Chuva? Tempo ruim? Que nada. Nem a aversão baiana ao clima chuvoso diminuiu a vontade do público de se reencontrar com o Afro Fashion Day. Bem antes da hora do evento começar, uma fila enorme já estava formada no Terreiro de Jesus para a volta do desfile presencial do projeto. O último foi em 2019.
Lugar que historicamente marcou o sofrimento de toda uma população preta que chegou ou nasceu escravizada no Brasil, o Terreiro de Jesus foi transformado. Mais ainda: os 75 modelos saíram de dentro da Faculdade de Medicina, onde só a partir do Século XX a população negra passou a ter direito à educação formal.
A palavra que marcou o desfile da oitava edição do Afro Fashion Day foi transformação. O desfile ia se transformando em estilos e ritmos em sua quase 1h de duração. Ao mesmo tempo, rodas de capoeira itinerantes eram abertas. O público curtiu.
No primeiro bloco, que homenageou a Capoeira Angola de Mestre Pastinha, o colorido deu o tom nos looks predominantemente em verde e vermelho. Também teve espaço para o preto e branco, com looks homenageando o Mestre Moa do Katendê, morto em 2018, vítima de violência política.
No segundo bloco, dedicado à capoeira Regional, criada por Mestre Bimba, foi o branco quem deu o tom.
Sentada na plateia, dona Araci Santana, 67, disse ter ficado emocionada. Costureira, ela diz que acompanha o Afro Fashion Day desde a primeira edição. “É muito bonito ver tantos meninos negros assim, bonitos, no bom caminho, né, meu filho?”, questionou em tom retórico, repetindo o que achou da festa: lindo, lindo e lindo.
Acionista da Rede Bahia e diretora do CORREIO, Renata de Magalhães Correia afirma que o Afro Fashion Day é mesmo um evento muito bonito de se ver e de ser feito. “O Afro Fashion Day é bonito no conceito, na entrega, nas oportunidades que são geradas, nos sonhos que são alcançados. Então, é com grande satisfação que estamos entregando mais uma edição do AFD, que já faz parte do calendário de eventos da nossa cidade, um evento que traz a cultura negra em sua forma total e essencial”, disse.
Na oitava edição do evento, a diretora diz que faz o AFD é parte da missão que o veículo de comunicação carrega. “Para o CORREIO, o Afro Fashion Day significa dar luz às nossas origens, afinal nossa cidade é negra. Então nosso papel é mostrar tudo isso para o mundo. Faz parte da nossa missão levar essa mensagem do que é a cultura baiana, que vem em maior parte das origens africanas, para o mundo”, diz.
Quando o bloco contemporâneo, o último, entrou na passarela os rostinhos com cara de quero mais começaram a aparecer pela plateia. Nos modelos que iam deixando a passarela, também. Sabe aquela sensação de chegar ao final de um livro e não querer terminar só pra tê-lo mais de perto? É por aí.
O último bloco foi o mais descolado, com os looks mais ousados. Nele, desfilou Weel Silva, que fez uma verdadeira força-tarefa no dia: foi maquiador a equipe de Dino Neto, se maquiou e ainda desfilou com um salto gigantesco. Com ele, entrou o maculelê na passarela.
Os 75 looks apresentados são criações de 43 marcas e estilistas baianos, uma franco-camaronesa e um coletivo de acessórios. Todos os modelos serão maquiados com produtos Vult, marca apoiadora do AFD 2022.
62 modelos foram selecionados entre 14 agências e projetos, dez foram os vencedores das seletivas de bairro e três foram convidados, dentre eles a Drag Queen baiana Nininha Problemática, criada pelo ator Diggo Santtos, que já desfilou em outras edições do evento.
O time de criativos este ano é formado por Adriana Meira, Abanto, Ateliê Casalinda, Aládio Marques, Balbina, Black Atitude, By Aninha, Criollo, Costa Ribeiro, Closet Clothing, Crioula, Dih Morais, Dua, Ethnic Revival (fraco-camaronesa), Filipe Fias, Gefferson Vilanova, Incid, Jefferson Ribeiro, João Damapejú, Kelba Deluxe, Katuka, Lourrani Baas, Lu Samarato, Mônica Anjos, Mário Farias, MB Conceito, Meninos Rei, N’Black, Nós Macramê Design, Negrif, Porto, Preta Brasil, Rey Vilas Boas, Regina Navarro Bellaoyá, Sonbrille, Soudam, Sillas Filgueira, Tábompravocê, Tempt e Ziê.
No toque do berimbau, pandeiro, malícia da ginga ou plasticidade do aú, o Afro Fashion Day voltou ao lado do povo. Bonito, brilhante, preto.