A questão mais latente na política interna da União Europeia dos últimos 10 anos é a imigração. Em um continente que foi palco de duas guerras mundiais e de diversos outros conflitos regionais, os fluxos migratórios causados por guerras, não são necessariamente uma novidade, mas os refugiados do Oriente Médio se tornaram um assunto particularmente delicado em múltiplos aspectos. Enquanto italianos e gregos migravam para a Alemanha buscando uma vida melhor e poloneses e búlgaros fugiam da Cortina de Ferro para tentar a sorte na Inglaterra, a problemática da imigração era tratada de outra maneira, afinal nacionais de países da mesma matriz civilizatória cristã europeia, se adaptavam mais rapidamente e não representavam grandes problemas àqueles que os receberam. Entretanto, desde os mais recentes conflitos no Oriente Médio, um fluxo imenso de refugiados e imigrantes ilegais de países muçulmanos, de uma matriz civilizatória completamente oposta à europeia, trouxe milhões para diversos países da Europa, aumentando as tensões sociais e fazendo com que todas as linhas ideológicas repensassem seu conceito imigração e asilo.
Com eleições agendadas para o próximo 23 de fevereiro, todos os principais partidos alemães sabem que a falida política migratória da União Europeia, em especial, a alemã, será algo cobrado pelo eleitorado. Desde os dias mais duros da guerra civil na Síria em 2015, o então governo conservador de Angela Merkel, tomou a decisão de receber todos que quisessem ir ao país, o que resultou em mais de um milhão de sírios se estabelecendo na Alemanha em menos de 10 anos. A premissa da ex-chanceler, era que a Alemanha, em sua potencialidade econômica e social, daria conta de receber e integrar todos os sírios. A realidade, contudo, se mostrou completamente oposta. A política de integração dos refugiados sírios e de outros países muçulmanos não funcionou para ampla maioria dos milhares que chegaram, onde cursos de idioma, cursos técnicos e ensinamento dos costumes europeus não conseguiram evitar o estabelecimento de comunidades isoladas, comumente chamadas de guetos, além da hiper representatividade de certos grupos étnicos dentro das estatísticas de crimes violentos e sexuais. Há obviamente uma parcela de sírios e outros refugiados que conseguiram se integrar bem e contribuir com a sociedade do país que os acolheu, mas com cada vez mais estudos sendo divulgados por governos e organizações europeias, tais dados se mostram estatisticamente negligenciáveis perto dos danos causados.
Em 2015, ao declarar a ditadura de Assad como um violador dos direitos humanos e garantir asilo a todos que chegassem, a Alemanha e outras nações se comprometeram a acolher todos aqueles que alegassem fugir da Síria. Hoje, sem Assad no poder e com um governo de transição, muitos alegam que as razões legais para a concessão de asilo não existem mais, o que obrigaria o sistema migratório a reavaliar milhares de casos. Dentro dos 6 grandes partidos políticos alemães há diferentes visões sobre como prosseguir com os sírios ainda sem um status definido. Nas ruas de múltiplas cidades alemãs, sírios tremulam a bandeira das forças de resistência de seu país de origem e comemoram a queda de Assad, o que fez as alas mais a direita defenderem o retorno imediato desses imigrantes e refugiados à Síria. O líder conservador da Bavária, Markus Söder, diz que “se a razão para o asilo desaparece, então, não há mais nenhuma base legal para que eles permaneçam no país”, uma visão compartilhada por parlamentares da extrema-direita, direita e também da esquerda. No lado governista, a ministra das relações exteriores Annalena Baerbock do partido verde, respondeu que “qualquer um que quiser utilizar a atual situação na Síria para seu próprio propósito político, perdeu completa noção da realidade do Oriente Médio”, alegando que apenas nos próximos meses saberão se a Síria será de fato um país seguro para o retorno de tais indivíduos.
Dentre todas as centenas de milhares de sírios que chegaram à Alemanha desde 2015, cerca de 143 mil já obtiveram a cidadania alemã, porém mais de 700 mil ainda estão classificados em diversas categorias de refugiados e requerentes de asilo, dos quais 50 mil continuam à espera de uma resposta. Desde a queda de Assad, o Escritório Federal para Migração e Refugiados paralisou todas as análises envolvendo indivíduos provenientes da Síria, argumentando que acompanham o desenrolar da situação no país para retomar as avaliações dos casos e as decisões. Obviamente, que com as eleições alemãs batendo à porta, tal instituição também espera a definição política dentro da própria Alemanha, para não precisar fazer o mesmo trabalho duas vezes ou gastar recursos já limitados em uma análise que poderá ser descartada durante o próximo governo. De fato, os alemães, assim como muitos outros governos europeus, superestimaram as suas capacidades de integrar os sírios, assim como sub calcularam a quantidade de pessoas que realmente viriam para a Europa. Quase uma década mais tarde, há menos de meia dúzia de países que tiveram sucesso em suas políticas migratórias, enquanto bem mais de uma dúzia, amargam fracassos de uma decisão que modificou suas grandes cidades e suas nações para sempre. Seja qual for o caminho tomado pela Síria pós-Assad, ou a decisão dos alemães nas urnas em fevereiro, a forma como se concede asilo e a política migratória na Europa, precisam urgentemente de uma mudança.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.