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Soltura automática? Entenda o que pode acontecer se STF liberar o porte de drogas para uso pessoal

Supremo Tribunal Federal retomou na última quarta-feira o julgamento e discussão sobre critérios para diferenciar usuários de traficantes; entendimento pode levar à revisão geral de condenações

Nelson Jr./SCO/STF

Os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, do STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou na última quarta-feira, 2, o julgamento que pode levar à descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal. O tema volta à pauta da Corte Superior depois de sete sete anos de paralisação, com o voto do ministro Alexandre de Moraes favorável à liberação do porte exclusivo para maconha e a sugestão de limitação de 25 a 60 gramas para diferenciar o consumo do tráfico, além do estabelecimento de outros elementos. O julgamento foi adiado por uma semana a pedido do relator, ministro Gilmar Mendes, em razão das divergências já apresentadas nos primeiros quatro votos. A expectativa é que a análise seja retomada ainda em agosto, com votos de outros sete ministros (incluindo o recém-empossado Cristiano Zanin). Ainda que sem acordo, o tema chama atenção e já suscita dúvidas sobre os reflexos da decisão, como a possibilidade do julgamento promover a “soltura automática” de envolvidos com o tráfico de drogas. Mas, de fato, a descriminalização do porte de entorpecentes para uso pessoal pode levar à liberação compulsória de pessoas em privação de liberdade?

Do ponto de vista do direito penal, a resposta é não. O advogado Leonardo Pantaleão, especialista em direto penal e processo penal, explica que, desde 2006, com a sanção da atual Lei de Drogas (11.343), em tese, não se pune com pena privativa de liberdade o consumo de entorpecentes. “Então, não há de se falar de pessoas que estejam encarceradas respondendo pelo crime do porte ilegal de drogas para uso próprio, uma vez que, repito, a própria legislação não prevê pena privativa de liberdade desde 2006 para essa conduta”, pondera Pantaleão. Na prática, caso a descriminalização seja aprovada no Supremo, indivíduos pegos com entorpecentes para consumo estarão isentos de quaisquer punições, como a prestação de serviços à comunidade, comparecimento a programa educativo ou registro em ficha criminal, atualmente em vigor. Em outras palavras, “não haverá mais o cometimento de crime”, detalha Matheus Faliene, doutor e mestre em direito penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

“Atualmente, é um crime que já não tem pena privativa de liberdade, apenas alternativas, como uma demonstração sobre os efeitos das drogas. Porém, mesmo assim, é uma questão criminal que gera alguns problemas para o indivíduo que é pego. Com a eventual declaração dessa inconstitucionalidade, que gerará uma descriminalização, as pessoas não terão mais esse risco, os usuários de drogas não terão mais esse risco e a questão será tratada efetivamente como um tema de saúde pública”, pontua. Ainda que, em tese, a decisão do Supremo Tribunal Federal não vá promover uma soltura automática de presos, uma vez que a legislação atual não prevê prisão para usuários de drogas, na prática, estudiosos e os próprios ministros da Corte já ponderam que a delimitação de uma “mediana” para diferenciar consumo próprio de tráfico pode refletir na diminuição do contingente prisional, ainda que no longo prazo.

Como o site da Jovem Pan mostrou, em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes propôs a fixação de um critério nacional, exclusivamente em relação à maconha, para diferenciar usuários de traficantes. Ele lembrou, inclusive que, uma vez que o artigo 28 da Lei de Drogas não define critérios objetivos para o consumo próprio, a definição fica a cargo do sistema de persecução penal, que interpreta a norma de formas diversas. Em muitos casos, como do Recurso Extraordinário (RE) 635659 analisado, uma pequena quantidade de entorpecentes (três gramas) passa a ser qualificada como tráfico, tornando a punição mais dura e aumentando significativamente o número de presos no país. Moraes propôs que sejam presumidas como usuárias as pessoas flagradas com 25 g a 60 g de maconha ou que tenham seis plantas fêmeas. Se essa fixação for estabelecida, deverá haver uma revisão de inquéritos policiais, condenações e execuções penais.

“Existe uma tendência que a Corte decida que o porte ou depósito de uma quantidade específica de droga não seja mais crime. Nesse caso, os processos e inquéritos policiais envolvendo pessoas nessas circunstâncias deverão ser extintos”, afirma Thaís Molina Pinheiro, especialista em direito penal e pós-graduada em processo penal pela Universidade de Coimbra. Embora a advogada também descarte a ideia de soltura automática, a avaliação é que o julgamento do Supremo Tribunal Federal deve levar à soltura de indivíduos. “Quem tiver antecedentes por tráfico de drogas, mas se enquadrar na definição legal de porte para uso pessoal também poderá ingressar com uma revisão criminal para que não conste mais a condenação”, concluiu.

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