Sob o comando de Jean Prattes, a Petrobras pode tentar reverter na Justiça uma condição da privatização da BR Distribuidora. A petroleira estaria avaliando questionar na Justiça a cessão de uso da marca da rede de postos BR para a Vibra, nome que a BR Distribuidora recebeu após ser privatizada, em 2019.
A informação foi divulgada inicialmente pelo jornal O Estado de S.Paulo. Segundo a publicação, o governo Lula avalia formas de antecipar ou anular a concessão da marca de postos BR antes do prazo contratual, que vence apenas em 2031.
A possível judicialização do contrato de arrendamento da bandeira é parte do plano da nova gestão da Petrobras de voltar a investir pesado em refino e distribuição de combustíveis.
A percepção é que esse tipo de discussão seria mais simples na Justiça, uma vez que o arrendamento da marca é parte do contrato entre a Petrobras e a Vibra. Questionar uma cláusula do acordo pode ser mais fácil do que tentar reverter o processo de venda de ações, em si.
Em 2017, a Petrobras colocou em prática o plano de desinvestimento (venda de ativos). A privatização da BR Distribuidora começou ainda naquele ano, com a abertura de capital da empresa na Bolsa de Valores.
Em 2019, a Petrobras vendeu ações no mercado e perdeu o papel de acionista majoritário, ficando com uma fatia de pouco menos de 40%. Depois, em 2021, a empresa de petróleo se desfez da parte restante e saiu, em definitivo, da sociedade, concluindo o processo de privatização.
ConcorrênciaAlém da possível batalha judicial, a briga pela bandeira BR representa uma enorme dor de cabeça para a Vibra. Se o governo vencer na Justiça, a empresa não poderá mais usar o nome BR e as cores verde e amarela nos seus mais de 8 mil postos de combustíveis.
“O reconhecimento da marca é um aspecto comercial fundamental do setor de combustíveis e pode influenciar a dinâmica da participação (da Vibra) no mercado de postos”, analisa o banco Goldman Sachs, em relatório.
Além disso, se a Petrobras criar a própria rede de postos do zero, ela terá um diferencial: a capacidade de controlar a política de preços dos combustíveis ao mesmo tempo que detém o controle de uma rede de distribuição.
Isso, nas atuais condições e em um mercado com margens muito apertadas, pode ser prejudicial para a Vibra e para outras concorrentes, como a Raízen (da rede Shell) e Ipiranga, observa o banco.
Caça às privatizaçõesO plano para reaver a rede BR não é a primeira “caça às privatizações” promovida pelo atual governo. Lula já pediu que a Advocacia Geral da União (AGU) conduza estudos para avaliar se é possível reverter também a privatização da Eletrobras.
Além da dificuldade de questionar um processo que foi aprovado pelas duas casas legislativas e pelo Tribunal de Contas da União, o governo teria que enfrentar a “poison pill” (uma cláusula que prevê uma pesada multa para qualquer acionista que tente tomar o controle da Eletrobras).
No caso da BR Distribuidora, uma “poison pill” foi incluída no estatuto da empresa pós-privatização, mas essa cláusula não prevê o pagamento de multa para quem tentar assumir o controle.
A única condição é que o acionista que atingir mais de 50% das ações deverá ofertar aos demais acionistas a possibilidade de venda da sua parte a preços atrativos. Mas é possível que o governo consiga um acordo com os minoritários para evitar que esse gatilho seja acionado, caso o plano seja o de retomar o controle da Vibra e transformá-la novamente em BR Distribuidora.
Como a Vibra vale mais de R$ 15 bilhões no mercado, para reaver o controle da empresa, o governo (de forma direta ou pela Petrobras) teria que desembolsar, no mínimo, cerca de R$ 8 bilhões.
A briga judicial pela marca de postos BR pode afetar o preço da Vibra na Bolsa e baratear ainda mais a possível operação de reestatização da empresa. Hoje (24/4), após a divulgação da reportagem do Estadão, as ações da Vibra recuaram 0,7%, na contramão de concorrentes como a Raízen, que subiu 3% na Bolsa.
Para a Petrobras, a reviravolta no plano estratégico da empresa deve aumentar a necessidade de dinheiro. A empresa saiu de uma gestão que objetivava reduzir os ativos e focar no aumento da eficiência em segmentos-chave (principalmente na exploração de petróleo no pré-sal) para a gestão, sob Lula, que pretende reverter toda a lógica e voltar a investir em refino e distribuição.
“Para a Petrobras, o retorno à distribuição de combustíveis pode implicar maiores custos com fusões e aquisições e com investimentos nos próximos anos, pressionando a distribuição de dividendos no curto prazo”, observa o relatório do Goldman Sachs.
Procuradas, a Vibra e Petrobras não comentaram.