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O problema de crianças e adolescentes é o excesso de limites e não a falta

Sempre que crianças e adolescentes estão no centro de alguma discussão, adultos repetem “estão faltando limites”, “é preciso dizer não”, “eles têm que aprender a lidar com frustrações” e mais uma pequena coleção de frases desse tipo. Tudo significa “endurecer” as relações.

A recente onda de ataques às escolas demanda, mais uma vez, que adultos dirijam seus pensamentos a como lidar com infância e adolescência. De novo, está evidente a nossa incompetência. De novo, o teatro da falsa “autocrítica”. De novo, a conclusão de boa parte deles é a mesma de sempre: rigor, falta rigor! Se fosse isso, tava bom.

Só que, em nenhuma fase da vida, humanos são submetidos a um conjunto de normas tão rígidas. Em nenhum outro momento, além da infância e adolescência, pessoas são punidas com tanta veemência. Nunca mais, depois que crescerem, serão menos perdoados e acolhidos nem terão – proporcionalmente – menos liberdade.

Avançamos muito além da necessidade/obrigação de orientação e cuidado. Salvo em grupos dissidentes, “educar” tem sido, em nossa estrutura social, “limitar, vigiar e punir”, há muitas gerações. Muitas vezes, agredir e até matar. Basta ver as notícias e olhar ao redor. Definitivamente, não faltam, às crianças e adolescentes, nem rigor, nem limites e, muito menos, frustrações.

No começo da minha maternidade, escutei de uma adulta próxima: “não deixe ele te dominar, bebês são tiranos!”. Eu ri da falta de noção. O meu “pequeno Hitler” tinha 15 dias de vida e sequer conseguia dominar o próprio esfíncter. Decididamente, aquele bebê não era meu adversário nem queria me “tiranizar”. 

O que ele me pedia, com o choro estridente e madrugadas insones, era o mesmo que todos pedem: amor e tudo que cabe nesse sentimento. Esse que adultos guardam para seus parceiros sexuais e amigos, mas são incapazes de disponibilizar, com a mesma generosidade e paciência, para as pessoas que acabaram de chegar.

O “pacote padrão” de normas para a  infância é objeto de longas discussões. Impossível resumir aqui. Mas gosto de como Carlos González o contradiz afirmando: “A infância é passageira. Que a nossa obsessão em corrigi-la não nos impeça de aproveitá-la”. Imprimi essa frase em imãs de geladeira e distribuí como lembrança da “formatura” de alfabetização do meu filho, há alguns anos. 

Não pode mamar livremente, não pode dormir com os pais, tem que aceitar o toque de estranhos, não pode ficar no colo muito tempo, tem que chorar sozinho até cansar e há “treinadores” pra tudo isso. Só pra começar. São infinitas as regras preconizadas pelos “especialistas” que se empenham em “impor limites”, “corrigir” infâncias e adolescências, como se, por definição, houvesse algo errado com elas. Não há.

Apenas permitir que processos naturais – inclusive de recém-nascidos! – aconteçam naturalmente é uma exceção. Diante disso, podemos imaginar o laboratório de regras, exigências e punições que é cada família que adota os “limites” genéricos e ainda inventa mais alguns. 

O “pacotão” vai se “aprimorando” e avança na adolescência, essa “fase terrível”, de acordo com o senso comum. Observando o desprezo coletivo às características inerentes também a essa faixa etária, com alguma honestidade, podemos perceber que o objetivo principal da maioria das “regras” é mostrar a superioridade de adultos que devem “ganhar” na queda de braço, “dominar o oponente”. Ao examinar cada “limite”, talvez você chegue à mesma conclusão.

Durante o isolamento, na pandemia, me revoltou a quantidade de famílias que reclamaram do quanto era insuportável conviver com as próprias crianças e adolescentes em casa. Revoltante, também, a quantidade de vezes em que professores diziam coisas como “agora vocês estão vendo o inferno que é conviver com seus filhos”. 

Ambos os discursos foram objetos de humor, fizeram um sucesso danado. Ou seja, o mundo acabando, todos precisando de acolhimento, e crianças e adolescentes sofrendo explícita rejeição de quem deveria ser porto seguro. Aquilo foi bullying do mais perverso. Tô exagerando? Você sabe que não. 

(Mas as famílias e escolas querem “combater” o bullying. Ah, tá.)

