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Goya Lopes: “A estampa é uma narrativa”

Goya Lopes tem uma carreira respeitada na moda brasileira. Mulher, negra e baiana, como ela mesma gosta de se definir, a artista plástica também é uma grande curiosa e contadora de histórias. Seus trabalhos são marcados por pesquisas profundas e representativas: na primeira marca, a Didara, fundada em 1988, ela dava ênfase à cultura afro-brasileira. Hoje, está à frente da Goya Lopes Design Brasileiro, um trabalho que classifica como mais abrangente – mas igualmente refinado.

A estilista que já vestiu Moraes Moreira e Jimmy Cliff virou tema do curta-documentário Goya Lopes – Coragem de Criar, dirigido pelo cineasta Kin Guerra, que será lançado quinta-feira (21), às 19h, no canal da artista no YouTube, contando sua trajetória em primeira pessoa. E será seguido de bate-papo online com a escritora Conceição Evaristo, o cineasta Silvio Tendler e o artista visual  Ayrson Heráclito.

“Desde o início, me intitulo como contadora de histórias. A estampa é uma narrativa. Uma estampa conta a história. Tive o desafio de construir a historinha que já contava, só que para crianças. Fiz assim uma linha infantil. Contei a história das tecelagens africanas, que é o suporte que trabalho”, afirma Goya, que lançou no ano passado o livro Tecelagem – Uma História Ilustrada (Solisluna).

Goya guarda tudo, rebote da tendência natural que tem de ser pesquisadora. Antes de fazer Artes Plásticas na Ufba, estudou História na mesma universidade e tinha sonho de ser arqueóloga, por conta de seu gosto por pinturas rupestres, línguas primitivas e  histórias por trás da formação do mundo.
“A questão do documentário é que, ao longo desses anos, eu vejo a necessidade de preservar a nossa memória. Eu tenho todas as minhas criações, todos os esboços, desenhos, artes finais, tecidos, eu preservo tudo isso numa memória e era a hora de colocar, principalmente para o público, que o trabalho não é um produto, ele tem uma história por trás”, destaca.

Diretora da Mina Comunicação e Arte, Isabella Rosado Nunes fez a pesquisa do curta e assina o roteiro junto à artista. Ela esteve com Goya ao longo do ano de produção que trouxe o projeto ao mundo. E diz que a iniciativa é importante para que mais pessoas conheçam o trabalho de Goya Lopes e, acima de tudo, pela oportunidade da própria artista contar sua trajetória em vida. A direção de som é de André Magalhães.

Até por isso, o documentário é praticamente todo narrado pela própria Goya, que recebe apoios de convidados. Diretor do curta, Kim Guerra afirma que a jornada de construção do trabalho foi muito interessante e que ter a vida de Goya e a sua pessoa como fio condutores foi uma decisão que tornou toda a produção ainda mais prazerosa.
“Trouxemos depoimentos de especialistas que acompanham o trabalho de Goya há muito tempo, como Adélia Borges, Enéas Guerra, Zulu Araújo e Carol Barreto. Cada um revelando algumas das conquistas dela nessas quase cinco décadas de produção fascinante. É um trabalho grandioso, que não foi simples nem fácil de sintetizar. A ideia era fazer em torno de 15 minutos, mas foi crescendo por ser muito material”, revela.

foto paula fróes
Goya exibe uma de suas criações (Foto: Paula Fróes)

Conquistas

Em 27 minutos, o documentário passeia pela vida de Goya que, após se formar em 1977, recebeu uma bolsa de estudos do governo italiano para estudar design em Florença. De volta ao Brasil, desenvolveu projetos para algumas empresas de São Paulo, até fundar a Didara, com um conceito artístico que usava a estamparia para contar a história da ancestralidade afro-brasileira. 

Em 1993, ela ganhou o prêmio Museu da Casa Brasileira. Em 2008, apresentou a exposição Ancestralidade Africana no Brasil em Chicago, cujos desenhos e textos compõem o livro Imagens da Diáspora, em coautoria com o escritor Gustavo Falcón, publicado pela Solisluna em 2010, ano em que lançou a marca Goya Lopes Design Brasileiro – seu atual trabalho, com ateliê em Cosme de Farias.

A arte de Goya, entre outros feitos, já ocupou a ambientação do Palácio do Itamaraty, em Brasília; embelezou os figurinos de blocos afro e grupos musicais; desenvolveu produtos exclusivos para grandes marcas, como O Boticário, Tok&Stok e Grendene. Também recebeu o prestigioso prêmio do Museu da Casa Brasileira, nas categorias têxteis e revestimentos, em 1993. 

“A nossa ideia com esse documentário é que ela pudesse contar essas histórias da vida dela, que muita gente conhece, mas que muita gente não conhece. O mais interessante é que construímos o documentário a partir dela. Também é interessante mostrar que, além do trabalho belíssimo com sua marca e as artes visuais, Goya também está presente em outros locais. Ela vem atuando, inclusive em parceria, não só nas artes visuais, mas também em áreas de cinema e literatura, para ficar em dois exemplos”, explica Isabella Rosado Nunes.

A própria Solisluna financiou o projeto, em parceria com a Fundação Pedro Calmon, vinculada à Secretaria de Cultura do Estado. Presidente da Fundação e um dos entrevistados, Zulu Araújo resume o momento e a carreira de Goya como “um momento onde negros e negras tiveram a coragem de ousar, a coragem de romper com os limites que foram pré-estabelecidos e se colocarem pro mundo de maneira inteira, de maneira cidadã”. 
 

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