Foto: Carlos Moura/SCO/STF/Arquivo
Presidente do Supremo mantém postura mais política e desvia de temas polêmicos que marcaram gestão da antecessora 30 de outubro de 2023 | 17:01
O ministro Luís Roberto Barroso adotou no seu primeiro mês como presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) a postura de evitar conflitos e de reaproximar a corte do Congresso, em meio a uma crise institucional entre Judiciário e Legislativo.
A tentativa de conciliação inclui uma série de encontros institucionais com parlamentares e a elaboração de uma pauta de julgamentos sem polêmicas que possam criar atritos com deputados e senadores.
Barroso tem se concentrado na agenda relacionada a direitos humanos na área da segurança pública e também em dar celeridade a ações de repercussão geral —que incidem em processos por todo o país— que aguardavam decisão.
Pessoas próximas a Barroso afirmam que a ideia do ministro é que a pauta do Supremo não perca relevância, mas que não seja conflituosa com os outros Poderes.
Em conversas reservadas, Barroso tem dito que o Supremo não é o problema do Congresso e que, apesar de ser papel dos legisladores aprovarem medidas que eventualmente modifiquem o Judiciário, elas não podem ser feitas a toque de caixa e de forma que pareça uma retaliação à corte.
Em eventos ao lado de representantes do Executivo e do Legislativo, o ministro passou a ressaltar que o Judiciário vive um “momento importante de ascensão política e institucional” que dá um “equilíbrio necessário para a proteção dos direitos fundamentais e da democracia”.
“Numa democracia não há Poderes hegemônicos, somos todos parceiros pelo bem do Brasil”, disse Barroso em discurso em comemoração aos 35 anos da Constituição na OAB, ao lado do vice-presidente Geraldo Alckmin e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Barroso assumiu a presidência em 28 de setembro em meio a uma ofensiva de parlamentares que veem interferência do Supremo em prerrogativas do Congresso.
Deputados e senadores estavam insatisfeitos com julgamentos pautados pela ex-presidente do STF, a ministra aposentada Rosa Weber.
Na gestão de Rosa, foram concluídas a derrubada da tese do marco temporal das terras indígenas e do instrumento das emendas de relator.
Ela também pautou as descriminalizações do aborto até as 12 semanas e do porte de drogas para uso pessoal. No caso do aborto, o processo era julgado de forma virtual e foi paralisado por um pedido de destaque (de levar ao plenário físico) pelo próprio Barroso.
Em retaliação, senadores aprovaram em uma votação de menos de um minuto na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), presidida pelo senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), uma proposta que limita decisões monocráticas em tribunais superiores.
Pacheco, presidente do Senado, também defendeu a criação de mandatos para ministros do STF.
Já o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chegou a mandar um recado e dizer que os Poderes da República precisam se manter dentro dos limites constitucionais. Ele disse ter “absoluta certeza” de que o Congresso os obedece.
De estilo mais político que Rosa, desde o primeiro momento Barroso passou a antecipar que evitaria polêmicas em sua gestão.
Em entrevista coletiva, disse que o debate sobre aborto no Brasil “talvez ainda não esteja maduro” e indicou que pode não pautá-lo em sua gestão.
“Acho perfeitamente normal que uma questão importante e divisiva da sociedade como essa seja debatida no Congresso também”, afirmou em setembro.
Barroso também recebeu em seu gabinete parlamentares de setores que vinham demonstrando insatisfação com o Supremo, como integrantes da bancada ruralista.
Ele teve reuniões com a senadora Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura do governo Jair Bolsonaro (PL), e o presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), Pedro Lupion (PP-PR). Também encontrou com outros representantes do Congresso, como o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Em paralelo, os julgamentos em pauta do Supremo não têm sido vistos como provocação aos outros Poderes, mesmo quando resvalam em suas atribuições.
No mês de outubro, por exemplo, o STF julgou ações ligadas a direitos humanos, como necessidade de o governo federal criar um plano para resolver os problemas do sistema penitenciário brasileiro.
Também tornou obrigatório o transporte público gratuito em dias de eleições, em uma reação aos bloqueios feitos pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) no ano passado, durante a gestão Bolsonaro.
O Supremo validou ainda lei de 1997 que permite a bancos e outras instituições financeiras tomarem, sem decisão judicial, imóveis em processo de financiamento com acúmulo de dívidas.
Para novembro, a corte continuará tratando de temas relacionados à situação carcerária no Brasil e à segurança pública. O plenário retomará a discussão que trata da revista íntima para ingresso em estabelecimentos do sistema prisional.
Também decidirá se o Estado brasileiro foi omisso em conter o aumento da letalidade de pessoas negras em decorrência da violência institucional, sobretudo fruto de atuação policial.
Discutirá também temas de família, como por exemplo se é necessário a separação judicial para que haja o divórcio. A obrigatoriedade da separação foi extinta em emenda à Constituição aprovada em 2010, o que deve ser mantido pelo Supremo.
O mandato de Barroso como presidente do Supremo vai até o segundo semestre de 2025, quando ele deve ser sucedido pelo ministro Edson Fachin.
José Marques, Folhapress