(Em que quantidade de violências isso se materializou? Há números.)

Para muitas pessoas adultas, crianças e adolescentes são “insuportáveis”, simplesmente pelo que são. Dormem pouco e choram muito no começo, são barulhentas e agitadas em seguida, depois desafiam autoridades. Tudo isso – e muito mais – pode ser mesmo cansativo, mas é natural e precisa ser encarado com naturalidade.

Filho é pra quem pode, não pra quem quer. Não podendo – e descobrindo que não podem depois de já serem pais – , adultos, em vez de olhar para si mesmos, se viram contra a prole e endurecem o jogo, sob o pretexto de “educar”. 

Um exemplo é o discurso tão comum, diante das primeiras naturais insubordinações: “essa casa é minha, sou eu que pago as contas, aqui valem as minhas regras”. Quando o certo seria  fazer da dinâmica familiar um saudável exercício de convivência coletiva. Mas, não. Perdem a oportunidade, humilham os próprios filhos para, depois, reclamarem de adolescentes que não colaboram com nada e vivem trancados em seus quartos, conversando com estranhos, adotados pela virtualidade. Causa e consequência. O que devíamos esperar?

O problema de crianças e adolescentes é o excesso de limites e não a falta. Especificamente, entre gerações. É a sobra de distâncias e normas impostas exclusivamente por nossa falta de “saco”, por exercício de poder e vaidade. Essas que subjugam e não têm qualquer impacto positivo na vida deles. Muitas vezes, até fazem o contrário. Tipo a conversa de “você não é dono da casa” que, ainda por cima, é mentira. Menores de idade moram com as próprias famílias por direito garantido na lei e não por caridade. No mínimo, são “sócios da casa”.

Educar é cuidar da integridade física e emocional, enquanto se orienta no desenvolvimento de habilidades sociais. Para isso, é preciso estar perto, ter a confiança e o afeto. Respeitar, estabelecer profundo contato. Mas continuamos os chamando de “eles”, como se fossem de outra e incômoda espécie. “Eles” que têm sido prejudicados por nossas incompetências e contradições.

“Os jovens não interagem”, gostamos de repetir, mas observe uma situação comum: se o jovem à mesa fizer o que todos acham certo e deixar o celular de lado, que adulto vai conversar algo que não seja chato? Quem vai se interessar pelo que ele pensa? Quem vai se dispor a conhecer a visão de mundo, a opinião? Vai ser conversa ou a eterna “lição de moral”, exibição do “eu que sei” e histórias repetidas que ninguém aguenta mais? 

“Perderam o respeito pela escola”, mas que força sobrehumana precisam ter pra “respeitar” um modelo que não muda há mais de cem anos? Tudo evoluiu, menos a escola que continua com o professor na frente e as cadeirinhas arrumadas pra escutar. Eu acho herói qualquer um que consiga, minimamente, se interessar. Me espanta que ainda existam alunos cumprindo o básico. 

Adultos não escutam, acham que eles mentem até quando denunciam violências e abusos sexuais. Adultos não se cansam de criticar as gírias, os modos, os amigos, a estética, as descobertas… tudo que vem do “lado de lá”. A gente é que é chato pra cacete e tá precisando melhorar.

Excluímos. Afastamos. Terceirizamos. Reprimimos. Batemos. Gritamos. Apagamos. Muitas vezes, substituímos afeto por “presentes”, mil atividades extracurriculares e babás. Se “limites” comportamentais não “resolvem”, tome “diagnóstico” e remédio. Crianças dopadas já são uma realidade comuníssima, que muitas escolas acham massa!

Diante do resultado trágico desse “massacre”, adultos acham que é preciso intensificar “limites”, vigilância e repressão. Tudo carrancudo, feio, mal-humorado como a maioria de nós tem sido pra eles. “Vamos conter mais”, é o que dizem. Ou seja, vamos dar um boost no erro. Inteligente, né? Só que jamais.

Tenho a solução? Não. Sou adulta e, provavelmente, também parte do problema. Mas acho que a gente precisa perguntar. A quem? Às crianças e aos adolescentes. Que sabem deles e são gente. Por mais espanto que essa informação possa lhe causar. Avançar sobre os “limites”, derrubar os muros. Acho que é o caso de, humildemente, assumir que erramos e recomeçar.
 

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