi patriarcal, sempre falocêntrica”, diz Christian.
SERVIÇO
Artista: Christian Cravo
Abertura: Quinta-feira, 4, aberta ao público a partir das 19h
Local: Paulo Darzé Galeria de Arte (Rua Chrysippo de Aguiar, 8, Corredor da Vitória)
Visitação: a partir do dia 5. Segunda a sexta, das 9h às 19h. Sábado, das 9h às 13h
Ingresso: Grátis