Além dos assaltos registrados desde a retomada das aulas presenciais, alunos e professores da Ufba dizem sofrer intimidações de pessoas sem associação com a universidade ou mesmo estudantes de outras unidades. Por ser pública, não há impedimento do acesso de qualquer pessoa às instalações.
“Estava chegando na faculdade por volta das 9h30, ele [aluno do BI da Ufba] estava fumando sentado na frente da Facom [Faculdade de Comunicação], dei ‘bom dia’ e ele não respondeu. Peguei o elevador sozinha e quando subi, ele já estava lá em cima. Fui para a minha sala. Assim que entrei, ele apareceu na porta e ficou olhando por um tempo”, conta uma estudante que pediu anonimato.
O episódio trata da entrada de aluno de outro instituto no prédio de Comunicação, nesta terça-feira (24), conforme registro no caderno de Ocorrência de Segurança da Coordenação de Gestão de Segurança (Coseg).
Ao menos quatro alunas denunciaram a perseguição e perturbação em sala de aula. “Ele tinha uma tesoura na mochila, era uma parte transparente, dava para ver que era uma tesoura. É insuportável, principalmente para nós que somos mulheres. Não estamos seguras nem dentro da universidade”, reclama outra aluna abordada pelo mesmo aluno.
A estudante conta que entrou em contato com o diretor da Facom, Leonardo Costa, e foi orientada a formalizar a denúncia por e-mail. A acusação, no entanto, não foi realizada por descrença na investigação e punição do responsável. “Acabamos apenas acostumando a viver com isso, tentando criar medidas próprias [de segurança], como andar em grupo, sempre estar com roupas que permitam sair correndo”, desabafa.
Segundo a Ufba, a segurança identificou o autor, um estudante de unidade próxima à Facom. O jovem se encontra com transtorno mental e foi encaminhado para assistência. Ele está sendo acompanhado pela Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil da Ufba (PROAE).
Como consequência da situação ocorrida com o aluno do BI, nesta terça-feira (24), alunos de uma turma solicitaram que a porta da sala de aula onde estavam fosse trancada durante a aula para evitar a entrada de desconhecidos. A estudante de jornalismo Melanye Leal, de 20 anos, conta que também foi seguida pelo homem e estava na turma onde o acesso foi limitado. Ela diz que sentou próxima à fechadura para monitorar a circulação do corredor durante a aula, pois ainda estava com a sensação de medo do dia anterior.
Assédio e intimidação
Além dos assaltos, há registro também da ocorrência de assédio e intimidação por pessoas desconhecidas a estudantes. De acordo com informações da própria Ufba, recentemente, um homem identificado através das imagens de segurança como sendo Robson Santiago dos Santos, tenente da Polícia Militar, foi visto no banheiro feminino do Restaurante Universitário Manoel José de Carvalho (RU Ondina).
Ele teria violado a privacidade de uma aluna ao espiar a mulher dentro da cabine sanitária. A coordenação de segurança da universidade entrou em contato com a corregedoria da PM e irá levar a estudante para fazer o registro policial. O mesmo tenente foi denunciado em 2017 por um caso semelhante, dessa vez no banheiro feminino de um shopping. Ele estaria filmando uma funcionária enquanto ela estava na cabine.
Outro homem, vestindo calça militar e blusa onde se lia a frase Bolsonaro 2022 também foi motivo de preocupação para estudantes da Facom no final do mês passado. Alunos afirmam que o desconhecido entrou na sala do Programa de Educação Tutorial da Facom (Petcom) com a mão coberta por uma jaqueta e pediu ‘colaboração’ em uma campanha política. Ao ouvir a recusa, se retirou.
“Eu fiquei muito nervosa. Cursar comunicação, principalmente jornalismo, a gente vai de encontro com essa onda de ódio aos jornalistas. Ficamos muito vulneráveis, não tem uma segurança forte, qualquer pessoa pode entrar”, declarou uma integrante do Petcom que pediu para não ser identificada. Segundo a estudante, os colegas não conheciam o homem e nunca o viram na Facom.
“Não conhecemos essas pessoas, não sabemos o estado emocional delas. O que estão fazendo lá? Não é para assistir aula, não é para usufruir da universidade pública. A gente não sabe a intenção”, desabafa uma aluna da Ufba, que pediu para não ser identificada.
Reflexo
A insegurança vivida pelos professores e estudantes da Ufba é reflexo da violência no estado. A Bahia liderou o ranking de mortes violentas no Brasil nos três primeiros meses deste ano, segundo levantamento do Monitor da Violência, feito pelo portal g1. Foram 1.326 mortes em território baiano. Mesmo sem finalizar o primeiro semestre deste ano, também já registra, em 2022, 407 casos a mais de violência contra crianças e adolescentes do que os seis primeiros meses de 2021, segundo o governo federal.
Nos bairros onde a Universidade se localiza também é possível encontrar registros de agressões. A 1,1 km do campus da Ufba da Federação, um homem foi assassinado na porta da casa onde morava. O crime aconteceu na rua Teixeira Mendes, na região do Alto das Pombas, na noite do dia 11. A vítima foi identificada como Jerlan de Jesus Silva. De acordo com a Polícia Civil, ele foi baleado na porta de casa e chegou a ser socorrido para o Hospital Geral do Estado, mas não resistiu e morreu momentos após dar entrada na unidade de saúde.
No Canela, um grupo de criminosos invadiu uma lanchonete e levou pertences dos clientes que estavam no local, no início deste mês. Segundo a polícia, o arrastão aconteceu na Rua Padre Feijó, por volta das 13h. Como o estabelecimento fica próximo ao Hospital das Clínicas – que é da Ufba – e de outras unidades de saúde, médicos, enfermeiros e demais funcionários da instituição almoçavam no local no momento do ocorrido, bem como estudantes da Ufba, que possui diversos campi na região.
*Com a orientação da subeditora Fernanda Varela