Descobertos os mandantes do assassinato de Marielle Franco e de Anderson Gomes, Lula quer tratar o caso com “sobriedade”, quer “despolitizar” a notícia. Tarde demais ou conveniente demais.
Na sua irresponsabilidade crônica de acusar sem provas, qualidade que tem em comum com o seu adversário-mor, ele disse, em junho de 2022, que “gente dele (Jair Bolsonaro) não tem pudor em ter matado a Marielle”. Lula fazia eco, então, à campanha caluniosa do PT contra o oponente, a quem os seus militantes atribuíam responsabilidade direta na morte da vereadora carioca e do motorista que a servia.
A ligação política de Jair Bolsonaro com os milicianos que infestam o Rio de Janeiro é notória. O que não era tão notória assim, até que a PF desvendasse o crime que vitimou Marielle e Anderson, era a conexão política de milicianos com o PT.
Milicianos não têm partido, embora possam estar infiltrados em vários deles. Milicianos têm interesses escusos. Domingos Brazão, acusado de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora e do motorista, ao lado do irmão Chiquinho Brazão, fez campanha para a reeleição de Dilma Rousseff. Logo depois, passou para o lado da família Bolsonaro, em troca de poder emporcalhar ainda mais o Tribunal de Contas fluminense.
Uma certa ternura pelos Brazão, no entanto, parece sobreviver em corações petistas. O vice-presidente nacional do PT, o interjetivo Washington Quáquá, disse não acreditar que Domingos Brazão possa ser um dos protagonistas do crime. “Eu conheço o Brazão e sou amigo dele! Não só não acredito que ele fizesse uma brutalidade dessas, como o conheço na política e isso é coisa de gente sem capacidade política”, afirmou o petista.
Chiquinho Brazão foi, por sua vez, secretário de Ação Comunitária do prefeito Eduardo Paes, aliado de Lula. Um miliciano na ação comunitária, veja só. É mais do que ironia, é physique du rôle.
Quando o nome da criatura começou a circular como suspeito no caso Marielle, ele foi exonerado. Mas fica a pergunta: Eduardo Paes só soube das cabulices de Chiquinho quando se viu forçado a demiti-lo do secretariado? E o que dizer da nomeação pelo general Braga Netto desse abominável delegado Rivaldo Barbosa para chefiar a Polícia Civil do Rio de Janeiro?
No Rio de Janeiro, mais do que em qualquer outro lugar do Brasil, há muito não existe mais distinção entre política e crime. O laxismo de governos de esquerda e a obtusidade de governos de direita, para ser apenas benigno, tornaram todos cúmplices na situação calamitosa que se vive hoje naquelas paragens.
A tomada de morros por traficantes de drogas e a ocupação de bairros inteiros por milicianos só poderiam ter como desdobramento natural a infiltração de representantes desses marginais nas administrações municipal e estadual — e a coisa avançou para Brasília, como se vê agora.
A elucidação do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes é o início de uma contraofensiva da lei e da ordem no Rio de Janeiro, como especulam alguns colegas? Não acredito. O povão continuará entregue à bandidagem, e não apenas lá.
Que lei e qual ordem no Rio de Janeiro, se os agentes externos não são melhores do que os agentes internos? Que lei e qual ordem em qualquer latitude brasileira, se a impunidade vem de cima? Que lei e qual ordem, se fações criminosas já dão parte das cartas em outros estados? O Rio de Janeiro é caso perdido. Coração do meu Brasil. Mas vamos “despolitizar” a segurança pública para ver se a gente muda de assunto, mesmo que o fedor seja insuportável.