A crescente onda de violência no Brasil, principalmente na Bahia e no Rio de Janeiro, foi o estopim para que a discussão sobre a criação de uma pasta de Segurança Pública voltasse à tona e ganhasse força nas últimas semanas. A necessidade de criação de um plano emergencial contra o crime organizado ganhou apelo nacional após a morte de três médicos, um deles irmão da deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP), na orla da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, na última semana. Antes da tragédia, o governo Lula oficializou, na segunda-feira, 2, o lançamento do Programa Nacional de Enfrentamento às Organizações Criminosas (ENFOC), que prevê um investimento de R$ 900 milhões para o setor. Mesmo assim, deputados da “Bancada da Bala” defendem a divisão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, chefiada atualmente por Flavio Dino.
O Ministério da Segurança Pública chegou a ser criado durante a gestão do ex-presidente Michel Temer, mas posteriormente se fundiu ao Ministério da Justiça. Para os parlamentares, a criação de uma pasta específica iria colaborar de maneira mais eficiente o crime organizado. Para o deputado federal Alberto Fraga (PL-DF), presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, um órgão voltado à segurança possibilitaria uma padronização das propostas. “Hoje em dia, cada Estado faz o seu e isso dificulta – e muito – em um país grande como o Brasil. As ações das policias seriam iguais. Haveria uma padronização dessa ideia. O Ministério seria o grande coordenador das ações de segurança pública no Brasil. Traria uma espécie de unificação das atividades, de procedimento”, disse ao site da Jovem Pan.
Para o líder da bancada da bala, a unificação da pasta foi um “gol contra” do governo Bolsonaro. Ao longo do governo, quando a hipótese de o Ministério da Segurança Pública ser recriado ganhou força, o nome de Fraga foi ventilado. “Foi um dos erros do governo Bolsonaro. Ele se elegeu com a bandeira da segurança pública. Ele mesmo não queria que houvesse a junção. Óbvio que, com a separação, o ministério voltaria a ter sua essência”, diz. O deputado do PL também critica a atuação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no que diz respeito à elaboração de um plano robusto voltado para a segurança pública. “Falta vontade”, resume. “O PT sempre fracassou e sempre vai fracassar no assunto segurança pública. A Bahia já foi um Estado seguro. Isso que está acontecendo é consequência. Se for criado um Ministério de Segurança Pública, vou aplaudir, indiferente de partido “, completou.
Durante o governo de Michel Temer, o deputado federal Capitão Augusto (PL-SP), ex-presidente da bancada da bala, foi um dos parlamentares que reivindicou a criação de uma pasta específica para a segurança pública. Na visão do deputado, um ex-oficial da Polícia Militar, deixar a tarefa para cada Estado não irá travar a expansão do crime no território nacional. É por isso que o vice-presidente nacional do PL defende o desmembramento divisão. “O crime não tem fronteira”, inicia. “Saúde, Educação e Segurança são os maiores desafios. Desses, só a Segurança não tem uma pasta própria”, complementou. Além disso, ele cobra mudança nas leis de combate ao crime. “Hoje, 70% da efetividade passa pelo endurecimento da legislação penal. As leis são pífias. Começa por criar um foro próprio para tratar da questão de segurança. Paralelamente a isso, tratar a questão da legislação”, pontou.
Na visão do deputado federal Ubiratan Sanderson (PL-RS), presidente da Comissão de Segurança da Câmara dos Deputados, a existência da pasta daria uma resposta positiva no enfrentamento ao crime organizado. Contudo, o parlamentar gaúcho reforça que seria necessário que o órgão fosse chefiado por pessoas técnicas. “Daríamos uma mensagem ao crime com políticas efetivas de enfrentamento. Temos que ter um Ministério da Segurança Pública com pessoas que conhecem a matéria. O atual ministro [Flávio Dino] possui conhecimentos jurídicos, mas conhecimento de polícia é outra coisa”, afirmou em conversa com a reportagem. Sanderson reconhece que o desmembramento da pasta não resolveria todos os problemas do país, mas vê a violência fora de controle atualmente. O deputado, que foi vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara na legislatura anterior, cita um ponto do pacote anti-crime idealizado pelo então ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, a transferência de líderes de facções criminosas para presídios federais, como boa política para mitigar os danos no setor.
“Mesmo não havendo uma pasta específica, o crime não estava descontrolado. Hoje está fora de controle. Apertamos a vida dos criminosos. Houve tentativa de rebeliões, mas foram contidas”, argumentou. Ele afirmou que Bolsonaro pretendia levar adiante a criação da pasta, mas foi orientado a manter a fusão por questões financeiras. À Jovem Pan, Sanderson confirmou que a Comissão de Segurança da Câmara estará na Bahia na próxima segunda-feira, 9, para tentar identificar quais os problemas que fizeram com que o Estado passasse a sofrer com o avanço da violência. Mais de 80 pessoas morreram em confrontos com a polícia no Estado. Um policial federal está entre as vítimas. “Criar um Ministério da Segurança Pública é uma necessidade”, finalizou.
Apesar da pressão feita pela bancada da bala, Lula não deu nenhum indicativo, até o momento, de que irá desmembrar o Ministério da Justiça e Segurança Pública. O atual chefe da pasta, Flávio Dino, é contra a divisão. Seu secretário-executivo, Ricardo Capelli, também rechaça a possibilidade. Em entrevista à coluna Painel, do jornal Folha de S. Paulo, o número dois de Dino afirmou que a ideia é uma “polêmica falsa”. “Essa polêmica de ‘vai dividir o ministério’ é falsa porque o que define a eficiência é a política. A política que a gente está construindo”, afirmou. “É contraditório. Todo o nosso esforço é para integrar as inteligências. Têm que estar integradas Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, polícias civis e militares”, acrescentou.
A decisão sobre dividir a pasta de Dino pode ganhar força nos próximos dias, quando Lula oficializar a escolha do sucessor da ministra Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal. O atual ministro da Justiça é o favorito para vaga e conta com o apoio dos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. Além de definir o substituto do senador eleito na Esplanada dos Ministérios, o petista deve bater o martelo sobre o formato da pasta. Além de Capelli, o atual advogado-geral da União, Jorge Messias, o advogado Marco Aurélio Carvalho, do Grupo Prerrogativas, e Augusto de Arruda Botelho, secretário nacional de Justiça do governo Lula, são cotados para o comando do Ministério da Justiça e Segurança Pública.